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sexta-feira, 8 de dezembro de 2023

Para o STF de Alexandre de Moraes, vale até punir os filhos pelos atos dos pais - Gazeta do Povo

J.R. Guzzo - Vozes

O ministro Alexandre de Moraes, no exercício de suas funções como chefe do inquérito policial criado há quatro anos para investigar supostas atividades contra o Estado de Direito no Brasil, suspendeu as contas bancárias da filha de um dos investigados, o jornalista Oswaldo Eustáquio – que há um ano buscou asilo no exterior.

A menina tem 15 anos de idade. No momento, está sem dinheiro para pagar o lanche dos irmãos menores na escola. 
As contas de sua mãe, naturalmente, também estão congeladas, de maneira que ela está sem nenhuma fonte de renda – pois a remuneração e os bens do seu pai, é claro, estão bloqueados desde o começo. 
É um momento de pura e simples barbárie – um dos piores na escalada de destruição da lei e dos direitos individuais que o Supremo Tribunal Federal conduz atualmente no Brasil.

    De aberração em aberração, e sem nunca encontrar alguma objeção ao que faz, o STF está criando uma situação de selvageria na Justiça brasileira.

Não se trata, absolutamente, de discutir Eustáquio, ou que ele fez
O escândalo é o que estão fazendo com a sua filha. 
Ela não cometeu infração nenhuma. 
É menor de idade e, por lei, teria de contar com a proteção da autoridade pública – e não estar sendo perseguida pela Suprema Corte de Justiça da República. Mais: um dos princípios mais elementares da lei, no Brasil e em qualquer democracia, é que os efeitos das ações do infrator não podem jamais se estender à sua família
Punir os filhos pelos atos dos pais, ou vice-versa, é coisa que só se faz hoje na Coreia do Norte e em outros infernos da tirania mundial. 
É onde nos levou a conduta policial do STF: nosso sistema de justiça, agora, tem semelhanças com o Judiciário norte-coreano.
 
O motivo apresentado para se fazer o bloqueio da conta é uma agressão à lógica comum. O ministro Moraes diz que a conta da garota está servindo de “escudo” para as atividades “antidemocráticas” do pai. 
Quais são essas atividades? O inquérito não consegue, objetivamente, descrever uma única delas. 
Eustáquio, por sinal, não foi condenado até agora por nada; o próprio Moraes escreve que há apenas “fortes indícios” contra ele. 
Se não há atividade criminal definida, como poderia haver “escudo”?
A conta não é escudo de coisa nenhuma – é apenas um meio para a menina manter-se viva. 
 No entendimento do STF, porém, o dinheirinho do lanche vira uma ameaça à democracia brasileira.
 
De aberração em aberração, e sem nunca encontrar alguma objeção ao que faz, o STF está criando uma situação de selvageria na Justiça brasileira. 
 
Um preso sob custódia da autoridade morre nos cárceres do STF por falta de tratamento médico adequado – apesar de atestados oficiais dizendo que ele corria risco de vida e tinha de ser removido para um hospital. 
Pessoas são condenadas a 17 anos de cadeia por estarem presentes a um quebra-quebra em Brasília. 
A menina de 15 anos é punida por delitos que o seu pai ainda não cometeu – enquanto não for condenado, é inocente, e mesmo que fosse culpado, ela não pode pagar por seus atos.
 
A justificativa para tudo é que os perseguidos são “bolsonaristas” que querem “destruir a democracia”
Se é assim, não têm mais direito à proteção da lei; o que define a culpa no Brasil do STF não é o que o sujeito fez, mas quem ele é. O “campo progressista”, em peso, acha que não há nada de errado com isso.

Conteúdo editado por: Jocelaine Santos



J.R. Guzzo
, colunista - Gazeta do Povo - VOZES

 


terça-feira, 25 de julho de 2023

A mãe, o baile e o discurso - Revista Oeste

 Roberto Motta 

Ficam as três imagens queimando nossas retinas e contaminando o ar de nossa democracia com um cheiro cada vez pior, insuportável

 

Foto: Montagem Revista Oeste/Reprodução Redes Sociais/Shutterstock

Três imagens marcaram as últimas semanas. Essas imagens, tomadas em conjunto, oferecem uma explicação sobre o Brasil melhor do que a maioria das análises de economistas, jornalistas e juristas.

A primeira imagem é a de uma mãe.

A experiência da maternidade é poderosa. Nada interessa mais a uma mãe do que o bem-estar dos seus filhos. Não há nada que uma mãe tema mais do que ser separada deles. 

Na República Federativa do Brasil, até bem pouco tempo atrás, nenhuma mãe amorosa, dedicada e correta temeria ser separada de seus filhos por iniciativa do Estado. Isso mudou.
Rodou nas redes sociais um vídeo que mostra uma mãe reencontrando seus dois filhos, crianças ainda pequenas. 
A mãe não consegue parar de chorar. Quem viu as imagens ficou com um nó na garganta.
A mãe ficara presa vários meses. O pai das crianças, seu marido, ainda está preso.

Vejam isso! Uma mãe, que após 6 meses, saiu do “campo de concentração” criado a partir do 8 de janeiro e revê seus 2 filhos.Como não se emocionar com tamanha injustiça e barbárie.Imprensa tendenciosa,antiética e esquerdista essa mulher tem alguma característica de “terrorista”?🇧🇷 pic.twitter.com/nXct8lXGct— Edinaldo Marques (@EdinaldoMarques) July 10, 2023

.....


A prisão do pai e da mãe, e de milhares de outros brasileiros, por razões semelhantes, deixou um cheiro ruim no ar da democracia.

