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domingo, 10 de julho de 2022

Nem a Constituição pegou - Carlos Alberto Sardenberg

Nem a Constituição pegou 

Considerando que muitas leis não pegam no Brasil, pessoas de boa fé, dentro e fora do sistema político, entenderam, ao longo de décadas, que normas realmente importantes deveriam ser gravadas na Constituição. Assim foi feito – e por isso a nossa Carta Magna é tão extensa. E tão descumprida e emendada.

Está acontecendo de novo.

Em 15 de dezembro de 2016, governo Temer, foi sancionada a Emenda Constitucional número 95. Estabelecia um novo regime fiscal, baseado na novíssima regra do teto de gastos. Por esta, se determinava que a despesa do governo federal em um determinado ano seria igual à do ano anterior mais a inflação. Vigência: até 2036.

Ideia boa: com isso, o gasto público permaneceria constante em termos reais. Com o esperado crescimento do país, o setor público teria seu (excessivo) peso reduzido em relação ao setor privado. As contas do governo seriam colocadas em rota de equilíbrio o tão falado equilíbrio fiscal reduzindo-se déficits e dívida pública.

Mas esses eram exatamente os objetivos da Lei de Responsabilidade Fiscal, legislação infra-constitucional, sancionada em 4 de maio de 2000, na gestão FHC. Parte importante da consolidação do Real, a norma determinava que o orçamento do governo federal deveria ter metas explícitas de receitas e despesas, prevendo-se superávit primário de modo a que sobrassem recursos para a amortização progressiva da dívida pública.

Para espanto de muitos, a regra funcionou corretamente durante muitos anos. Na primeira gestão de Lula – para espanto de muito mais gente – o governo federal produziu superavits enormes, de até 4,5% do PIB, colocando a dívida em queda e, assim, garantindo o ajuste fiscal. [importante destacar que nos dois primeiros anos do primeiro mandato do governo do descondenado - porém, não inocentado -  a quadrilha petista estava sendo montada e começou suas atividades via  MENSALÃO, roubando de forma modesta.]

No segundo mandato, Lula começou a retomar a expansão do gasto público. A economia mundial ajudava, o governo tinha mais dinheiro. De todo modo, a regra básica da LRF foi mantida.

Dilma estragou tudo. Baseada na tese de que o gasto público tinha poderes universais – servia para melhorar tudo a presidente inventou as pedaladas fiscais para aumentar a despesa em termos reais, fingindo manter a meta de superávit.

Teria sido melhor se tivesse proposto Emenda Constitucional para mudar o regime fiscal
Melhor no sentido de que colocaria a questão em debate aberto. 
Mas como isso poderia pega mal e gerar crises de confiança, Dilma optou pelos truques – como o de espetar despesas do governo federal na Caixa e no Banco do Brasil.

Conhecem o resultado. Déficits, dívida, juros mais altos, inflação, recessão.

Vem o governo Temer com o objetivo de restaurar o equilíbrio fiscal. Como a LRF não pegara, optou-se pela Emenda Constitucional, aquela de número 95.

Ingênuos pensaram: agora ninguém mais rasga.

Rasgaram. E não foi o PT, mas um governo que se apresentara como anti-petista, com o apoio do Centrão, súcia de partidos e blocos parlamentares, cuja vida política está centrada no gasto de dinheiro público conforme seus interesses eleitorais.

Assim chegamos à PEC Kamikase, uma proposta de emenda constitucional para burlar a Constituição e permitir que o governo federal gaste fora do teto. [a matéria omite que a PEC em questão é a única alternativa para reduzir a fome (reduzir, para acabar só com o crescimento econômico,  que com as bênçãos de DEUS vai deslanchar no segundo mandato do governo Bolsonaro.) de milhões de brasileiros. A única forma para atenuar os malefícios advindos de uma pandemia. Lembramos que rejeitar a PEC equivale na prática a decretar "que as pessoas só devem deixar de passar fome depois que a eleição passar". Vale a pena criar no Brasil, para satisfazer à esquerda maldita, um HOLODOMOR?] 

Eis o país de novo no ambiente do desequilíbrio das contas públicas, com mesmas consequências de antes. Por exemplo: o dólar caro, fonte adicional de inflação.

E sabem o que mais impressiona? A ampla maioria a favor da PEC, incluindo as oposições variadas. Mais ainda: o candidato favorito, Lula diz que esse negócio de teto de gasto é uma furada, coisa do mercado financeiro. Aliás, prometia acabar com o teto. Não precisa mais. Bolsonaro e o Centrão já fizeram o serviço.

Assim, os dois principais candidatos e a maioria do Congresso, que deve ser reeleita, anunciam que vão se fartar no gasto público. Como cada setor do eleitorado acha que será especialmente beneficiado com esse gasto, a farra fiscal está garantida. As consequências também, e de novo: inflação, juros altos, baixo crescimento econômico.

