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sábado, 28 de janeiro de 2023

O que é um terrorista? - Flávio Gordon

Revista Oeste

O interesse da esquerda não é saber isso. É prender e neutralizar adversários políticos. E aí o nome das coisas vira um mero detalhe 

A relativização da palavra terrorismo diante dos acontecimentos em Brasília, no dia 8 de janeiro | Foto: Shutterstock

A  relativização da palavra terrorismo diante dos acontecimentos em Brasília, no dia 8 de janeiro | Foto: Shutterstock  

“O uso da mídia como arma tem um efeito paralelo ao de uma batalha. Mediante o uso dessas imagens, fomos capazes de controlar à distância o moral do inimigo” — declarou, em julho de 2000, Nabil Qaouk, então comandante do Hezbollah. Explicando como o grupo terrorista xiita — que fazia desabar frequentes tempestades de mísseis sobre Israel — lograra dominar as técnicas de filmagem e distribuição de propaganda para a imprensa ocidental, o xeique muçulmano afirmou que a campanha de desmoralização de Israel aos olhos do mundo fora decisiva para a retirada das forças israelenses do sul do Líbano.

O que o xeique não disse, todavia, é que sua propaganda só frutificou porque o solo era especialmente fértil: a predominância da ideologia “anticolonialista” nas redações e nos estúdios, que conduz o noticiário e o colunismo de opinião a relativizarem (e, por vezes, deliberadamente ocultarem) o terrorismo islâmico. Com efeito, desde aproximadamente meados dos anos 1960, a visão hegemônica nas faculdades de jornalismo ao redor do mundo consiste numa versão adaptada do marxismo, que dividiu as nações do mundo em “exploradoras” e “exploradas”. Nesse contexto, multidões de repórteres-ativistas passaram a se ver como porta-vozes dos explorados, a favor dos quais era permitido mentir, ocultar e manipular a informação. Sua função já não era a de reportar, mas a de integrar a máquina de propaganda “anticolonialista” (contra Israel, contra o Ocidente, contra o capitalismo etc.).

É por essas e outras que Michael S. Malone, consagrado jornalista norte-americano, com passagens por ABC News, New York Times, The Wall Street Journal, Forbes e Los Angeles Times, confessou, em artigo de 2008, a sua vergonha em se assumir jornalista nos dias de hoje. Sua desilusão com a profissão que herdou dos avós começou justamente quando, num quarto de hotel, acompanhava a cobertura sobre a Guerra do Líbano, no ano de 2006. No relato de Malone:

“O hotel em que eu estava, em Windhoek, na Namíbia, só sintonizava a CNN, uma emissora que eu já aprendera a abordar com ceticismo. Mas ali se tratava da CNN internacional, o que era pior. Estava ali sentado, primeiro de queixo caído, e logo em seguida gritando para a televisão, enquanto um correspondente após o outro reportavam a carnificina dos ataques israelenses em Beirute, sem praticamente nenhuma notícia complementar da chuva de mísseis lançados pelo Hezbollah sobre o norte de Israel. A reportagem era tão completa e vergonhosamente tendenciosa que permaneci horas assistindo, imaginando que, em algum momento, eventualmente a CNN fosse contar toda a história… Mas não o fez”.

A manipulação midiática detectada por Malone revela algo perturbador: muitos dos responsáveis por decidir o que iremos ler ou ver no noticiário não concebem seu trabalho como informativo, mas como essencialmente político
Nesse contexto, a cobertura torna-se uma arma a serviço da causa que defendem. 
Assim é que, na mentalidade de muitos jornalistas e intelectuais de esquerda, atos efetivos de terrorismo (bombas, tiros, explosões, facadas etc.), desde que praticados por algum representante da categoria dos “explorados”, são justificáveis diante do fato primeiro e pecado original da exploração. Por vezes, o termo “terrorismo” chega a desaparecer do noticiário, quando se trata de cobrir a violência praticada por “explorados” contra “exploradores”.

A relativização do terrorismo atingiu o paroxismo justo num de seus momentos mais espetaculosos, quando dos atentados de 11 de setembro. Comentando sobre o chocante evento, o ultrarradical Noam Chomsky, intelectual público dos mais influentes no mundo, qualificou os EUA de “Estado terrorista”. Resumidamente, a sua tese era a seguinte: os ataques terroristas haviam sido uma resposta dos povos oprimidos do Terceiro Mundo ao imperialismo norte-americano. Antes que vítima, a América era, portanto, a verdadeira responsável pelos atentados.