A segunda imagem marcante é a de um baile. Uma banda toca no convés de um navio. Pessoas movem seus corpos ritmicamente. 
Uma dessas pessoas é um dos homens mais poderosos do país. 
Ele tem a chave para aprovação de legislação na Câmara dos Deputados.

O homem é um jurista do Estado — poderoso, bem-remunerado e cheio de privilégios. Ele está em um local inapropriado para seu cargo — um evento político

Uma das coisas que ele permitiu — ou promoveu — foi a aprovação, em altíssima velocidade, de um projeto que altera a cobrança de impostos. É uma mudança, feita na própria carne da Constituição, que afetará a vida de todos os milhões de brasileiros por várias gerações. Na realidade, os efeitos são imprevisíveis, porque o projeto não foi discutido adequadamente nem acompanhado de qualquer estudo sério. [saiba mais sobre o pode do tal homem, clicando aqui.]

Não houve tempo. Era preciso aprová-lo rapidamente. Por quê?

Há quem diga que a velocidade foi estimulada pela liberação de bilhões de reais em “emendas” parlamentares (“emenda” significa “dinheiro”). Houve quem dissesse que a razão da pressa fora o show no navio. A embarcação tinha hora para zarpar.

Se isso for verdade, foi o show mais caro da história.


O cheiro ruim aumenta.
 

Cruzeiro do Safadão | Foto: Reprodução/Redes Sociais

Na terceira imagem, um homem faz um discurso. O homem é um jurista do Estado — poderoso, bem-remunerado e cheio de privilégios. Ele está em um local inapropriado para seu cargo um evento político. Suas palavras são inadequadas para sua função. 

Na maioria das democracias, elas seriam suficientes para sua remoção imediata da posição que ocupa e para o início de procedimentos de responsabilização.

No Brasil, sabemos que nada acontecerá.

Ficam as três imagens — da mãe, do baile e do discurso — queimando nossas retinas e contaminando o ar de nossa democracia com um cheiro cada vez pior, insuportável.

Leia também “Os piores entre nós”

REVISTA OESTE, ÍNTEGRA DA MATÉRIA


Coluna Roberto Motta - Revista Oeste







domingo, 19 de março de 2023

O desfecho da trilogia sobre o ‘império do mal’ - Ana Paula Henkel

Revista Oeste

Desde que Lenin derrubou a nascente democracia parlamentar da Rússia para estabelecer uma ditadura brutal, muitas outras nações caíram nas iscas travestidas de “igualdade para todos” 

O selo com Stalin e Mao Zedong | Foto: Baka Sobaka/Shutterstock

  O selo com Stalin e Mao Zedong | Foto: Baka Sobaka/Shutterstock 

 E chegamos à parte final de nossa trilogia sobre o comunismo. É claro que um assunto tão complexo, tão enraizado em detalhes e ações contadas em diferentes eventos históricos não poderia ser explorado na sua totalidade em apenas três artigos. Mas precisamos de um (re)começo — precisamos levantar esse tapete da barbárie e expor aos nossos herdeiros que o atual fascínio pelo “novo” socialismo/comunismo é nocivo, enganoso, vil e perigoso. Lembro que, em novembro do ano passado, em virtude do aniversário da queda do Muro de Berlim, postei algumas fotos sem legenda da queda do muro, em 1989, em meu Instagram. Para a minha grande surpresa, fiquei espantada com a quantidade de mensagens de jovens que não faziam a menor ideia do que eram aquelas imagens. Não conhecer a história é perigoso demais.
Há muitas razões além da história para refletirmos sobre o legado do comunismo. Desde que Vladimir Lenin derrubou a nascente democracia parlamentar da Rússia, em 1917, para estabelecer uma ditadura brutal, muitas outras nações caíram nas iscas travestidas de “igualdade para todos” chamadas de comunismo — muitas vezes, dissimuladas e maquiavelicamente empacotadas de apenas “socialismo”.
 
O comunismo promete igualdade, mas oferece escassez para todos, exceto para as elites em seu aparato
Ele lança a justiça social e oferece escravização em massa, miséria generalizada, desconfiança social e punição severa para todos os que discordam do sistema. 
Vimos esses fenômenos acontecerem em todo o mundo, na China, na Coreia do Norte, no Sudeste Asiático, na Europa Oriental pós-Segunda Guerra Mundial, Cuba, América Central e, talvez mais notavelmente visível para nós, brasileiros, hoje com a fome e o caos da Venezuela.
A queda do Muro de Berlim, 1989 | Foto: Wikimedia Commons
O comunismo toma conta da China e além
Antes de a China se tornar um país comunista, houve um período de 37 anos, começando em 1912, com um governo provisório, depois a Primeira República da China, a Segunda República Nacionalista da China e depois a República Constitucional da China. Antes desse período, a China era governada por dinastias imperiais.

Em julho de 1921, o Partido Comunista da China é formado pelos revolucionários Chen Duxiu e Li Dazhao, que se tornaram marxistas após a vitória bolchevique na Revolução Russa. Em 1927, o PCC fica sob o controle de Mao Zedong, e, em 1947, Mao lidera uma revolução para que, em 1º de outubro de 1949, seja declarado o estabelecimento da República Popular da China, sob o regime do Partido Comunista.

Na divisão sino-soviética da década de 1950, Mao rompeu com o marxismo-leninismo tradicional e desenvolveu o maoismo, a interpretação chinesa do comunismo. Os maoistas iniciaram uma forte tradição comunista, instituindo o Grande Salto Adiante e a Revolução Cultural.  
Em 1958, o Grande Salto é colocado em prática, com o objetivo de desviar a economia da China da agricultura para a indústria — em apenas cinco anos. O resultado foi uma das maiores barbáries contra a vida humana da história
Pelo menos 30 milhões de pessoas morreram de fome em apenas quatro anos. 
Além disso, as reformas agrárias de Mao levaram milhões à morte em execuções públicas em campos de trabalho. Na revolução cultural, Mao derrubou seus inimigos, perseguiu quase 300 mil intelectuais e dissidentes do comunismo na Campanha Antidireitista, e milhões de pessoas foram mortas ou perseguidas por apenas discordarem do regime.

