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domingo, 22 de agosto de 2021

A ditadura do Supremo - VOZES

Flávio Quintela 

A prisão de Roberto Jefferson foi um dos acontecimentos marcantes na política brasileira dos últimos dias. Mais que isso, foi um novo patamar estabelecido pelo Supremo Tribunal Federal em sua missão de acabar com a liberdade de expressão dos brasileiros.

Ministro Alexandre de Moraes, autor do pedido de prisão do ex-deputado Roberto Jefferson.| Foto: Marcos Oliveira/Agência Senado

Eu não gosto de Roberto Jefferson. Acho-o um oportunista corrupto, que tenta surfar em toda e qualquer onda política que lhe pareça vantajosa. Além disso, as falas que o colocaram na mira de Alexandre de Moraes são, em sua grande maioria, de conteúdo imbecil e cheias de incitações e ataques difamatórios a outras pessoas. 
No entanto, tudo que Roberto Jefferson disse não passa de sua opinião declarada sobre determinados assuntos e, sendo assim, não há cabimento em prendê-lo por tal “crime”.

O Brasil, portanto, entrou para o grupo de países que prendem pessoas por crime de opinião, por falarem. No dia seguinte à prisão, fui tecer comentários em um grupo de WhatsApp onde se discute política brasileira. Ouvi, como contraponto à minha defesa de liberdade de expressão, que Charles Manson foi preso nos Estados Unidos – o país da Primeira Emenda – por incitar assassinatos, e que pela minha lógica um líder radical islâmico estaria exercendo sua liberdade de expressão ao conclamar uma jihad.

O Brasil entrou para o grupo de países que prendem pessoas por crime de opinião, por falarem

Será que é possível mesmo equiparar o discurso de Roberto Jefferson com aquilo que levou à condenação de Manson?                                      Ou, então, podemos colocar o político brasileiro no patamar de um aiatolá? Obviamente que não.
Charles Manson fundou um culto apocalíptico que ficou conhecido como Família Manson. Suas previsões incluíam uma guerra entre raças nos Estados Unidos, que terminaria com a morte de todos os brancos pelas mãos de uma insurreição negra. Ele e seus seguidores seriam poupados da morte porque os negros precisariam de um mestre branco, e esse mestre era obviamente Manson. Dentre os seguidores de Manson, quatro ficaram famosos por terem participado do assassinato de sete pessoas, incluindo o da atriz Sharon Tate: Charles Watson, Leslie Van Houten, Susan Atkins and Patricia Krenwinkel.

O julgamento desses crimes começou em 15 de julho de 1970. Durou nove meses e meio, gerou 209 volumes de transcrição, num total de 31.716 páginas. Foi o julgamento de assassinato mais longo da história americana. O júri ficou incríveis 225 dias em isolamento. Ao fim, depois de tudo isso, os 12 jurados condenaram os seguidores de Manson e o próprio.

Veja Também: Opinião da Gazeta: Supremo sem freios

Acho que dá para dizer, com bastante convicção, que Roberto Jefferson não conseguiu se igualar a Manson, e que o processo jurídico que o levou à prisão não tem a mínima possibilidade de comparação com o processo que levou Manson à cadeia e, posteriormente, à morte. Mais que isso, Manson foi condenado por um júri popular, enquanto Jefferson foi preso pela caneta de um ministro do STF. As incitações de Roberto Jefferson resultaram em nenhum crime cometido, e as calúnias por ele proferidas deveriam ter sido objeto de processo judicial específico, movido pelos caluniados.

Não, Roberto Jefferson não pode ser comparado a Charles Manson. Aliás, nenhum discurso, por mais odioso que seja, deve ser comparado ao caso de Manson. Mas seria ele, então, uma espécie de aiatolá que comanda um grupo de jihadistas radicais?  
Há equivalência entre a frase “concentrar as pressões populares contra o Senado e, se preciso, invadir o Senado e colocar para fora da CPI a pescoção” e a declaração de Ali Khamenei sobre financiar e apoiar os grupos jihadistas em ataques a Israel e aos Estados Unidos
Seria o pescoção a versão jeffersoniana de um homem-bomba?