De acordo com a Lei Antiterrorismo sancionada por Dilma Rousseff, não faz parte dos tipos penais o cometimento de crimes por razões políticas. Na época, essa ressalva na lei foi concebida a fim de proteger grupos radicais alinhados ao petismo para que pudessem continuar cometendo impunemente suas ações de violência política

A macabra racionalização chomskyana não era uma posição excêntrica no seio da intelligentsia esquerdista mundial. De acordo com ela, os terroristas da Al-Qaeda foram irremediavelmente atraídos para o campo magnético das Torres Gêmeas, não tendo alternativa que não a de se explodirem contra milhares de inocentes. Bin Laden e seus pupilos haviam manifesto um instinto de liberdade que, sob condições de opressão, tende a se mostrar exasperado e eventualmente homicida. Quanto ao país agredido, sendo inexorável e aprioristicamente culpado no tribunal da história, o que lhe restava era assimilar o golpe com humildade e resignação, extraindo-lhe motivo para uma autocrítica. 

Como notou à época o analista Frédéric Encel, a lógica chomskyana funcionava “como se os trabalhadores no World Trade Center e os passageiros dos aviões sequestrados encarnassem o mal da América, tendo de expiar a culpa pelo culto do rei dólar, o destino dos apaches, o McDonald’s”.

Embora soe odiosa quando dita sem rodeios, a mensagem era clara: os EUA haviam pedido por aquilo. Poucos, obviamente, ousaram expressar a coisa nesses termos. 
Mas, incrivelmente, houve quem tenha perdido até mesmo esse mínimo de pudor. Destaca-se aí o filósofo francês Jean Baudrillard, que escreveu: “Olhando de perto, pode-se dizer que eles o fizeram, mas nós o desejamos… Quando o poder global monopoliza a situação a este nível, quando há tamanha condensação de todas as funções na maquinaria tecnocrática, e quando nenhuma forma alternativa de pensamento é permitida, que outro caminho há senão uma guinada situacional terrorista? Foi o próprio sistema que criou as condições objetivas para essa brutal retaliação” (grifos meus).

Obviamente, também entre os intelectuais brasileiros de esquerda houve quem justificasse o terrorismo como meio político aceitável e até mesmo inevitável. Também por ocasião do 11 de setembro, escrevendo para o Correio Braziliense, o psolista uspiano Vladimir Safatle seguiu a senda aberta por Baudrillard: “Verdade seja dita: a terça-feira negra mostrou como a ação política mais adequada para a nossa época é o terrorismo. Ele é o que resta quando reduzimos a dimensão do conflito social à lógica do espetáculo”.

Ataque terrorista ao World Trade Center, em Nova Iorque, 
em 11 de setembro de 2001 | Foto: Wikimedia Commons

Anos depois, em artigo com o significativo título “Invenção do terror que emancipa”, Safatle resenhava uma coletânea organizada por Slavoj Zizek (outro notório entusiasta da violência política redentora) e descrevia os terroristas de uma maneira bem peculiar: “Sujeitos não substanciais que tendem a se manifestar como pura potência disruptiva e negativa”. O argumento consista basicamente na afirmação de que o rótulo “terrorismo” adviria, na verdade, de um juízo burguês, moralista e reacionário de práticas revolucionárias inerentes à história política moderna.

Por óbvio, os tortuosos argumentos avançados por intelectuais enragés acabam sempre formatando as cabecinhas do pessoal das províncias das redações e dos estúdios, levando-os a assimilarem como fato inconteste uma tese para lá de controversa, segundo a qual o terror “que emancipa” é sempre uma reação a uma agressão anterior. Retratando a América (ou Israel, ou mesmo o Ocidente como um todo) como o agente primeiro e transcendental do terrorismo, Chomsky, Baudrillard, Safatle e os jornalistas que consomem a sua papinha ideológica acabam equiparando terroristas e vítimas, ambos passivamente sujeitos à atuação de um ator histórico que, de fora e acima, os determina igualmente. Diante do algoz abstrato e categorial, as vítimas concretas (mortas pelo terror) e os agressores concretos (os terroristas da Al-Qaeda, do Hamas ou do Estado Islâmico) são nivelados na condição de pacientes históricos. Diante do “fato” primeiro da opressão, o terrorismo torna-se praticamente um imperativo categórico — ou, nas palavras de Safatle, “a ação política mais adequada para a nossa época”.

Não é espantoso que essa mesma esquerda, para a qual o terrorismo concreto sempre foi relativizadoquando não exaltado, como se vê na representação cultural benevolente do líder terrorista Carlos Marighella, resolva agora absolutizar o termo para aplicá-lo irrestritamente a todos os bolsonaristas de algum modo associados aos atos de 8 de janeiro? Deliberadamente omitindo o fato de que, segundo a lei, nem mesmo os crimes efetivamente cometidos naquele dia (vandalismo, depredação, destruição de patrimônio etc.) poderiam ser tipificados como terrorismo, a militância de redação pró-PT não pensou duas vezes em estigmatizar como “terroristas” até mesmo quem não os cometeu, e, mantendo-se acampados em frente ao QG do Exército, nem sequer esteve presente na Praça dos Três Poderes.