Em apenas alguns anos, o Grande Salto também causou enormes danos ambientais na China. O plano de produção de aço resultou em florestas inteiras sendo derrubadas e queimadas para abastecer as fundições, o que deixou a terra aberta à erosão. O cultivo denso e a lavoura profunda despojaram as terras agrícolas de nutrientes e também deixaram o solo agrícola vulnerável à erosão. Líderes comunitários ansiosos exageraram em suas colheitas, na esperança de agradar à liderança comunista, mas este plano saiu pela culatra de forma trágica. Como resultado da superprodução, os funcionários do partido levaram a maior parte da colheita para as cidades, deixando os fazendeiros sem nada para comer. As pessoas no campo começaram a passar fome.

Em 1960, uma seca generalizada aumentou a miséria do país, e as pessoas no campo não conseguiam mais plantar sequer para sobreviver. No final, por meio de uma combinação de políticas econômicas desastrosas e condições climáticas adversas, cerca de 20 a 48 milhões de pessoas morreram na China. A maioria das vítimas morreu de fome no campo. O número oficial de mortos do Grande Salto é de 14 milhões, mas a maioria dos estudiosos concorda que esta é uma subestimação substancial, já que todos os dados vindos dos comunistas não são confiáveis.

(...)

Umas das páginas mais sangrentas da comunista China foi escrita recentemente, em 1989: o Massacre de Tiananmen Square. Protestos liderados por estudantes que pediam democracia, liberdade de expressão e liberdade de imprensa tomaram as ruas de algumas cidades da China.

Quando a presença inicial dos militares não conseguiu conter os protestos, as autoridades chinesas decidiram aumentar sua agressão, e os protestos foram interrompidos em uma repressão mortal.  
Em 4 de junho, soldados e policiais chineses invadiram a Praça da Paz Celestial, disparando balas reais contra a multidão. 
Repórteres e diplomatas ocidentais em Pequim naquele dia estimaram que milhares de manifestantes foram mortos no Massacre da Praça da Paz Celestial e até 10 mil pessoas foram presas. 
 
 Mais de três décadas depois que as tropas usaram força assassina para expulsar os manifestantes da Praça da Paz Celestial e do centro de Pequim, encobrir esse crime tornou-se uma tarefa árdua. 
Mesmo assim, a máquina de segurança da China está pronta para censurar e prender aqueles que falam abertamente sobre os eventos de 1989. Todos os rastros de imagens desse trágico dia foram excluídos dos cachês da vida cibernética chinesa. A história foi simplesmente apagada.
Tanques chineses em Pequim, julho de 1989 - 
 Foto: Wikimedia Commons

Isto é apenas uma pontinha do iceberg de terror de um país que é regido por quem respira o comunismo, por quem usa a foice e o martelo como símbolos de orgulho. A mesma foice e martelo usados pelo atual ministro da Justiça no Brasil, Flávio Dino, e que recentemente declarou que “era comunista, sim, graças a Deus”.

(...) CLIQUE E LEIA MATÉRIA COMPLETA

Recomendações de alguns livros, filmes e séries sobre o comunismo:

Livros: Fome na Ucrânia (Gareth Jones); Lenin, um Retrato Íntimo (Victor Sebestyen); A Grande Fome de Mao (Frank Dikotter); Fome Vermelha, a Guerra de Stalin na Ucrânia (Anne Applebaum); Stalin, a Biografia de um Ditador (Oleg V. Khlevniuk); O Livro Negro do Comunismo, Em Busca de Sentido (Viktor Frankl)

Filmes: A Sombra de Stalin; Colheita Amarga; Goobdye Lenin

Séries: Trostky; Como se Tornar um Tirano; Chernobyl

Documentários: The Killing Fields; Segunda Guerra em Cores; O Colapso da União Soviética

Leia também “O nascimento do ‘império do mal'”

Revista Oeste 

 

quarta-feira, 1 de fevereiro de 2023

Supremo jamais será 'intimidado pela barbárie', diz presidente do STF - O Estado de S. Paulo

Blog do Fausto Macedo

Rosa Weber: "Regime democrático, permanentemente cultuado, permanece inabalável".
Rosa Weber: "Regime democrático, permanentemente cultuado, permanece inabalável". Foto: Carlos Moura/SCO/STF

A presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministra Rosa Weber, disse nesta quarta-feira, 1º, que os vândalos que invadiram a sede da Corte no dia 8 de janeiro 'não destruíram o espírito da democracia'.

"As instalações físicas de um tribunal podem até ser destruídas, mas se mantém incólume a instituição Poder Judiciário", afirmou a ministra.

Em um discurso duro, em defesa da resiliência do tribunal, a presidente do STF disse que os ministros jamais serão 'intimidados pela barbárie' e que a Corte é 'absolutamente intangível à ignorância crassa da força bruta'. "No solo sagrado deste tribunal o regime democrático, permanentemente cultuado, permanece inabalável", disse.

A ministra também prometeu que todos os responsáveis pelos atos golpistas serão responsabilizados 'com o rigor da lei'. "Só assim se estará a reafirmar a ordem constitucional", defendeu.