Se deixarmos que o Estado seja tutor do que podemos ou não falar, necessariamente deixaremos que o Estado estabeleça os limites do que é aceitável e o que não é

Obviamente que não. Roberto Jefferson não lidera uma religião belicosa com financiamento milionário, armamento pesado e táticas avançadas de terrorismo. Não fazem nenhum sentido, portanto, os contrapontos que li no grupo de WhatsApp. Por conseguinte, não fazem nenhum sentido os argumentos que a imprensa brasileira tem apresentado para justificar essa prisão absurda, pois são nada além de variações desses argumentos que mencionei.

Enquanto não há crime, não pode haver julgamento; enquanto não há julgamento, não pode haver prisão. Assim como a arma não atira sozinha, o discurso não fere nem mata. Se deixarmos que o Estado seja tutor do que podemos ou não falar, necessariamente deixaremos que o Estado estabeleça os limites do que é aceitável e o que não é. E esse limite poderá ser mudado todas as vezes em que o Estado se sentir ameaçado. É assim que se faz nas ditaduras.
 

Veja Também: Debaixo de sete chaves
  
Obviamente, existem alguns limites aceitáveis à liberdade de expressão, mas são limites construídos por um consenso de longa data, como o famoso “não pode gritar fogo no meio de uma multidão confinada se não houver fogo”.

Por fim, fala-se tanto de golpe militar na imprensa, mas não se escreve uma palavra sequer sobre a ditadura do Judiciário que vem se impondo há tempos sobre os brasileiros. 
O STF age fora de sua jurisdição e responsabilidade quase todo o tempo. Quando não o faz, é porque está ocupado soltando criminosos. Bolsonaro teve duas chances de mudar um pouco o perfil desse tribunal. Desperdiçou-as com Kassio Nunes e André Mendonça. 
Para mim, quem coloca esses sujeitos no tribunal mais alto do país não tem direito de reclamar desse mesmo tribunal. 
Mas nós temos todo o direito de querer o fim do ativismo e do poder ilimitado dos togados de Brasília. 
E essa pauta deveria ser mais explorada que as besteiras ditas diariamente por Bolsonaro. Se o STF vencer essa briga, não é só Bolsonaro quem perde, mas todos os presidentes que forem empossados daqui para a frente.
 
Flavio Quintela,  colunista - Gazeta do Povo - VOZES

terça-feira, 19 de janeiro de 2021

Os novos senhores do mundo - Revista OESTE

Os gigantes da tecnologia censuram Trump, fazem o que bem entendem e exercem um poder global desmedido. Isso é justo?

Na edição de 26 de junho de 2020 da Revista Oeste, iniciei meu artigo daquela semana falando sobre o famoso romance distópico de George Orwell, 1984. Ainda estávamos no meio da pandemia, num momento em que não tínhamos certeza de seu caminho e de sua letalidade. Comentei em meu texto que os tempos eram estranhos e o mundo atravessava dias bizarros que poderiam facilmente ter saído das páginas do livro publicado em 1949. Argumentei que as sociedades modernas estão se tornando cada vez mais parecidas com o que foi descrito na obra de Orwell: na vigilância em massa, no uso incessante de propaganda, na guerra cultural perpétua e no culto à personalidade que cerca líderes políticos e ativistas. Finalizei o primeiro parágrafo dizendo que o romance de Orwell é presciente de várias maneiras. Mas eu mal sabia que 2021 seria, na verdade, mais próximo ainda de 1984.

Naquele artigo, mencionei a quebradeira protagonizada por vândalos e terroristas domésticos do Black Lives Matter e do Antifa, as turbas violentas que derrubaram estátuas, demonizaram forças policiais e sequestraram pautas pertinentes para projetos de poder político — sintomas que já demonstravam um tipo de totalitarismo que George Orwell satirizou. Jamais poderíamos imaginar que o que vivemos em 2020 seguiria com força avassaladora agora em 2021.

Nesta semana, logo após o banimento do presidente norte-americano Donald Trump do Twitter, muitas plataformas digitais seguiram a rede social de Jack Dorsey e entraram em transe virtual, degolando virtualmente o homem malcriado e sem papas na língua, o maior vilão depois de Hitler, de acordo com todos eles. Donald Trump tem sido uma figura controversa em seus quatro anos de administração, com um discurso inflamado e muitas vezes desafiador, mas é justo ou correto banir alguém do debate público por não concordar com suas ideias ou sua retórica?

