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quinta-feira, 9 de fevereiro de 2017

Lula e os beijos vermelhos de Tássia

A cabecinha que mistura Moro, Aécio, Globo e VEJA na arquitetura dos comentários torpes sobre a morte de Marisa Letícia

Sempre imaginei que Regina Duarte decorasse as falas das personagens que viveu na TV. Mas agora, depois de Tássia Camargo dizer que Regina usava ponto, tenho certeza. De todo modo, o ponto socorre o artista no esquecimento do texto, não na falta de talento. O que eternizou Regina Duarte não foi decorar textos, e sim o talento para dar vida a heroínas inesquecíveis, seja porque fizeram história como a socióloga divorciada Maria Lúcia Fonseca, da pioneira “Malu Mulher”, seja porque a carreira da brilhante aquariana, que continua bela aos 70 anos de idade completados no dia 5 deste mês, se funde à própria história da TV e da teledramaturgia brasileiras. A de Tássia também: estão vendo aquele revoltado asterisco anêmico amargurado no rodapé da história em que Regina reina? Ali, mais para baixo, mais para trás, mais; isso.

Não sou porta-voz de Regina Duarte nem ela precisa que eu a defenda de coisa nenhuma, o que ela pode fazer muito melhor do que eu se quiser ou achar necessário. Faço este registro para apontar, no mosaico bisonho de Tássia, três vítimas preferenciais da súcia petista: a verdade, o mérito e a graça da vida.  Regina é uma mulher valente, de excelente formação também moral. Numa entrevista ao jornalista Roberto D’Ávila, contou que nunca pretendera ser famosa, mas que desde o dia em que, mocinha, viu o pai, militar aposentado, ser humilhado em determinado acontecimento numa fila para receber a aposentadoria, decidiu que teria uma profissão que a fizesse poderosa o suficiente para proteger os pais. Honrar nossa ancestralidade e sermos gratos a ela atestam a qualidade do nosso caráter e a sanidade dos nossos afetos. Lulinha e Luleco, por exemplo, agiram assim, só que, com uma ancestralidade ré em três inquéritos, era melhor ter feito dos pais só uma fotografia que nos machuca de dentro de um porta-retrato na sala de jantar.

Grandes estrelas da Globo como Glória Pires, Tony Ramos ou Regina Duarte têm contrato permanente com a emissora e continuam remuneradas mesmo entre um trabalho e outro: mérito, atributo imperdoável no perturbado mundo petista. Tássia sabe que na Globo é assim, porém, acusando Luana Piovani de querer aparecer – acusação pertinente, mas e daí? –, aparece num vídeo bisonho para fazer o que denuncia como prática da antiga empregadora: o asterisco-e-atriz “coloca cocozinho na sua cabecinha, pra você ficar mais burrinho ainda”. Preste atenção: “mais ainda”.

Marilena Chauí deve ter feito o mesmo na cabecinha de Tássia que mistura Moro, Aécio, Globo e VEJA na arquitetura dos comentários torpes sobre a morte de Marisa Letícia. Isso não é maluquice, pois essa gente não rasga dinheiro (a não ser o da Rouanet, ou seja, o nosso), é apenas mentira e tremendamente injusto porque exclui o ninho mais escabroso de todas as indignidades sobre essa morte: a alma do viúvo. Mas Tássia está confusa, afinal não se sai incólume do vilipêndio político-eleitoreiro de um cadáver efetivado pelo próprio viúvo que ainda teve o discurso do bispo de passeata, D. Angélico Bernardino, contra a reforma da previdência, transformando o caixão num palanque profano.  

Atacar o governo de Michel Temer e as reformas dramaticamente necessárias é o roteiro obrigatório dessa gente, mas num velório? Marisa Letícia morreu triste? Ruth Cardoso também por causa do dossiê vigarista produzido na Casa Civil de Dilma Rousseff, Fernando Henrique revelou isso não no velório, mas tempos depois e em conversa privada com Ignácio Loyola Brandão que escrevia uma biografia de d. Ruth. Já no comício em que Marisa Letícia foi velada, só não se criticou a indicação de Alexandre de Moraes para o STF porque ela ainda não estava definida. Criticariam porque ela é boa e o bem, na opinião dos petistas, não deve ficar impune.