Os manifestantes extremistas foram chamados pela presidente do STF de 'inimigos da liberdade' movidos por um 'ódio irracional quase patológico' e imbuídos da 'ousadia da ignorância'. Rosa também se referiu aos protestos extremistas como um 'ataque criminoso e covarde'. A ministra foi aplaudida de pé pelas autoridades presentes.

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), estiveram presentes na sessão solene, sentados ao lado da presidente do STF, para passar a imagem de união dos Poderes em defesa da democracia. Lula também discursou e atribuiu o ataque aos prédios dos Poderes a um 'projeto autoritário de poder'."A violência e ódio mostraram sua face mais absurda: o terror", disse. Já Pacheco disse que os ministros podem contar com o apoio do Legislativo para exercerem 'sua missão constitucional com liberdade, autonomia e estrita observância da lei'. "O autoritarismo de uma minoria inconformada e hostil buscou nos ameaçar e tomar de assalto a democracia. Não conseguiram. Os Poderes da República resistiram. O Poder Judiciário mostrou a força de sua resiliência: não irá vergar com intimidações", afirmou o presidente do Senado.

Discursos
O presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Beto Simonetti, também falou no evento. Ele defendeu que a 'democracia persiste' e que o respeito ao voto depositado nas urnas é 'inegociável'. Também pregou a responsabilização dos culpados pelos ataques aos prédios dos Poderes. "A resposta uníssona do Judiciário, do Executivo e do Legislativo foi combater os ataques com o fortalecimento da democracia. Por ironia, é o Estado Democrático de Direito que, hoje, garante o direito de ampla defesa para aqueles que o repudiaram", afirmou.

Frequentemente acusado de alinhamento ao governo Bolsonaro, o procurador-geral da República, Augusto Aras, escolheu um tom de apaziguamento. Ele defendeu o respeito ao voto popular 'especialmente' pelos derrotados na eleição e a 'promoção da cultura da tolerância'. Aras também disse que os denunciados pelos atos golpistas precisam ter direito ao 'devido processo legal'. A PGR pediu ontem ao Supremo que as defesas dos presos por envolvimento nos protestos tenham acesso 'imediato' aos autos.

"Os fins não justificam os meios. A invocação de fins nobres, qual a tutela do regime democrático, não há de desnaturar da aplicação razoável, proporcional e adequada nas normas constitucionais plasmadas em 1988", disse Aras.

Reabertura do Ano Judiciário
O Supremo Tribunal Federal retoma os trabalhos nesta quarta-feira, após o edifício ter sido invadido e depredado por apoiadores do presidente Jair Bolsonaro (PL) no dia 8 de janeiro. Apesar da pauta morna prevista para o primeiro semestre, o tribunal tem pontos de tensão a enfrentar em 2023, como o julgamento de golpistas denunciados pela Procuradoria-Geral da República, além da substituição de dois de seus ministros - Rosa Weber e Ricardo Lewandowski, que vão se aposentar aos 75 anos de idade, abrindo caminho para o presidente Lula indicar mais dois nomes para compor o colegiado.

O STF foi o principal alvo de aliados do ex-presidente Jair Bolsonaro durante o mandato do ex-chefe do Executivo, o que refletiu na atuação de extremistas durante a ofensiva violenta: cadeiras dos ministros foram jogadas nos jardins e o brasão da República foi arrancado nas paredes do plenário.

Apesar de marcar a primeira reunião colegiada presencial do STF, a sessão desta quarta mal parece simbolizar o retorno dos trabalhos do tribunal - em meio ao recesso, os ministros realizaram julgamentos extraordinários no plenário virtual, ratificando decisões do ministro Alexandre de Moraes que fecharam o cerco contra os golpistas. A atuação do ministro, respaldada pelos demais integrantes da Corte, inclusive resgatou o debate sobre os poderes individuais dos magistrados. Nessa esfera, o Supremo inicia as sessões colegiadas presenciais de 2023 com mudanças no regimento interno na Corte, publicadas no último dia 19.

Aprovadas pelo Supremo no final do ano, as mudanças estabelecem que decisões urgentes assinadas individualmente pelos ministros do STF serão submetidas, imediatamente, a referendo do plenário. 
 Se o despacho implicar em prisão, a confirmação ou não da medida terá de ocorrer em sessão presencial. Além disso, os magistrados vão ter 90 dias para devolver processos com pedidos de vista ou então os autos serão liberados automaticamente para avaliação dos demais ministros da Corte.
Em meio a um início de ano turbulento, a presidente da Corte, ministra Rosa Weber elaborou uma pauta de julgamentos para o primeiro semestre sem temas polêmicos.  
Ações sobre o marco temporal para demarcação de terras indígenas, a descriminalização do aborto, a graça concedida pelo ex-presidente Jair Bolsonaro ao ex-deputado Daniel Silveira e juiz de garantias ficaram de fora da lista de processos a serem analisados pelo STF, pelo menos até junho.
 
Após a cerimônia de abertura do ano Judiciário, o primeiro tema a ser enfrentado pelos ministros é da área tributária, envolvendo os 'limites da coisa julgada'.  
Os magistrados vão discutir se decisões que já autorizaram o contribuinte a deixar de pagar determinado tributo perdem efeito quando a Corte toma nova decisão que considere a cobrança constitucional. 
Ou seja, se a quebra do efeito é automática ou não. O rol de atividades do STF no primeiro semestre também prevê discussões relativas à esfera ambiental e penal.

O colegiado deve analisar em breve as denúncias apresentadas pela procuradoria-geral da República contra depredadores das sedes do Congresso, Planalto e Supremo, inclusive grupos que foram presos no acampamento bolsonarista montado em frente ao Quartel General do Exército em Brasília.