Em seu discurso no dia 6 de janeiro em Washington, Trump teria incitado a multidão a agir com violência e invadir o Capitólio. Mas basta uma rápida lida na transcrição do que foi dito pelo presidente para percebermos que a narrativamais uma vez é exagerada e não condiz com o que foi, de fato, dito. “Viemos exigir que o Congresso faça a coisa certa e conte apenas os eleitores que foram legalmente indicados. Sei que todos aqui logo estarão marchando para o prédio do Capitólio para fazer ouvir sua voz de forma pacífica e patriótica. Hoje veremos se os republicanos são fortes pela integridade de nossas eleições, se eles são fortes ou não por nosso país.”

Mas não foram apenas as plataformas que usaram o evento para cancelar Trump do mundo virtual. Os democratas, que há quatro anos empurram várias tentativas de impeachment contra o presidente, também usaram o discurso para fazer passar mais um impeachment na Câmara que não chegará ao Senado antes da posse de Joe Biden. Os artigos do novo impeachment acusam Trump de, entre outras coisas, “incitação à insurreição”. Se Trump é culpado de “incitamento”, então metade dos democratas no Congresso também o é. Nancy Pelosi e outros democratas estão, convenientemente, concentrando-se na retórica sempre inflamada de Trump aos que o ouviam quando ele disse que deviam “lutar como o inferno por seu país” (fight like hell for your country). Logo depois, ele convidou os apoiadores a “descer a Avenida Pensilvânia” e “dar [aos republicanos] o tipo de orgulho e ousadia de que precisam para retomar nosso país”. A palavra “pacificamente” foi excluída de qualquer conversa, debate e até mesmo do processo. Oh, details.

É preciso praticar todos os tipos de ginástica mental para fingir que “lutar como o inferno” é tudo menos uma figura de linguagem muito comum. O senador democrata Richard Blumenthal disse que “lutaria como o inferno” contra o então nomeado de Trump para a Suprema Corte, Brett Kavanaugh. Alguém imaginou que ele pretendia se envolver literalmente em brigas de socos no plenário do Senado? Democratas disseram palavras bastante inflamadas ao longo do ano de 2020 em relação aos protestos do BLM e do Antifa, e nada, absolutamente nada, foi condenado por nenhum de seus pares — tampouco esses personagens do cenário público foram banidos de toda a existência virtual.

Dois dias após a eleição de 2020, a comediante Kathy Griffin retuitou a famosa foto dela segurando um objeto que parecia a cabeça ensanguentada de um Donald Trump decapitado. No início do ano passado, o líder supremo do Irã, aiatolá Ali Khamenei, tuitou um apelo a seus seguidores para destruir Israel. Ambos os tuítes foram aprovados pelo Twitter, mas o bufão laranja não escapou das garras da censura dos juízes de 20 e poucos anos da plataforma em São Francisco. Eles, em um comunicado oficial, declararam que, “devido ao risco de mais incitação à violência”, Donald J. Trump, com 85 milhões de seguidores, estava deletado do mundo virtual indefinidamente.

Wall Street, Hollywood e a mídia estão do lado dos cartéis bilionários da tecnologia

Quais são os novos padrões que agora fazem com que uma conta de mídia social seja cancelada? 
A cantora Madonna foi banida das redes sociais depois da posse de Trump, em 2017, ao expressar o desejo de explodir a Casa Branca com a família Trump nela? 
É verdade, Trump deu uma oportunidade a seus chacais quando alguns apoiadores vandalizaram o Capitólio. Mas a verdadeira razão é que a esquerda há muito tempo está faminta de restringir o discurso daqueles que se opõem a suas pautas de gênero e engenharia social. E a semana passada ofereceu ao “clube da ética”, expressão usada por nosso magistral colunista Guilherme Fiuza, o tipo de crise perfeita que seus integrantes entenderam que nunca deveria ser desperdiçado.

O mercado e a população reagiram diante de bizarro autoritarismo. Conservadores e liberais tentaram migrar para a rede Parler, mas o aplicativo para smartphones já havia sido excluído das lojas digitais da Apple e do Google e o contrato de hospedagem de dados na nuvem foi cancelado pela Amazon. Puf. Em menos de 30 horas, 13 milhões de usuários viraram pó.