A tolice de que o presidente quer um “guarda-costas” no Supremo é só mesmo uma tolice, pois Temer não pode ser processado, enquanto for presidentecargo que lhe garante a prerrogativa de foro –, por eventuais crimes cometidos antes do mandato e, depois de cumprido este, Temer não terá mais a prerrogativa de foro, restando, portanto, fora da proteção do tal guarda-costas. Numa situação, ela é desnecessário; na outra, inútil. O fato é que para petistas, extremistas de esquerdas e assemelhados como a direita chulé, qualquer indicação que Temer fizesse teria o defeito de ter sido feita por ele.

No vídeo tosco, Tássia não se dirige à veterana Regina, prefere simular certa parceria com a colega de trabalho mais jovem – como se Luana fosse alguma tonta – e dar conselhos que não querem aconselhar coisa nenhuma. Tássia está pouco ligando para Luana e pretendeu mesmo atacar aquela a quem não se dirige porque, entre os papéis de Regina em 50 anos de carreira, o que o asterisco-e-atriz menos suporta é o de cidadã livre e valente que, quando praticamente toda a classe artística brasileira se homogeneizava na sabujice, teve a coragem de dizer que tinha medo da canalha pavorosa chefiada por um viúvo que trocaria o lamento dolorido pelo discurso mentiroso.

Não é inveja do brilho de Regina ou da vitalidade de Luana, Tássia inveja a si própria, pois está vivendo os 57 anos dela e tem “experiência de um relacionamento muito longo”, por isso sabe “o que ele está passando”. Sim, o casamento de Lula e Marisa Letícia durou mais de 40 anos, quanto anos mais o jeca precisaria ter vivido com ela para aprender a respeitá-la na morte? Mais 40, 30, 10, 5, 3?

Lamentei, claro, a morte de Marisa Letícia, o mal de ninguém me faz bem, que ela vivesse e se acertasse com a justiça. Lamentável também foi contemplar Lula, um homem tão bajulado e, no entanto, na solidão dos que não têm amigos, só cúmplices, comparsas e devotos. Tivesse ele alguém que o quisesse bem dessa benquerença que nos dá um toque sobre nossos erros, esse alguém interromperia aquela ignomínia sombria e levaria o amigo viúvo ao silêncio decoroso que o momento exige. Mas Lula tem Tássia Camargo e os beijos vermelhos dela, armados e apontados contra a graça da vida.

Fonte: Coluna do Augusto Nunes - Valentina de Botas

 

sábado, 24 de setembro de 2016

Segredos de Justiça

Com julgamento do STF, filho ganha direito a ter dois pais. Na TV, minissérie explora dilemas de uma juíza de família 

A vida é justa para quem? Num país que hoje discute nas redes sociais o conceito de Justiça, muitas vezes num tom intolerante e sectário, aplaudindo prisão para todos os corruptos ou a condenando como linchamento, é reconfortante sair da esfera da grande política e entrar no escurinho do lar. Em nome de nós mesmos, é saudável penetrar nos mistérios do amor e da concepção e perceber que o direito à identidade plena é nosso primeiro direito político.

Num Brasil em que, a cada ano, nascem 700 mil crianças de “pai desconhecido”, ou seja, filhos de pais que não quiseram ou não puderam reconhecê-los como filhos, devemos saudar a decisão do Supremo Tribunal Federal. Por 8 votos a 2, os juízes do STF aprovaram o direito à dupla paternidade socioafetiva e biológica – e o registro dos nomes de ambos os pais na identidade. Isso significa que, mesmo com um pai de criação ou adoção, um filho passa a ter direito de exigir pensão e direitos de quem o concebeu.