Considerando que a emenda constitucional do teto de gastos não pegou, a que outra legislação se poderia recorrer? [a CF 1988, vigente, apesar de extensa, tem muitas falhas (talvez fruto da pretensão dos seus autores de constitucionalizar tudo) e um dos poucos acertos é que pode ser emendada - cabendo, em nosso entendimento, logo que possível, alguns ajustes no artigo 60.]

Biblia, talvez?

Carlos Alberto Sardenberg, jornalista 

 Coluna publicada em O Globo - Economia 9 de julho de 2022

 

quinta-feira, 29 de outubro de 2020

Maia ofende Campos Neto, presidente do Banco Central, nas redes sociais, mas depois recua

Presidente da Câmara havia se queixado do presidente do BC por suposto vazamento de conversa telefônica. Mas em seguida alegou que a ação teria sido de terceiros e afirmou ter confiança no chefe da instituição financeira. Impasse na votação da LDO causa atrito entre o Legislativo e o Executivo. As críticas do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), agora chegaram ao presidente do Banco Central (BC), Roberto Campos Neto. Maia acusou Campos Neto de ter vazado à imprensa uma conversa dos dois sobre o impacto da crise política no andamento das pautas econômicas. E atacou: "Atitude não está à altura de um presidente de Banco de um país sério". 
"A atitude do presidente do Banco Central de ter vazado para a imprensa uma conversa particular que tivemos ontem não está à altura de um presidente de Banco de um país sério", reclamou Rodrigo Maia, nas redes sociais, na manhã desta quinta-feira (29/10).

O parlamentar se referia a uma conversa com o presidente do BC que veio à tona na noite de quarta-feira (28/10), após Campos Neto telefonar para Maia para manifestar preocupação em relação ao impacto da crise política no andamento das pautas econômicas. Depois da crítica, contudo, Maia voltou ao Twitter para informar que recebeu uma ligação de Campos Neto, que negou ter divulgado o conteúdo dessa conversa à imprensa. "Diante da palavra do presidente, o vazamento certamente foi provocado por terceiros. Deixo aqui registrado a ligação e a confiança que tenho nele", escreveu o deputado.

A Câmara está com as votações suspensas por conta de obstrução do Centrão de Arthur Lira (PP-AL), que quer emplacar a deputada Flávia Arruda (PL-DF) na presidência da Comissão Mista de Orçamento (CMO), apesar do acordo que havia sido realizado no início do ano para que o cargo ficasse com Elmar Nascimento (DEM-BA), aliado de Maia. [Maia se acostumou a se considerar, e ser considerado por alguns,  o 'dono' da Câmara - condição que acumulava com a de autonomeado primeiro-ministro;  - agora, encontra resistência e não se conforma com  o inicio do fim do poder que pensava ter.] quando encontra resistência nO atraso na instalação da CMO também tem preocupado o Tesouro Nacional, que não sabe como vai executar o Orçamento no início do próximo se a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) não for aprovada. Outras pautas importantes para a equipe econômica, como as reformas e as privatizações, também não têm avançado no Legislativo.

O presidente do Banco Central teria mostrado preocupação especialmente em relação às reformas, pois a autoridade monetária entende que o andamento dessa agenda é fundamental para afastar as incertezas sobre o ajuste fiscal e, assim, garantir a manutenção dos juros baixos e da inflação baixa. Nessa quarta-feira, por exemplo, o Comitê de Política Monetária (Copom) manteve a taxa básica de juros (Selic) em 2% ao ano, mas avisou que "questionamentos sobre a continuidade das reformas e alterações de caráter permanente no processo de ajuste das contas públicas podem elevar a taxa de juros estrutural da economia".

Como já havia feito ao ser questionado sobre esse impasse pela imprensa nesta semana, Maia teria dito a Campos Neto que a obstrução parte da própria base do governo, que agora inclui o Centrão. "Não sou eu que estou obstruindo, é a base do governo", reclamou à imprensa. Na ocasião, o deputado ainda disse esperar que "o governo tenha mais interesse e a própria base tire a obstrução da pauta da Câmara" quando chegar a hora de votar a PEC Emergencial e a reforma tributária.

Impasses
Rodrigo Maia também já se desentendeu, diversas vezes ao longo da pandemia de covid-19, com o ministro da Economia, Paulo Guedes, sobre a agenda econômica. O parlamentar não concorda, por exemplo, com a proposta de Guedes de recriar a CPMF. E o ministro já acusou o deputado de ter feito um acordo com a esquerda para emperrar as privatizações. Recentemente, contudo, os dois fizeram as pazes, em um jantar simbólico com deputados e ministros do Tribunal de Contas da União.

A união entre Maia e Guedes visa garantir a manutenção do ajuste fiscal e do teto de gastos, bem como o andamento das reformas. Afinal, o governo vem sofrendo pressão para aumentar os gastos em 2021 e parte do mercado já acredita que o teto de gastos será rompido por conta de discussões como a do Renda Cidadã. Maia e Guedes vêm dizendo, portanto, que qualquer novo programa ficará dentro do teto e que o Orçamento de Guerra não será prolongado para 2021. Recentemente, portanto, as críticas de Maia ao governo estavam centradas no ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles.