A decisão de colocar os acusados pelo Ministério Público Federal no banco dos réus tem de partir do Plenário, conforme regra do regimento interno da Corte. Até o momento, 479 investigados foram denunciados por crimes como associação criminosa e incitação ao crime equiparada pela animosidade das Forças Armadas contra os Poderes Constitucionais.

Blog do Fausto Macedo - O Estado de S. Paulo


quarta-feira, 19 de outubro de 2022

Os negros são de direita - Revista Oeste

Cristyan Costa

Resultado das eleições sepultou a tese segundo a qual apenas a esquerda representa as minorias

Candidatos negros eleitos dos partidos de direita | Foto: Montagem Revista Oeste/Redes Sociais/Reprodução 

Candidatos negros eleitos dos partidos de direita | Foto: Montagem  Revista Oeste/Redes Sociais/Reprodução

Por meio de um longo processo de cooptação cultural, a esquerda monopolizou uma série de bandeiras. 
Preservação do meio ambiente, combate ao analfabetismo e defesa das mulheres, dos pobres, dos gays e dos negros, por exemplo, são vistos por muitos como pautas defendidas exclusivamente pelos autodenominados progressistas. 
Nas escolas e nas universidades, militantes fantasiados de professores ensinam todos os dias que esses são os únicos porta-vozes das “minorias”. Já a “direita” é apresentada como reacionária, egoísta, fascista e preconceituosa, sobretudo com pessoas discriminadas e em vulnerabilidade.

Contradizendo essa narrativa, as eleições deste ano mostraram o Brasil real. Os partidos de direita foram os que mais elegeram candidatos que se autodeclararam pretos ou pardos para a Câmara dos Deputados. Somadas, as legendas conservadoras, de centro e de esquerda registraram a vitória de 135 candidatos desse público (108 pardos e 21 pretos), o equivalente a 25% da Casa. Brancos são 387, totalizando 75% dos representantes. Diferentemente do que diz a esquerda sobre a “falta de interesse” desse público por política, o número de candidatos negros aumentou. Neste ano, foram 4,8 mil, ou cerca de 50% dos pouco mais de 10 mil postulantes. Em 2018, foram 3,5 mil (42% de 8,6 mil).

Em 2018, deputados federais negros eleitos eram 123 (102 pardos e 21 pretos) e corresponderam a 24,5% na formação da Casa. Os dados sobre a cor dos candidatos começaram a ser coletados em 2014. Naquele ano, a composição da Câmara dos Deputados pós-votação ficou em 20% de negros e 80% de brancos. A regra que prevê maior distribuição do fundo partidário às siglas que conseguissem mais votos para negros e pardos ajudou a influenciar no aumento da representatividade no Congresso.[ninguém pode obrigar o eleitor a votar em candidato que ele não queira;  
mas, os partidos políticos, especialmente os nanicos, podem na busca por mais dinheiro do fundo partidário, dificultar que candidatos não pardos e não pretos se candidatem. 
É um 'sistema de cotas' que restringe a liberdade do leitor de escolher seu candidato - a escolha só pode ser efetuada entre os registrados em um partido político.]


A representatividade em números

O maior número de parlamentares negros eleitos neste ano é do Partido Liberal (PL), do presidente Jair Bolsonaro, diariamente chamado de racista pelos adversários
A sigla do chefe do Executivo conseguiu garantir 25 assentos para parlamentares desse segmento na Casa. O deputado Hélio Negão (RJ) é um deles. “Eleitores conservadores elegem mais negros porque a direita não enxerga a cor da pele”, constatou o congressista. “A direita vota em quem pode melhor representá-la, e isso, naturalmente, leva à escolha de negros, brancos e de indivíduos miscigenados, todos eleitos sem ter a cor da pele como cabo eleitoral.”
Hélio Lopes, deputado federal reeleito | Foto: Carolina Antunes/PR

Segundo Hélio, a sociedade aumentou a sua representatividade real no Congresso porque, finalmente, encontrou figuras que falaram aquilo que resume a vontade da maioria, diferentemente do discurso propagado pela esquerda. “Há mais parlamentares que pensam, lutam, votam e atuam como esperam aqueles que lhes conferiram os seus mandatos”, afirmou Hélio.Seremos como anticorpos aos partidos de esquerda”, prometeu. Eles pretendem nos levar, progressivamente, à barbárie, atacando a vida, a propriedade, a família, a religião, a liberdade e querem saquear o bolso de todos os brasileiros.”

A deputada Silvia Cristina (PL-RO) é outra parlamentar negra eleita por um partido de direita. Segundo ela, os eleitores não aprovam a tese de que só a esquerda cuida das minorias. “Os brasileiros entenderam que o combate ao racismo, por exemplo, é também uma bandeira da direita”, observou. “Os eleitores conservadores e liberais podem representar as minorias.” Na mesma linha de Hélio, Silvia afirma que os eleitores queriam um posicionamento mais claro das pautas, e isso foi bem identificado pela direita, que conseguiu traduzir melhor o sentimento da maioria, até para receber membros de outras siglas que perderam identidade.

Ex-PDT, Silvia deixou a legenda por não encontrar espaço para a divergência de ideias. “Fui bem recebida no PL e sinto-me bem para expor minhas ideias”, disse. “Quando estive no PDT e fiz votações contrárias, ficou ruim, porque eu queria que eles entendessem a minha regionalidade”, lembrou Silvia. “Levaram isso como uma afronta aos interesses da cúpula, mas eu estava defendendo o meu eleitorado. Cheguei a responder um processo disciplinar. Já no PL, fui bem acolhida e tratada de maneira respeitosa.”