A estratégia, hoje encampada abertamente pelas Big Techs, não é apenas ver um Trump derrotado, em fuga e sem controle do governo. Os gigantes da tecnologia não pretendem somente humilhar alguém que bateu de frente com o deep state e expôs o conluio de políticos com o capital privado de democratas e republicanos. Eles querem também restringir a capacidade de organização de seus oponentes. Calar Donald Trump não é suficiente. 
É preciso calar todo o movimento conservador e liberal por ele capitaneado, e exterminar a nova cara que ele deu ao Partido Republicano, com clara e direta conexão com a classe trabalhadora por meio de políticas públicas eficientes.

E aqueles que defendem a ideia de que essas plataformas são empresas privadas e “podem fazer o que bem entenderem”? Nós, brasileiros, pudemos testemunhar em nossa história recente o capital privado em conluio com o Estado de maneira nada republicana. Assistimos aos “campeões nacionais” aproveitando-se do suado dinheiro do contribuinte em operações casadas — e corruptas — com o poder estatal para o enriquecimento e o fortalecimento de monopólios.

Nos EUA, há mais de um século, ferrovias, telégrafos e a indústria de petróleo e energia criaram enormes monopólios. Junto com esse movimento, também produziram cartéis integrados. Então, usaram seus enormes lucros para dar presentes a políticos, controlar informações e destruir a competição. Muitos historiadores e economistas liberais norte-americanos comparam essas operações a polvos, cujos tentáculos estrangulam a liberdade e a honesta competição do livre mercado. Em reação, leis antitruste foram aprovadas e monopólios foram quebrados depois do Sherman Antitrust Act, de 1890.

Para os libertários mais inflamados, completamente avessos a quebras de monopólio com as leis antitruste, mesmo quando atropeladas por cartéis (e, aqui, as plataformas infringem diariamente a Seção 230 da Lei de Comunicações dos EUA — CDA), o próprio Murray Rothbard, economista da escola austríaca, afirma em seu livro Esquerda e Direita que o Estado interventor norte-americano não teria nascido com o New Deal, mas bem antes, na Era Progressista. Surpreendentemente, essa intervenção não teve origem por imposição de socialistas e comunistas, mas pelo interesse de grandes empresários na proteção estatal contra o laissez-faire. Teriam sido eles, e não os militantes socialistas, os grandes responsáveis pelo recuo do livre mercado nos Estados Unidos.

Há uma discussão pertinente em torno do assunto “leis antitruste”. E aqui, na Revista Oeste, jamais defenderemos mais intervenção do Estado e mais regulações. Jamais. No entanto, não pisamos atualmente em solo fértil, pronto para receber sangue e suor daqueles que ainda acreditam no American Dream. O que está diante de nossos olhos é um cenário em que políticos progressistas, Wall Street, Hollywood e a própria mídia estão todos do lado dos cartéis bilionários da tecnologia. A parceria com as Big Techs é politicamente útil e financeiramente lucrativa. Empresas que financiam campanhas políticas por todo o país para que legisladores eleitos com dinheiro delas aprovem leis que as favoreçam sempre.

Uma rápida olhada nos dados de financiamento de campanhas mostra que as contribuições de donos e funcionários das empresas de tecnologia foram em grande parte para Joe Biden. Funcionários da Alphabet, Amazon, Apple, Facebook, Microsoft e Oracle contribuíram com quase 20 vezes mais dinheiro para Biden do que para Trump desde o início de 2019. 
Oito pessoas do novo Comitê de Transição de Joe Biden estavam até pouco tempo atrás trabalhando para a cúpula de Mark Zuckerberg, dono do Facebook. De acordo com a Open Secrets, Alphabet, Microsoft, Amazon, Facebook e Apple respondem por cinco dos sete maiores doadores da campanha de Biden em 2019 e 2020.

Esse é o verdadeiro cenário de um oligopólio criado com o uso do Estado como agente de informação. É o retrato da América de hoje, onde uma pergunta é insistente — e proibida de ser feita: “Isso é livre mercado?”. A sensação é que os valores dos monopólios ferroviários e de petróleo do século 19 estão de volta, casados com o totalitarismo esquerdista do século 20 de George Orwell que lemos em 1984, e agora muito bem estruturados e alimentados pelo alcance instantâneo da internet do século 21.