Política  - Correio Braziliense




quinta-feira, 26 de março de 2020

Errado está o presidente - Carlos Alberto Sardenberg

Coluna publicada em O Globo - Economia 26 de março de 2020

O pacote norte-americano de apoio à economia chega a cerca de 10% do PIB. 

Se o governo brasileiro aplicasse um programa proporcional, teria de gastar R$ 730 bilhões. Não vai dar. Mas muito pode ser feito.

A crise apanhou o Brasil em pleno processo de recuperação do equilíbrio das contas públicas – o ajuste fiscal. O objetivo, desde a queda de Dilma, tem sido o de reduzir a despesa com a sequência de reformas iniciada com a lei do teto de gastos e depois com a reforma da previdência. Mas ninguém lida com uma calamidade – uma pandemia, uma guerra – fazendo corte de gastos. É justamente o contrário. Trata-se de aumentar a despesa pública duas vezes, uma para cuidar da calamidade, outra para amenizar os efeitos econômicos da crise e das providências para contê-la.

A rigor, nunca houve dúvidas entre economistas e políticos sérios a respeito disso. Os Estados Unidos gastaram uma fortuna para derrotar a Alemanha e o Japão e, depois, outra fortuna para levantar a Europa devastada. [ Plano Marshall, aqui.] Ninguém pensou em poupar dinheiroA pandemia do coronavírus é uma calamidade jamais vista. Logo, todos os governos sérios estão gastando dinheiro com dois objetivos: primeiro, conter a doença, com o isolamento social, e tratar dos doentes e, segundo, apoiar pessoas e empresas afetadas pela parada na economia. A diferença está na rapidez e na eficiência com que os diversos governos estão fazendo isso.

Nos Estados Unidos, por exemplo, o Congresso aprovou o pacote de US$ 2 trilhões quase por unanimidade e com rapidez, apesar dos vacilos de Trump no início da epidemia. No Brasil, o governo federal está atrasado. Governos estaduais estão tomando medidas fortes e positivas, mas enfrentam uma limitação irremovível. Não têm como imprimir dinheiro, nem fazer mais dívida.  Só o governo federal pode fazer isso. Não dá para gastar 10% do PIB. Se o país (governo e sociedade) prezassem a disciplina fiscal, talvez tivéssemos o espaço fiscal para uma tamanha expansão de gastos. Mas cálculos sugerem que se poderia chegar a uma despesa adicional de 3% do PIB, algo como R$ 220 bilhões.

E o ajuste fiscal? Paciência, fica para depois. Aliás, será até mais difícil. O economista Alexandre Schwartsman, por exemplo, calcula que um bom programa de apoio a pessoas e empresas pode elevar a dívida pública de R$ 5,5 trilhões (75,8% do PIB) para R$ 6,3 trilhões (86,7% do PIB). Complica, mas simplesmente não há escolha no momento.
Tudo isso para dizer que o presidente Bolsonaro está completamente equivocado. Para ele, não se trata de uma calamidade, mas de uma gripezinha, perigosa apenas para pequena parte da população. Logo, concluiu, não são necessárias medidas radicais, como o isolamento social e a parada do comércio. Para ele, essas medidas, apresentadas como o remédio, na verdade formam o veneno que vai matar a economia, provocando uma forte recessão. Está errado porque, sem as medidas de contenção (isolamento social e fechamento do comércio e escolas), o vírus vai contaminar muito mais gente; logo, haverá muito mais doentes graves, que necessitarão de mais leitos hospitalares, e mais mortes, muito mais.

No lado econômico, o gasto público vai aumentar e a recessão virá de qualquer modo. Ou seja, relaxar a contenção nem reduz gasto público, nem evita a recessão. E mata mais brasileiros. A outra solução – a da contenção ou das “medidas radicais” – tem esta virtude especial: salva vidas, ao reduzir o número de infectadosTudo considerado, temos um enorme problema no Brasil: o governo federal, que pode arranjar o dinheiro, é comandado por um presidente completamente equivocado. Por isso ainda não saíram as medidas de apoio a pessoas e empresas. Além disso, numa emergência dessas, o setor público tem que agir e gastar de maneira coordenada, para evitar desperdícios. [dificil agir e gastar de maneira coordenada, se o outro lado só aceita a coordenação quando pode ferrar o presidente - grande parte dos governadores, ainda espera um terceiro turno. Quase todos são inimigos do Presidente da República.] Em vez disso, o presidente prefere brigar com governadores. Se ninguém conseguir mudar o curso de ação do presidente, a crise vai aumentar e muito. E o presidente vai tentar colocar a culpa nos outros, qualquer outro, como sempre faz. Um desastre para o Brasil.




sábado, 1 de fevereiro de 2020

Casamentos arranjados - Carlos Alberto Sardenberg

Casamentos arranjados


O secretário especial de Desestatização, Salim Mattar, é certamente um liberal. E militante. Há anos e anos prega o liberalismo e o fato dele estar no governo é um sinal que não se pode ignorar. Experiente homem de negócios, ele não estaria no governo se não acreditasse que pode aplicar um programa liberal. E ele está parcialmente certo quando diz: “Talvez este governo tenha um discurso mais liberal do que está praticando. Concordo, mas nunca governo nenhum teve uma prática tão liberal quanto este”.