Como mostra reportagem de Oeste, a própria PGR afirmou não ser possível enquadrar como “terroristas” os responsáveis pelos atos
De acordo com a Lei Antiterrorismo, de nº 13.260, sancionada por Dilma Rousseff em 2016, não faz parte dos tipos penais o cometimento de crimes por razões políticas
Na época, essa ressalva na lei foi concebida a fim de proteger grupos radicais alinhados ao petismo (a exemplo do MST, do MTST, da UJS etc.), para que pudessem continuar cometendo impunemente suas ações de violência política. 
Embora seu mérito seja questionável — pois baseada na ética das intenções, e não na das consequências , o fato é que a ressalva foi aprovada e incorporada na lei, e, portanto, sua aplicação deveria ser isonômica.

Não é o que temos visto, obviamente. Porque o interesse não é saber o que é um terrorista caso em que os militantes de redação deveriam perguntar, por exemplo, a Orlando Lovecchio, que, em 19 de março de 1968, perdeu a perna na explosão de uma bomba “pela democracia” detonada pelos rebentos de Marighella. O interesse é prender e neutralizar adversários políticos. E aí o nome das coisas vira um mero detalhe. O reino de Confúcio — “a verdadeira sabedoria é dar às coisas os nomes certos” — é substituído pelo do Humpty-Dumpty, o cabeça-de-ovo: “Quando uso uma palavra, ela significa o que eu quiser que ela signifique”.

Leia também “O foro de São Paulo no poder”

Flávio Gordon, colunista - Revista Oeste

 

quarta-feira, 30 de dezembro de 2020

A tempestade perfeita que poderá custar o mandato de Bolsonaro - Ricardo Noblat

Blog do Noblat

Ele é uma ameaça à vida alheia 

Se for o que resta para mostrar a que ponto chegou Bolsonaro, compare-se o seu comportamento com relação à vacinação em massa contra o vírus com o comportamento dos governantes mais autoritários do mundo, todos, como ele, de extrema-direita.  O ditador da República da Bielorrússia, Aleksandr Lukashenko, anunciou que não se vacinará porque a Covid-19 já o pegou faz algum tempo – como se não pudesse pegá-lo outra vez. Mas a imunização no seu país começou uma semana antes do previsto.

Até abril serão vacinadas 1,2 milhão de pessoas. Numa segunda etapa, mais 5,5 milhões. Na Hungria do primeiro-ministro Viktor Orbán, um dos poucos chefes de Estado a comparecer à posse de Bolsonaro, a vacinação começou no último sábado. A Polônia tem um governo nacionalista conservador admirado pelo presidente brasileiro. Pois bem: ali, ontem, os dois líderes dos partidos rivais Plataforma Cívica (liberal) e Lei e Justiça (conservador) foram filmados vacinando-se juntos.

Ontem também, os países da Comunidade Econômica Europeia compraram mais 100 milhões de doses da vacina da Pfizer. Em colapso desde a explosão do seu porto em Beirute, o Líbano comprou à Pfizer duas milhões de doses de vacina. Aqui, onde nas últimas 24 horas o vírus matou 1.075 pessoas e infectou mais de 57 mil, a Pfizer indicou em nota que no momento não irá pedir autorização de uso emergencial do seu imunizante porque as exigências do governo demandam tempo.

Como uma das muitas vacinas que já foram aprovadas em outros países e que estão sendo aplicadas por toda parte não pode estar rapidamente disponível para os brasileiros? É a pergunta que Bolsonaro e seus cúmplices se recusam a responder.

Na melhor das hipóteses, segundo o Ministério da Saúde, a vacinação contra o vírus está prevista para começar em 20 de janeiro, e na pior até o final da primeira quinzena de fevereiro. Quantas vezes você não leu previsões furadas? [especialmente quando apresentadas pelo Joãozinho Doria e diretores do Instituto Butantan - diretores que estão apequenando, retirando a credibilidade, de uma instituição centenária e mundialmente reconhecida pela seriedade e competência.]

Por outra parte, por que o espanto com a incompetência do governo Bolsonaro em dar início à vacinação? Quando foi que o governo dele revelou-se competente para tentar resolver um só grande problema do país nos últimos 2 anos? O prefeito Alexandre Kalil, de Belo Horizonte, reeleito com uma votação recorde, estoca há meses seringas de sobra para vacinar os habitantes de sua cidade e de cidades próximas. O que impediu o governo federal de fazer a mesma coisa?

Fracassou o pregão eletrônico realizado ontem pelo Ministério da Saúde para a compra de seringas e agulhas. De um total de 331 milhões unidades previstas para serem adquiridas, o ministério conseguiu fornecedor para apenas 7,9 milhões. Uma titica.