Tudo é muito assustador, principalmente para uma nação que tem como um de seus pilares a liberdade de expressão aliada ao respeito às leis. No livro The Fourth Turning, de William Strauss e Neil Howe, somos instigados a analisar como a história mostra que sociedades ao longo de décadas com frequência trazem características muito parecidas, e como eventos distintos em épocas diferentes trazem ciclos similares. Depois de vermos os novos revolucionários jacobinos tentando amordaçar quem ousasse questionar os caminhos que o vírus chinês impôs, não me espantaria que os Robespierres que comandam a “nova revolução” e o que pode ser falado, ouvido e propagado acabem guilhotinados por seus pares.

Leia também a matéria “14 questões sobre o poder das Big Techs”

Ana Paula Henkel, comentarista política - Revista Oeste


terça-feira, 20 de janeiro de 2015

Cristina Kirchner = Um tiro no governo. Lembrem-se: nada mudou, Argentina hoje = Brasil amanhã

A morte do procurador que a denunciou fomenta dúvidas sobre a capacidade de Cristina Kirchner se manter em frágil equilíbrio de poder até o fim do mandato

Oficialmente, faltam 45 semanas para Cristina Kirchner entregar a Presidência da Argentina a um sucessor eleito. Mas ontem, no Palácio do Planalto, no Itamaraty e na Embaixada dos Estados Unidos, em Brasília, floresciam dúvidas sobre sua capacidade de sustentação em frágil equilíbrio de poder até o fim do mandato. A bala que matou o procurador Alberto Nisman, no domingo, deixou Cristina na escuridão política, em um país sob progressiva corrosão institucional e econômica. 

Nisman morreu aos 51 anos, horas antes de audiência no Congresso onde apresentaria evidências que, supostamente, justificaram a denúncia judicial contra a presidente e o chanceler Héctor Timerman. Acusou-os de realizar uma “diplomacia paralela", que possibilitou ao governo levar adiante “um plano criminoso, por ordens expressas da Sra. Presidente". 

O objetivo governamental, ele escreveu na denúncia com mais de 200 páginas, era obter compensações econômicas de Teerã em troca da “impunidade e encobrimento dos fugitivos iranianos" indiciados pelo atentado contra a Associação Mutual Israelita da Argentina (Amia). Entre eles, destacam-se o aiatolá Ali Rafsanjani, atual presidente da Assembleia de Teólogos, órgão responsável pela escolha do líder supremo iraniano, e alguns de seus auxiliares (Mohsen Rezai, ex-comandante da Guarda Revolucionária; Ali Akbar Velayati, ex-chanceler; Ahmad Vahidi, ex-chefe da tropa de elite; Ali Falhijan, ex-ministro de Segurança.)

Foi o maior ataque terrorista realizado na América do Sul: na manhã de segunda-feira 18 de julho de 1994 uma carga de explosivos demoliu a sede da entidade judaica e prédios vizinhos, no Centro de Buenos Aires, deixando 85 mortos e mais de três centenas de feridos. Vinte e oito meses antes, uma ofensiva contra a Embaixada de Israel deixara 29 vítimas. 

Passaram-se duas décadas e os atentados continuam impunes. Consequência da perversa combinação de leniência institucional com a obstinada relutância de governos da América do Sul — a começar pelo Brasil — em admitir qualquer possibilidade de conexão regional com o terrorismo em escala global, apesar das ocorrências desde os Jogos Olímpicos de Munique, em 1972, em Buenos Aires, nos anos 90, em Nova York, em 2001, e em Paris duas semanas atrás. 

A impunidade na Argentina remete ao vácuo no Brasil. Desde os anos 90, Brasília se mantém indecisa sobre a harmonia da legislação nacional com os códigos antiterrorismo.
Nisman trabalhou em cooperação com os serviços secretos dos Estados Unidos e de Israel, e em parceria com Antonio Horacio Stiuso, o influente “Jaime”, recém-aposentado no comando da espionagem argentina. Se estava lúcido ou desesperado em uma investigação, marcada pela negligência e hostilidade interna, é questão que tende à poeira da História — provavelmente sem resposta. 

É certo, porém, que a confusão política argentina ganhou outra dimensão, com um aditivo: a volatilidade anímica de Cristina, em luto desde a morte em 2010 do caudilho Néstor, com quem esteve casada por mais da metade da vida. Ela oscila entre a euforia e a melancolia, evocando-o em solenidades diárias — quase tanto quanto reverencia Deus, como é hábito entre antigas alunas da congregação Filhas de Nossa Senhora da Misericórdia, de La Plata. Seu governo está à deriva.

Por: José Casado