Trata-se de verdade parcial porque vale apenas para a área econômica, comandada pelo ministro Paulo Guedes, também ele um óbvio liberal. Mas liberal não se ajusta ao presidente Jair Bolsonaro, como se pode verificar pelas posições tomadas antes de se tornar um candidato presidencial viável. Ele correu para Guedes quando percebeu que precisava de uma política econômica e foi procurar alguém que fosse contra tudo feito pelo PT e pelo PSDB.  Foi, portanto, um casamento arranjado, não por amor, como sacou o ex-presidente do BC Gustavo Franco. Casamentos arranjados podem dar certo – assim como casamentos por amor podem dar errado.

No caso, tem funcionado em parte. Há um ajuste fiscal em curso. Saiu a reforma da previdência, por exemplo, e o déficit das contas públicas de 2019, de R$ 95 bilhões, é o menor em cinco anos. Houve privatizações e concessões. Nada especialmente grande, é verdade. Por ele, Mattar vendia tudo, incluídos Banco do Brasil e Petrobras. Não vai rolar, é claro, mas é melhor vender alguma coisa do que nada. Na lista apresentada por Mattar para os próximos dois anos, tem coisas interessantes, como a Casa da Moeda (para dezembro deste ano), a empresa que controla o porto de Santos (junho/2021) e os Correios (dezembro/21). As concessões estão em outra área e podem avançar.

A política monetária praticada pelo Banco Central vai bastante bem. A taxa básica de juros deve cair mais um tanto na semana que vem, para 4,25%, recorde histórico de baixa, com inflação rolando abaixo da meta. Há outros aspectos liberais no BC, menos visíveis, mas são medidas destinadas a ampliar a competição no mercado financeiro, torná-lo mais aberto, mais livre.O que o governo certamente ainda não conseguiu arrumar – de um modo liberal – está nos grandes fundos controlados pelo Estado, FGTS e FAT, por exemplo. É mais complicado, certamente, e o pessoal do Guedes, como ele mesmo admite, ainda está aprendendo.
De todo modo, mesmo depois da reforma da previdência, os gastos previdenciários e de pessoal são os que mais pesam. Ou seja, falta uma complementação na previdência, inclusive nos estados, e falta a reforma administrativa.

Esta última é uma promessa, junto com a reforma tributária, para este ano ainda. Ambas, especialmente a dos impostos, têm boa aceitação na cúpula do Congresso – e isso é mais do que meio caminho andado. Do outro lado do governo, está claro que o pessoal da cultura, da educação, dos costumes não tem nada de liberal. Ao contrário. É um baita problema. Não pode existir apenas a liberdade econômica, a liberdade de empreender – e aqui, aliás, tem muita coisa para fazer de modo a facilitar a vida de quem quer ganhar dinheiro honestamente.

Tem que ser respeitada a liberdade individual, a de cada um escolher como tocar sua vida, sem controles do Estado. Claro, a lei tem que garantir o direito de todos e o direito coletivo, mas o Estado não pode pretender determinar o que as pessoas devem ou não fazer, podem ou não estudar, podem ou não assistir.  O que nos leva a Regina Duarte. Seria uma liberal na cultura? Sim, seria.  Quem a conhece não a imagina impondo censura, por exemplo. Nem querendo dirigir a cultura nacional, como pretendia o secretário demitido.
Mas teria ela a mesma autonomia de Guedes? Seria possível um casamento tão arranjado de tal modo que o “marido” se comprometesse a não se intrometer nos assuntos da “mulher”?
A ver.

Carlos Alberto Sardenberg, jornalista

 

sexta-feira, 6 de setembro de 2019

Teto voador assombra equipe - Míriam Leitão

Se o teto cair, será licença para gastar 

A equipe econômica já havia conversado com o presidente Bolsonaro, explicando que a pressão que ele estava recebendo de alguns ministros para abandonar o teto de gastos não fazia sentido. Ela pensava estar tudo resolvido, até que Bolsonaro disse na quarta-feira que era uma questão “matemática” sugerindo que o teto tinha que ser mudado. O porta-voz confirmou. Ontem Bolsonaro amanheceu nas redes sociais com a declaração inversa. Ou seja, a matemática mudou durante a noite. E o que ele realmente pensa sobre o assunto?