“A nova bancada de negros na Câmara mostrou que não somos pets na coleira da esquerda”

Também o Republicanos registrou uma vitória expressiva de candidatos pretos ou pardos para a Câmara. Foram 20 nesta disputa, sendo um deles a deputada Rosângela Gomes (RJ). Na sequência, outras legendas que se põem à direita do espectro político e elegeram negros foram o União Brasil (17) e o Partido Progressistas (15).

Maior representante da esquerda na próxima legislatura, o PT terá menos de um quarto de parlamentares pretos ou pardos entre seus novos integrantes na Câmara (23%). A sigla de Lula, que reivindica para si o protagonismo da defesa das minorias, elegeu 16 deputados federais negros, ocupando o quarto lugar quando o assunto é eleger esse público. O desempenho é mais vergonhoso nas demais siglas de esquerda. Seis candidatos pretos ou pardos foram eleitos para a Câmara pelo PDT, quatro pelo PCdoB, dois pelo PV, dois pelo PSB e um pela Rede Sustentabilidade.

Legendas de centro tiveram uma contribuição relativamente melhor que os satélites do PT. As urnas mostraram que negros e pardos conseguiram oito vagas pelo MDB, seis pelo PSD e cinco pelo Podemos. Na sequência, dois foram eleitos pelo Avante, dois pelo Pros e um pelo Solidariedade. Cidadania, Novo, Patriota, PSC, PSDB e PTB não elegeram nenhum deputado pardo ou preto. Proporcionalmente, entre as maiores bancadas, o Republicanos é o partido com maior presença de pessoas declaradas negras em sua lista de eleitos (49%), seguido de PP (32%), União (29%) e PL (25%).

Perda de força e de identidade
Desde a Lava Jato, o impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff e a eleição de Jair Bolsonaro, a esquerda brasileira vem perdendo força no cenário político. A desidratação é nítida no Parlamento. Sem pautas nem representatividade, os partidos “progressistas” juntaram-se em federações para sobreviver no Congresso. 
A maioria dos nomes que a esquerda elegeu neste ano é da velha guarda. Os políticos tradicionais esperam ainda a volta de Lula para continuar com os aparelhos ligados na UTI.

O cientista político Márcio Coimbra, professor da Universidade Presbiteriana Mackenzie, afirma que a esquerda diminuiu por perder controle sobre núcleos da sociedade que dominou no passado, em virtude de alguns fatores sociais, a partir dos protestos em 2013. “Aos poucos, com maior abertura do processo político e com a entrada da direita no poder, houve a penetração do espectro político nesses grupos”, disse. Segundo o especialista, essa perda de poder ficou mais acentuada com a Operação Lava Jato e o fortalecimento do sentimento antipetista. “Mulheres, gays e negros começaram a procurar outras ideologias políticas”, observou Coimbra. “A direita aprendeu a dialogar.”

“Os partidos de direita souberam organizar-se”, afirmou Manuel Furriela, cientista político e professor da FMU. “A direita fez uma análise muito bem-feita da sociedade, identificando os aspectos religiosos e econômicos de seu público.” O especialista disse que a onda de direita não é uma jabuticaba brasileira. “França e Itália, por exemplo, são países que escolheram representantes com plataformas econômicas pró-mercado. Esse espectro político soube fazer uma análise mais aprofundada da sociedade e mostrou que veio para ficar.”

Negro, o pastor e produtor musical Wesley Ros, crítico do racismo estrutural e um dos poucos a divergir do pensamento do establishment de esquerda, diz esperar que a onda conservadora no Congresso seja uma tendência. “A esquerda usa as minorias na intenção de dividir e conquistar”, observou Ros. “Uma vez que nos unimos, desmontamos a arquitetura que existe dentro da ‘senzala ideológica’. A nova bancada de negros na Câmara mostrou que não somos pets na coleira da esquerda.”

Leia também “O Congresso é a cara do Brasil”

Cristyan Costa, colunista - Revista Oeste

 

sexta-feira, 13 de maio de 2022

O ativismo judicial e a barbárie - Ana Paula Henkel

Revista Oeste

O que também está no centro desse debate não é apenas a proteção à vida humana, mas a manutenção do federalismo, um dos pilares mais preciosos da República norte-americana

Um dos casos de extravagante ativismo da Suprema Corte norte-americana continua dominando os noticiários e os veículos de comunicação aqui nos Estados Unidos, depois que um documento sigiloso foi vazado na última semana, fato inédito e criminoso, de que a Corte pode reverter o polêmico caso Roe vs. Wade. Para entendermos as raízes do raro ativismo de uma Corte estritamente constitucional, permitam-me voltar ao caso de 1973.

Em 1969, Norma McCorvey, uma mulher do Texas, na casa dos 20 anos, tentava interromper uma gravidez indesejada. Na época, o aborto era legal no Texas, mas apenas com o propósito de salvar a vida da mãe. McCorvey procurou então duas recém-formadas advogadas da Escola de Direito da Universidade do Texas e, juntas, entraram com uma ação federal contra Henry Wade, promotor público do condado de Dallas, onde McCorvey morava. A ação alegava que a lei do Estado violava os direitos constitucionais da autora, que passou a ter o pseudônimo de “Jane Roe”, para proteger sua identidade.

No cerne da decisão da Corte de 1973 está a 14ª Emenda da Constituição norte-americana, que tem em sua cláusula de devido processo a seguinte declaração: “Nenhum Estado fará ou fará cumprir qualquer lei que restrinja os privilégios ou imunidades dos cidadãos dos Estados Unidos; nem qualquer Estado privará qualquer pessoa da vida, liberdade ou propriedade, sem o devido processo legal; nem negar a qualquer pessoa dentro de sua jurisdição a proteção igual das leis”.