É um avanço. E um alerta aos homens que pensam que engravidar é responsabilidade só das mulheres. “Amor não se impõe, mas cuidado, sim”, afirmou em seu voto a presidente do STF, Cármen Lúcia. “Fez o filho, tem a obrigação. Pode ter sido criado por outra pessoa. Comprovou geneticamente, tem a obrigação, ponto”, resumiu Dias Toffoli.

Legislar sobre a famílianão só sobre pais e filhos é uma tarefa espinhosa que exige humanidade, humildade e compaixão raras. Sobretudo a capacidade de ouvir e se colocar na posição do outro. Que o diga a juíza Andréa Pachá, mãe de dois jovens de 19 e 21 anos, com mais de 20 mil audiências de separação no currículo. “Eu sou uma observadora do fim do amor”, diz Andréa. Mas não só do fim. Andréa testemunhou e legislou sobre recomeços, arrependimentos, perdões, vinganças, submissões, sempre evitando um julgamento moral. Com frequência enxugou ela mesma umas lágrimas após a audiência que envolvia crianças.

Andréa estudou dramaturgia e escreveu livros como A vida não é justa, com histórias romanceadas de casos ocorridos em sua sala de audiência. Histórias emocionantes, que inspiraram a minissérie de TV Segredos de Justiça, com estreia prevista no Fantástico dia 9 de outubro e a atriz Gloria Pires no papel da juíza. Impossível não refletir sobre o que é justo, quando todas as versões são postas à mesa, com uma verdade que dói ou uma cegueira que se constrói. Impossível não ter dúvidas.

Um dos casos do livro de Andréa e da minissérie se chama “Mais valem dois pais na mão”. Conta a disputa entre o pai de criação, Emerson, que registrou o menino Juninho como seu, e o pai biológico, Túlio, que reapareceu para brigar pelo filho seis anos depois. A juíza decide manter a paternidade do pai de criação. Nem era preciso um exame de DNA. O menino Juninho e Túlio eram “branquinhos e loiros, com uma covinha na bochecha direita”. Emerson era “um pai negão”. O que era correto fazer?

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“Pedi que Juninho entrasse na sala. Correndo, rindo muito, passou ao largo do lugar onde sentava Túlio e, de braços abertos, mergulhou no colo de Emerson, acariciando seu rosto. O contraste entre as cores das peles e a intensidade do afeto era o quadro eloquente de que o preconceito é uma invenção despropositada e decadente que não deveria encontrar eco na humanidade. Juninho, aos 6 anos, já era um indivíduo. Sabia seu nome. Reconhecia seu lugar. Tinha referência da figura paterna e identificava Emerson como seu pai. O convívio com o pai biológico viria naturalmente, com as portas abertas para mais esse vínculo afetivo. A vida é muito maior e muito mais imprevisível do que a burocracia que cabe numa certidão. É, no fim, uma equação simples. Quanto mais afeto, maior a possibilidade de justiça.”

A minissérie reflete o ambiente real que Andréa viveu numa Vara de Família. Não tem peruca branca, nem martelo, nem toga. Tem livros reais, desarrumados nas estantes, um monitor queimado em cima do armário. Sempre a impressionou a facilidade com que, diante de um juiz de família – talvez mais que diante de um terapeuta –, as pessoas se desnudam. “Como a maioria das histórias não tem final feliz, é como se as pessoas se vissem autorizadas a sofrer diante do desamparo do fim do amor. Todo mundo acha que juiz sabe tudo, resolve tudo e faz justiça sempre. Nada mais distante da experiência de um juiz de família.”

Ninguém tem direito à alegria o tempo todo, nesse contexto atual de busca desenfreada pelo desejo e pela felicidade obrigatória em que vivemos. Os costumes familiares e amorosos mudaram, muitos se aperfeiçoaram, mas a essência do ser humano é a mesma. Os conflitos se repetem sempre e a dor é diferente em cada história. A vida às vezes é justa, às vezes não.

 Fonte: Ruth de Aqui - Época