O problema é maior do que parece. Não é apenas se vai ser adotada uma medida econômica ou outra. Se o teto cair, sem nada no lugar, será uma licença para gastar, o abandono do ajuste fiscal e a derrota completa do ministro Paulo Guedes. O que ele chegou dizendo: que zeraria o déficit no primeiro ano, que acabaria com os subsídios e renúncias fiscais que chegam a R$ 300 bilhões por ano, que venderia R$ 1 trilhão de imóveis e de empresas estatais. E que desindexaria, desobrigaria e desvincularia as despesas. Que faria um pacto federativo em torno da desvinculação.

No mercado financeiro, em momento típico de autoengano, muita gente repetia que o ministro Paulo Guedes, liberal e sofisticado, levaria o presidente Jair Bolsonaro — defensor do fuzilamento do ex-presidente Fernando Henrique por ter privatizado — para o bom caminho. A declaração grosseira de Guedes ontem sobre Brigitte Macron não tem nada a ver com economia, mas mostra que é Guedes quem anda absorvendo o estilo e as ideias do chefe. Também como o chefe, disse depois que era “brincadeira”. segunda declaração anulou a primeira, mas deixou uma dúvida. 

Bolsonaro foi muito enfático ao dizer que era inevitável mudar o teto de gastos. E até explicou que havia se arrependido de ter votado a favor da PEC, avisando que “as pessoas evoluem”. O que os dois dias mostraram é que o presidente não tem convicção alguma sobre a questão-chave que divide hoje o seu governo.  De um lado, o entorno do presidente vem repetindo a ele que o “arrocho” nas despesas vai impedir que ele realize seu projeto de reeleição. De outro, a equipe diz que terá que ser iniciada a duríssima discussão da desvinculação de despesas. Na reforma da Previdência, o presidente cruzou os braços e só os descruzou para fazer defesas corporativistas. Mesmo assim, ela está indo em frente porque políticos convictos da necessidade da reforma fizeram o trabalho que o governo teria que fazer. O problema é que mudar a estrutura rígida das despesas significa dizer ao setor da educação que ele pode não ter mais o mínimo constitucional, para o setor de saúde, a mesma coisa. E todas as receitas que têm endereço certo deixarão de ter. Esse é o debate mais duro possível. Em época de escassez, a tendência é cada setor defender o seu. A soma das partes é sempre maior do que o todo. Por isso o país tem déficit.

O teto de gastos não é a única forma de resolver o problema do déficit primário. Os economistas Fábio Giambiagi e Guilherme Tinoco, que são especialistas em política fiscal e sempre defenderam o equilíbrio das contas públicas, sugerem mudanças do teto porque consideram que seu cumprimento é inviável até 2026. A mudança de posição foi comemorada por economistas que há tempos pedem o fim do teto. Mas Giambiagi e Tinoco colocam uma série de pré-condições, algumas bem duras: o salário mínimo só seria corrigido pela inflação por dez anos, reajuste nominal abaixo da inflação dos servidores até 2023 e reestruturação de carreiras do funcionalismo.
A proposta não pode nem deve ser interpretada de forma alguma como licença pra gastar. Só viria após a aprovação da reforma da Previdência e de mais medidas de ajuste fiscal — diz Fábio.

O que Bolsonaro e seu entorno querem é sim uma licença para gastar. O presidente acha, como todos os políticos populistas, que isso pavimentará a estrada que lhe dará mais um mandato. Se for esse o caminho, como ficará o plano de Paulo Guedes de ajuste fiscal? Se não for isso, Guedes terá que ter alguma resposta para evitar o cenário que Bolsonaro mais teme. O de ter que apagar as luzes de todos os quartéis. Como já está no nono mês do governo, o ministro da Economia tem que ir além de meros discursos para entreter plateias. Repetir os mesmos projetos e não dizer como vai colocá-los em prática já está ficando feio.

Blog da Míriam Leitão - Alvaro Gribel, São Paulo - O Globo

quarta-feira, 21 de agosto de 2019

O panorama visto do mercado - Míriam Leitão

Mercado está menos otimista com rumos da economia

A análise que os economistas de bancos fazem hoje é muito menos positiva do que faziam no início do ano. Antes, as perspectivas eram de retomada, de aprovação de reformas e de recuperação via ajuste fiscal. Um exemplo desse novo tom ocorreu na entrevista de ontem do departamento de pesquisa econômica do Itaú Unibanco. O economista-chefe, Mário Mesquita, não vê dados consistentes de recuperação a curto prazo, prevê a desaceleração da economia global, não tem no cenário a aprovação da reforma tributária e teme os reflexos da política ambiental do governo.