Pois bem, puxando a Declaração de Direitos e a cláusula do devido processo da 14ª Emenda para esse caso, a Suprema Corte norte-americana criou implicitamente uma “zona de privacidade”. O tribunal decidiu dar aquela distorcida na Constituição, manobra tão familiar aos brasileiros, e decidiu “levantar” um possível “direito fundamental à privacidade” presente na 14ª Emenda que englobaria o direito de a mulher decidir, junto com sua família e seu médico, se deveria ou não continuar uma gravidez. O Tribunal concluiu que a zona era “ampla o suficiente para abranger a decisão de uma mulher de interromper ou não a gravidez”, num dos casos de maior ativismo judicial da história dos Estados Unidos.

Logo após a decisão de Roe vs. Wade ser proferida, o juiz da Corte Harry Blackmun, redigindo a opinião da maioria, determinou que incluíssem na cláusula um direito implícito à privacidade para as mulheres que decidissem interromper a gravidez. Blackmun sustentou que tal direito a partir daquele momento se tornava uma parte indivisível da “liberdade à privacidade” de cada norte-americano, que é especificamente protegida na cláusula de devido processo da 14ª Emenda; e que tal proteção mais do que supera qualquer interesse do Estado em usar estatutos do aborto — como tantos outros Estados têm — para regular a conduta sexual, mesmo que indiretamente. Um feto, acrescentou o juiz, “não é uma pessoa segundo a Constituição e, portanto, não tem direito legal à vida”, uma conclusão à qual incontáveis defensores da vida e contra o aborto se opõem violentamente. Blackmun também foi influenciado pelo fato de que a maioria das proibições ao aborto foi promulgada no século 19, quando o procedimento era mais perigoso do que em 1973. Ele acrescentou que diferentes padrões para diferentes estágios da gravidez são em grande parte um reflexo do progresso médico e que o aborto nos primeiros três meses havia se tornado pelo menos tão seguro quanto o parto.

Com o tempo que o caso demandou sendo levado até a Suprema Corte, Norma McCorvey deu à luz seu terceiro filho e entregou a criança para adoção, mantendo-se discreta após a decisão do tribunal. Embora na década de 1980 ela estivesse ativa no movimento pelo direito ao aborto, em meados da década de 1990, depois de fazer amizade com coordenadores de um grupo pró-vida e se converter ao catolicismo, ela se tornou uma oponente vocal do procedimento abortivo, declarando abertamente que havia sido usada pelos movimentos ativistas. Norma palestrou por todo o país contra as barbáries cometidas nas clínicas abortivas, como a Panned Parenthood, criada pela eugenista Margaret Sanger.

A verdade sobre a Planned Parenthood
Sanger abriu a primeira clínica de controle de natalidade nos EUA em 1916 e fundou a American Birth Control League em 1921, instituição que mudou o nome para Planned Parenthood em 1942. O movimento de controle de natalidade de Margaret Sanger e a busca pela pílula anticoncepcional cruzaram com a ascensão do movimento de eugenia na América. Numa época em que o controle de natalidade ainda não era aceito publicamente na sociedade norte-americana, alguns eugenistas acreditavam que esse controle era uma ferramenta útil para conter a procriação entre os “fracos”. A eugenia era um tema dominante em suas conferências sobre controle de natalidade, e, em 1920, Sanger falou publicamente sobre a necessidade de acabar com a procriação por pessoas “inaptas”, declarando abertamente que “o controle da natalidade é nada mais nada menos do que a facilitação do processo de eliminar os inaptos e de prevenir o nascimento de deficientes”.

Após a Segunda Guerra Mundial e o Holocausto, a barbárie de qualquer ideia ligada à eugenia foi exposta, e o pensamento racista defendido por muitos logo foi esquecido. Mas enquanto Margaret Sanger era elogiada por seu papel na criação da pílula anticoncepcional na década de 1960, muitos na comunidade afro-norte-americana se lembraram de sua associação com a eugenia. Suspeitando de suas intenções, alguns ficaram chocados com seu apoio contínuo ao movimento de controle populacional, e muitos acreditavam que o motivo de Sanger não era ajudar as mulheres negras, mas eliminar futuras gerações negras. Ao promover o desenvolvimento da pílula anticoncepcional na década de 1950, Sanger havia anunciado como a panaceia para a superpopulação mundial, a fome e a pobreza. Sanger escreveu: “Considero que o mundo, e nossa civilização nos próximos 25 anos, vai depender de um anticoncepcional simples, barato, seguro, para ser usado em favelas, selvas e entre as pessoas mais ignorantes”.

A organização pró-vida estima que mais de 63 milhões de abortos ocorreram de 1973 até maio de 2022

Embora as mulheres afro-norte-americanas apreciassem a eficácia e a confiabilidade dos contraceptivos orais e usassem o método em grande número, elas se ressentiam da maneira como as organizações dominadas por brancos pareciam empurrar a pílula nas comunidades negras. Curiosamente, até os dias de hoje, a grande maioria das clínicas abortivas da Planned Parenthood, que se travestem com slogans bondosos sobre “a saúde da mulher”, está em comunidades negras espalhadas pelo país. Vidas negras importam. Mas quais? Não a de bebês negros para muitos da bolha hedonista de Hollywood, para as feministas e para membros do Partido Democrata que juram proteger as minorias.

De volta ao caso Roe vs. Wade
Desde 1973, quando a Suprema Corte resolveu emendar a Constituição sem anuência das Casas legislativas (isso soa tão familiar, não é mesmo?), muitos Estados norte-americanos impuseram restrições — através de suas Casas legislativas — que enfraqueceram o ativismo pró-aborto. No entanto, milhões de norte-americanos continuaram divididos sobre o apoio ao direito da mulher de escolher o aborto, até que o novo partido de Joe Biden decidiu empurrar políticas extremas e radicais sobre o assunto. Nesta semana, por exemplo, o atual Partido Democrata foi derrotado no Senado, mesmo detendo maioria na Casa, diante de um projeto de federalização das leis abortivas que implementariam em todo o país a legalização do aborto até o último minuto gestação. Sim, você leu corretamente. Até o último minuto.

