“Tenho seis filhos. Hoje (sexta-feira 18) comprei três cenouras, um pepino e três limões. É o jantar, vai ter de durar por três noites. Tenho um pouco de arroz e feijão. Perdi o emprego por causa desse vírus que está aí”. Bárbara Daniela dos Santos

E, como não há nada que esteja tão ruim que não possa piorar, o preço da comida mais básica disparou, praticamente anulando o efeito do auxílio emergencial. Tomem-se os últimos doze meses. O arroz subiu 19,2%, o feijão preto 28,92%, o feijão carioca 12,12%, o óleo de soja 18,6%. E o sempre barato frango tornou-se nobre: foi majorado 7%. Há saída? Sim, se as elites deixarem de ser autofágicas e autopredatórias. Na análise de Belik, há quatro fatores para a superação da insegurança alimentar: disponibilidade de alimentos, acesso a eles, oferta constante e a qualidade do produto. E, acrescente-se, destravar a produção já, e criar empregos já.

“Estou há dois dias sem colocar uma comida dentro do corpo. Meu companheiro e meu filho estão desempregados e a panela vazia. Moço, não vou mostrar minha casa porque tenho vergonha. Ah, adotei um cachorro, o Scooby. Quando temos o que comer, ele come também”. Cleusa Alves

ISTOÉ conversou também com três famílias da zona leste de São Paulo. Evocando e adaptando expressões de Machado de Assis, que passou fome na infância, nasceu no Morro do Livramento e era negro, algumas dessas pessoas “têm a resignação cristã”, mas todas “possuem a alma calejada da miséria”:

“Tá dando. Vou no final da feira para pegar as sobras e fazer sopa. Tenho seis filhos, todos estão sem peso por causa da falta de alimentação. Eu prefiro que eles jantem e não almocem para não dormirem com fome”. Helen Rose

Não se trata somente de um mês, um ano, uma década. O triste e trágico choro brasileiro dá-se dessa forma ao longo de cento e trinta anos republicanos. As mulheres chefiam 61% dos lares nos quais há insegurança alimentar. Sem dúvida, esse é um dos mais tristes estudos já feitos pelo IBGE. Triste, porém urgente e necessário. E poderá deixar de sê-lo se o governo atual e os governantes futuros lembrarem que a fome que eles não sentem é a fome que estufa de ar a barriga de infinito contingente de brasileiros e brasileirinhos.

“Tenho oito filhos, já grandes e desempregados, e netos. Na segunda-feira (dia 21), eu estava apenas com três pequenos pedaços de batata doce na geladeira. Mas me sobra valentia: enquanto eu viver, ninguém aqui morre de fome. Toda as manhãs, quando saio da cama, a primeira coisa que penso é: o que vou dar para os netos comerem?”. Francisca da Silva

“A fome é uma dor que começa no estômago. Entra na alma e aí a lágrima vem”. Lucas José de Oliveira