Pelas contas do banco, não haverá recessão técnica, porque o número do segundo trimestre será positivo em 0,5%. Recessão é quando há dois trimestres seguidos de queda. Houve queda no primeiro. Alguém pode considerar esse número de 0,5% até alto porque os dados setoriais foram todos negativos no trimestre. Eles explicam que a produção industrial foi puxada para baixo pela indústria extrativa mineral, como reflexo ainda da tragédia de Brumadinho. Mas a indústria de transformação e os serviços vão levar o número do trimestre a um dado positivo. Há outros bancos e consultorias com projeções mais baixas para o segundo trimestre. O índice do IBGE sai dia 29. De todo modo, no terceiro trimestre, há novo risco de um número negativo. Se isso acontecer, serão dois trimestres, não consecutivos, de encolhimento no ano.
— A economia brasileira continua girando na casa de 1% anualizado. Mesmo que suba 0,5% no segundo trimestre, virá logo em seguida um PIB fraco no terceiro trimestre. Há uma volatilidade grande da recuperação, ela não é firme. A queda do desemprego será lenta. Se no final de 2018, a PNAD marcava 12,3%, no final deste ano deve estar em 11,8%, e no ano que vem em 11,6% — diz Mário Mesquita, ex-diretor do Banco Central.

Se a reforma tributária for aprovada, não será ampla, acredita o economista. No máximo, um projeto tímido. Na verdade, neste momento há, segundo ele, “uma inflação de projetos”. O Congresso tem duas propostas e são apenas de fusão de impostos sobre consumo, com maior ou menor rapidez na transição. A proposta do governo não foi apresentada ainda e a convergência será difícil. O assunto normalmente mobiliza estados e municípios e haverá eleições no ano que vem. A “janela” para aprovação de uma reforma sobre esse tema vai até maio. Mesmo que fosse aprovada, não teria efeito no ano que vem. E só depois de feitas as contas é que se saberia se houve ou não aumento de carga tributária.

Em relação ao mundo, os bancos estão somando os vários sinais ruins vindos de países diferentes. Mário Mesquita acha que o mais provável é um cenário de desaceleração, mas pode haver uma “recessão comercial”. De fato, o encolhimento do comércio é o mais provável se continuarem os conflitos entre China e Estados Unidos:
China e Alemanha são duas economias muito interligadas pelo comércio. A desaceleração da China atinge a Alemanha e consequentemente o resto da Europa. Ainda há a ameaça de um Brexit forçado na Inglaterra. A sondagem da indústria na China está abaixo de 50 pontos, o que indica contração.

Países como o Brasil não vão poder contar com o mundo para sair da recessão ou acelerar o crescimento. A Argentina deve ter retração de 1,4% este ano e o maior impacto negativo será na cadeia automotiva brasileira. Mas o efeito maior sobre o Brasil seria de uma desaceleração da China. Aqui na região, o crescimento do México está caindo de 2% para 0,6%. Chile, Peru e Colômbia vão crescer, mas num ritmo menor.

A previsão do Itaú é de que este ano o Brasil cresce 0,8%. Essa é a mediana das projeções. No ano que vem a situação melhora, vai para 1,7%. O impacto positivo no PIB das medidas de liberação do FGTS pode ser anulado pela piora do quadro internacional e da Argentina, na visão de Mesquita.   Antes, a questão ambiental era avaliada no mercado financeiro apenas nos fundos dedicados. De forma lateral. Agora se ouve mais e mais uma análise que joga a questão no centro do dilema econômico brasileiro.
— As principais economias trabalham com gestão ambiental. E isso pode virar barreiras comerciais contra o Brasil, servir de pretexto, mesmo que se tenha acordo como o da União Europeia. O acordo precisará ser aprovado por 27 parlamentos. Não dá para o país se desviar das normais globais, ainda mais se o objetivo é se inserir mais nas cadeias globais — alerta Mário Mesquita.

Blog da Míriam Leitão - Com Alvaro Gribel de São Paulo - O Globo


quinta-feira, 30 de maio de 2019

Mais que privatizações em jogo no STF



Julgamento de liminares pode afetar uma fonte de recursos para reduzir o déficit fiscal 

Tem muita coisa em jogo no julgamento marcado para hoje  no Supremo de duas liminares concedidas contra privatizações. O desfecho pode definir o destino de um pilar do ajuste fiscal, a venda de estatais. E também impedir o ataque a um dos grandes problemas do Brasil, a baixa produtividade. Num país em que historicamente o Estado sempre teve uma participação grande na economia, a saída dele de qualquer segmento é sempre polêmica, pelos interesses de grupos que se formam em torno das estatais.

A oposição a privatizações é parte da democracia, e a Justiça, o único espaço para a mediação legal de conflitos. Num arcabouço jurídico tão emaranhado como o brasileiro, não é incomum magistrados dividirem-se diante da mesmo questão. Nem sempre a “letra da lei” tem leituras coincidentes entre juízes. Neste caso específico, cabe expor o contexto em que os ministros Ricardo Lewandowski e Edson Fachin emitiram liminares contra a venda de estatais. Está em questão o rito das operações, e não o mérito da redução da presença do Estado na economia e na sociedade, pois este é tema de discussões políticas e ideológicas. Que não podem ocorrer em tribunais.
Lewandowski acolheu de entidades sindicais — associações de pessoal da Caixa Econômica Federal e confederação dos trabalhadores do setor financeiro — um questionamento da Lei das Estatais, e estabeleceu que cada privatização necessita de uma autorização do Congresso. Já Edson Fachin suspendeu uma privatização específica, da Transportadora Associada de Gás (TAG), subsidiária da Petrobras.