O que também está no centro desse debate não é apenas a sagrada proteção à vida humana, defesa importante para um país fundado em preceitos religiosos, mas a manutenção de um dos pilares mais preciosos da República norte-americana: o federalismo e a autonomia dos Estados de passar suas próprias leis, dentro da Constituição, de acordo com o que a população deseja. O que a Suprema Corte fez em 1973 foi tirar do povo o direito de decidir, seja através de seus representantes no Congresso, seja nas legislaturas estaduais. Se na Califórnia, no Texas, em Nova Iorque ou em Kentucky as questões polêmicas têm premissas muito diferentes, cabe ao povo, e somente ele, decidir que rumo tomar para essas decisões. Direito e dever que não pertencem a um bando de togados ativistas que “interpretam” a Constituição de acordo com o que pensam da sociedade.

Comitê Nacional do Direito à Vida
Mas nem só de documentos e palavras jurídicas vive o caso Roe vs. Wade. O Comitê Nacional do Direito à Vida (National Right to Life Committee — NRLC), a organização pró-vida mais antiga do país, estima que mais de 63 milhões de abortos ocorreram de 1973 até maio de 2022. A estimativa de quantas vidas foram ceifadas nos ventres de suas mães foi coletada por meio de dados de rastreamento dos Centros de Controle e Prevenção de Doenças (CDC) e do Instituto Guttmache, que anteriormente serviu como um braço de pesquisa do proeminente provedor de aborto do país, a Planned Parenthood.

Como já explorado por mim em outros artigos aqui em Oeste, a eleição de Donald Trump em 2016 teve um impacto significativo no recente movimento da Corte em revisitar o caso e, possivelmente, revertê-lo, como mostra o documento vazado. Um dos pontos fortes da campanha de Trump em 2016 — e um dos motivos para a sua eleição — foi a possibilidade de indicar, no mínimo, dois nomes para a SCOTUS. Ao sair da Casa Branca, Donald Trump havia colocado centenas de juízes constitucionalistas nas esferas federais e três justices — originalistas e constitucionalistas — na Suprema Corte. E isso com a ajuda de milhões de votos de cristãos que, mesmo não gostando de Trump, votaram no republicano sonhando com a possível reversão de Roe vs. Wade.

A defesa ativista de Roe vs. Wade levou o tribunal a negar o próprio fundamento da Constituição norte-americana e da lei ocidental: os direitos naturais. Em uma passagem de uma decisão da Suprema Corte de 1992, no caso Planned Parenthood vs. Casey, o juiz Anthony Kennedy, nomeado por Ronald Reagan, escrevendo para a maioria, disse: “No coração da liberdade está o direito de definir o próprio conceito de existência, de propósito, de universo e do mistério da vida humana. Crenças sobre esses assuntos não podem definir os atributos da personalidade se fossem formadas sob coação do Estado”.

É claro que derrubar Roe não encerrará a luta para proteger a vida humana no útero, mas é a batalha mais importante nessa guerra, aqui nos Estados Unidos e também pelo que o caso simboliza no mundo. Sob Roe, os norte-americanos foram sitiados em seu próprio território e forçados a tentar várias táticas para contornar as restrições que a Suprema Corte colocou sobre todos os cidadãos. Com a queda de Roe, a política de aborto será definida pelos Estados — e há um argumento sólido de que o aborto é inconstitucional, embora ninguém espera que a Suprema Corte o adote neste caso. Desde que a decisão Roe vs. Wade foi emitida em 1973, o caso continua sendo um dos mais contenciosos na esfera pública, inspirou campanhas e movimentos políticos e gerou debates em todo o país em torno da ética, da religião, da biologia e do direito constitucional.

O simbolismo do fim de Roe vai além da bela e justa proteção à vida: será um triunfo da defesa fiel dos impotentes contra os poderosos, de juízes e niilistas de Washington a Hollywood. No entanto, os defensores da vida não devem ficar complacentes depois de derrubar Roe, pois tal decisão apenas devolverá a política de aborto aos processos norte-americanos comuns de democracia representativa, sagradamente protegidos nas fundações da República. Quando Roe cair, alguns Estados restringirão ou proibirão abortos eletivos, outros continuarão a celebrá-los e subsidiá-los. O movimento pró-vida ainda enfrentará muitas batalhas. No Brasil, o mesmo movimento da Suprema Corte norte-americana de 1973, da legislação do aborto pelas vias judiciárias, tenta ganhar fôlego e ares de normalidade. Para o ativismo a letra fria da lei, mas também podemos mostrar que existe um modo de vida melhor do que aquele incentivado por uma cultura do aborto.

Norma McCorvey faleceu em 2017, e em uma de suas últimas entrevistas ela disse: “Você lerá sobre mim nos livros de história, mas agora posso dizer que passei grande parte da minha vida dedicada a espalhar a verdade sobre a preservação da dignidade de toda vida humana, desde a concepção natural até a morte natural”. Que a luta de McCorvey não seja em vão. Sem Roe vs. Wade, as leis estaduais norte-americanas que protegem a vida humana no útero não serão constantemente bloqueadas pelos tribunais federais, e, assim, muitos Estados aplicarão prontamente as leis que restringem a crueldade e a barbárie contra vidas indefesas e sem voz dentro do ventre de suas mães.

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Ana Paula Henkel, colunista - Revista Oeste