A estatal é a primeira a ser prejudicada se o seu programa de venda de ativos vier a ser afetado pela necessidade de ouvir-se o Legislativo. Como empresa de capital misto, com ações em Bolsa em vários países, a Petrobras também precisa fazer o melhor para seus acionistas. No caso, reduzir a participação no refino, na distribuição e especificamente no gás, para investir no que é mais rentável: na exploração do pré-sal. Também é o melhor para o Brasil. Não há conflito entre os objetivos. Além de tudo, a empresa aprovou junto ao Tribunal de Contas da União seu programa de mudança de perfil. Não há voluntarismo por parte da empresa.

Não se trata de simples privatizações, mas de uma mudança estratégica destinada a enfim permitir que haja concorrência no refino e na distribuição, em defesa dos consumidores, como os caminhoneiros. No gás, a redução do tamanho da estatal tem a ver com um projeto crucial para, por meio da entrada de novas empresas no setor, reduzir o elevado preço do insumo, num choque benéfico para os consumidores industriais e individuais. O efeito multiplicador em toda a economia será enorme. E não faltará gás, devido ao crescimento da produção do pré-sal.

No plano macroeconômico, a venda de estatais permite ao Tesouro abater a elevada dívida pública e melhora a rentabilidade das empresas. Não deve ser esquecido que as contas públicas fecharão 2019 pelo sexto ano em déficit. É algo insustentável.


 

quinta-feira, 14 de março de 2019

Incertezas seguram a economia

Coluna publicada em O Globo - Economia 14 de março de 2019

A inflação acelerou mais do que se esperava em fevereiro, mas os culpados do mês foram rapidamente identificados. O feijão, por exemplo, com alta de mais de 50%, conforme a medida do IPCA, índice do IBGE. Mas não só. Alimentos em geral tiveram alta forte. Também a energia elétrica, mais matrículas e mensalidades escolares, neste caso eventos exclusivos de fevereiro.
E daí?

Daí que nada. Todos os demais itens mostram uma inflação mais do que comportada, rodando há vários meses abaixo da meta do Banco Central. Para este ano, a meta é de 4,25%. Em fevereiro, o IPCA acumulado em 12 meses bateu 3,89%, sendo um pouquinho menor (3,85%) a previsão do mercado para o ano todo.
Tudo muito bem, portanto?
Mais ou menos. O problema é que assim como a inflação, o Produto Interno Bruto (PIB) também está encolhendo. Cresceu apenas 1,1% no ano passado, e as previsões para 2019 vêm caindo há semanas, estando agora em 2,28% – muito baixo.
Acrescente-se ao cenário a taxa de desemprego (12%) e se verifica que a inflação baixinha em si, um dado positivoreflete também a fraqueza geral da economia. É por isso que muitos analistas acreditam que o Comitê de Política Monetária do BC, o Copom, deverá voltar a reduzir a taxa básica de juros, fixada em 6,5% desde março do ano passado. É um recorde de baixa e de baixa prolongada no regime de metas de inflação.

Faz sentido. Quanto menor a taxa de juros, maior o incentivo para que consumidores e investidores tomem empréstimos e gastem em alguma coisa. Mais PIB, portanto.  Ocorre que a economia brasileira tem muitos outros problemas que desestimulam e/ou adiam investimento e consumo com dinheiro emprestado. Em outras palavras, o pessoal não anda muito animado para tomar compromissos a longo prazo, sequer a médio.  Poderia dizer que a dúvida principal está na situação das contas públicas – ou seja, se haverá ou não a reforma da previdência, já que sem a contenção do déficit previdenciário o governo federal e os estaduais quebram em poucos meses.

É por aí, mas vai além. Há um mal-estar crescente em relação à capacidade das instituições (incluindo o governo executivo, Congresso e Judiciário) em arbitrar e desfazer os impasses que bloqueiam a atividade econômica.  Nem chega, ainda, a ser algo formulado. Mas uma sensação de que pode não dar certo. Fatos em si pequenos, incidentes que passariam despercebidos vão se acumulando e deixando uma má impressão.
O governo Bolsonaro, que assumiu sob expectativa de que faria deslanchar as reformas, a cada dia oferece uma confusão em torno de assuntos que nada têm a ver com as boas propostas (os pacotes Guedes e Moro, por exemplo). As demissões e contra-demissões no Ministério da Educação, por causa rixas entre facções, levantam a dúvida mais que razoável: é esse pessoal que vai reformar o ensino?

O Congresso parece passar o seguinte recado: pode-se votar a reforma da previdência, desde que se restabeleça algum “toma lá dá cá”.  O Supremo Tribunal Federal parece não perceber o tamanho da crise financeira do Estado. Há pouco, por exemplo, decidiu que o governo de Minas não precisa pagar o que deve ao governo federal, nem fazer um programa de ajuste fiscal. (A posição do ministro Paulo Guedes, correta, é condicionar a ajuda federal ao ajuste estadual).

Ok, trata-se de um caso aqui outro ali, mas a sucessão de pequenos incidentes vai criando um baita problema. Por outro lado, não desapareceram as esperanças de alguma boa reforma. Ontem, por exemplo, a Bolsa bateu recorde de alta. Ligou o modo “agora vai”, acreditando que o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, vai sustentar a tramitação da reforma da previdência. Mas outro dia mesmo, o pessoal estava apreensivo com as ressalvas do próprio Maia à capacidade de articulação do governo.  Nesse vai e vem, comprar ações, num dia bom, é fácil. Pode-se vender amanhã. Mas iniciar um novo negócio, comprar em várias prestações, é outra coisa.

Carlos Alberto Sardenberg, jornalista


segunda-feira, 25 de fevereiro de 2019

A reforma, os pobres e as corporações

Sem ajuste, teremos inflação, que é jogar o não ajuste sobre os mais pobres


Como tenho escrito neste espaço, o ajuste fiscal envolve dois tipos de gasto: itens associados ao contrato social da redemocratização —política de valorização do salário mínimo, ajustes no RGPS (Regime Geral de Previdência Social), no BPC (Benefício de Prestação Continuada) e no abono salarial, entre outros—; e itens associados aos grupos de pressão —ajustes nos RPPS (Regimes Próprios de Previdência Social) e subsídios em geral ao setor privado.  Evidentemente, quanto maiores forem os ajustes sobre as corporações e o setor privado, menores precisam ser os ajustes sobre os mais pobres.

Sem ajuste, teremos inflação, que é jogar o não ajuste sobre os mais pobres. Quem se lembra da hiperinflação da virada dos anos 1980 para os 1990 e de seus impactos sobre os mais pobres sabe do que estou falando.  Nossa experiência nas últimas décadas é que as corporações são mais fortes do que a população.
Vejamos como será no governo Bolsonaro.
No jornal Valor Econômico na terça-feira passada (19), o futuro líder da bancada ruralista, Alceu Moreira, do MDB do Rio Grande do Sul, argumentou ser necessário haver “proteção racional” aos mercados agropecuários, “diante dos gargalos em infraestrutura e do histórico de juros altos no país”.  Aplicando a mesma lógica, o setor deveria pagar impostos elevadíssimos para compensar a vantagem do sol e da água o ano todo e do bom relevo do Centro-Oeste.

O argumento do deputado está errado. As vantagens e as desvantagens que cada atividade tem no Brasil são compensadas pelo câmbio, que é flutuante. O cambio flutuante se ajusta à competitividade média das atividades do país. Os juros mais elevados, os custos tributários e trabalhistas maiores e os maiores custos de logísticas são compensados pelo câmbio.  Não faz sentido a agropecuária ter privilégios sobre a indústria e os serviços. Todos os setores precisam dar a sua contribuição para o ajuste fiscal.
Na semana passada, escrevi que o déficit do RGPS urbano foi de R$ 195 bilhões em 2018. Meu leitor atento Ricardo Knudsen notou que esse valor aplica-se ao RGPS todo.

Se retirarmos as contribuições e os gastos do RGPS rural, o déficit reduz-se para R$ 95 bilhões. Se consideramos a perda de receita pela desoneração da folha, do Simples nacional, da desoneração das entidades filantrópicas e do programa de microempreendedor individual, o déficit em 2018 foi de R$ 42 bilhões.  O RGPS rural apresentou em 2018 déficit de R$ 114 bilhões. Se descontarmos a renúncia fiscal da exportação de bens rurais, o déficit cai para R$ 107 bilhões.  Como escrevi há duas semanas, discutir déficit é ocioso. Dado que gastamos 14,5% do PIB (Produto Interno Bruto) com benefícios previdenciários e assistenciais para a terceira idade, incluindo pensão por morte, e nossa carga tributária é de 32% do PIB, é sempre possível estabelecer na forma de lei vinculações de receitas que superem o gasto previdenciário e tornam o sistema superavitário.

O tema é se faz sentido uma sociedade com as nossas características destinar 14,5% do PIB a esse tipo de gasto.  Exercício que fiz com meu colega Carlos Eduardo Gonçalves exposto no blog do Ibre (goo.gl/eQLJRC) indica que gastamos sete pontos percentuais do PIB a mais com previdência do que a norma internacional.
Adicionalmente, mostramos no mesmo exercício que esse excesso de gasto previdenciário reduz a poupança doméstica em cinco pontos percentuais do PIB. Não por coincidência os juros são elevados por aqui.
Samuel Pessôa é pesquisador do Instituto Brasileiro de Economia (FGV) e sócio da consultoria Reliance. É doutor em economia pela USP.


Folha de S. Paulo