Não se brinca impunemente com vidas alheias, mas Bolsonaro insiste em brincar. Gosta de viver em perigo. Por que não brinca com a própria vida, quando nada para relembrar os antigos e bons tempos de paraquedista do Exército?  
Só a vacinação em massa já, e bem-sucedida, salvará o sonho de Bolsonaro de se reeleger daqui a dois anos, e mesmo assim não será tão fácil como parecia. O contrário disso será com toda certeza a abertura de um processo de impeachment. Crime de responsabilidade é razão para a abertura de um processo de impeachment do presidente. [crime de responsabilidade cometido; a quase totalidade da mídia acusa o presidente Bolsonaro da prática de  crime de responsabilidade, só que tudo não passa de relatos de supostas ocorrências = denúncia com tipificação fundamentada, juridicamente correta, do crime de responsabilidade não é apresentada. 
As vezes chamam de denúncia um emaranhado de narrativas que além de não comprovadas, não constituem crime, seja de responsabilidade ou qualquer outro.  
Além da necessidade do denunciado ser provado,  o presidente da Câmara dos Deputados tem competência para receber o pedido e pautar sua apreciação pelo plenário da Câmara. 
São os deputados que apreciam o pedido encaminhado que só se transforma em processo se receber, no mínimo,  342 votos favoráveis à transformação. 341 votos ou menos não são suficientes para sequer abrir a sessão. Decidido pelos deputados a abertura do processo o presidente da Câmara passa a ser apenas um espectador privilegiado.]
Falhar gravemente em garantir a vida das pessoas é o maior crime de responsabilidade que um presidente pode cometer. E daí? Daí que é por isso que Bolsonaro precisa tanto eleger Arthur Lira (PP-AL) presidente da Câmara dos Deputados. A abertura de um processo de impeachment depende exclusivamente do presidente da Câmara. Por lá, mais de 50 pedidos repousam numa gaveta. [Alguém em sã consciência, é capaz de achar que o deputado Maia,  contrário ao capitão quanto é, iria desperdiçar a oportunidade encaminhar um pedido de impeachment contra Bolsonaro? 
Claro que não. 
Não faz, nem fez, por saber que receberá atenção de alguns holofotes, mas o arquivamento do pedido causará mais prejuízos a ele e a outros inimigos do presidente, do que a tentativa de abertura.]

Blog do Noblat - Ricardo Noblat, jornalista - VEJA
 
 

sábado, 15 de agosto de 2020

Enfim uma boa notícia no Oriente Médio, mas tem quem reclame - Blog Mundialista

Tudo de bom: acordo entre Israel e Emirados Árabes Unidos abre uma fase promissora e “tira da pauta” a anexação de territórios palestinos 

“Mensagem de amor de Telavive”. Assim a prefeitura da cidade ilustrou a fachada de luzes nas cores de Israel e dos Emirados Árabes Unidos – os Emirados, para simplificar. Uma semana antes, a  iluminação em forma da bandeira do Líbano, em solidariedade aos mortos na grande explosão do porto de Beirute, provocou reações furiosas. Israelenses de direita consideraram um ato de traição, uma vez que o Líbano continua a não aceitar um tratado de paz com Israel, e libaneses muito mais extremistas reagiram: “Vamos iluminar Telavive com nossos mísseis”. 

O clima completamente diferente que cerca a aproximação oficial entre Israel e os Emirados é um dos raros momentos em que o Oriente Médio produz uma notícia boa. A aproximação é produto de um longo processo de acerto entre interesses comuns. Israel não precisou pagar com a devolução de territórios, como aconteceu com o Sinai reintegrado ao Egito, em 1979.

O retorno de Yasser Arafat e a  transferência de territórios à Autoridade Palestina, em 1994, também envolveu essa “troca de paz por terra”. Foi uma experiência infeliz, fracassada ou condenada na opinião de muitos israelenses, decepcionados com a militarização e os atentados terroristas provocados pelos novos “aliados”. A maioria dos palestinos também se decepcionou por não conseguir o Estado independente que deveria estar na continuidade dos acordos.

Romper o tabu e se acertar com Israel sem ter o interesse premente de uma troca territorial é um passo muito importante não apenas pelo resultado presente como também pelo que antecipa como futuro: a aceitação de Israel como um país “normal”, não uma  entidade odiada a ser varrida do mapa ou, na falta de capacidade para fazer isso, hostilizada e rejeitada.

Por que o entendimento foi recebido com tanta má vontade em vários setores? Primeiro, porque é uma conquista de dois governantes abominados, Donald Trump e Benjamin Netanyahu. O terceiro integrante do acordo, o príncipe Mohammed Bin Zayed,  herdeiro de Abu Dabi e líder do pequeno e rico colar de emirados que foram uma entidade comum às margens do Golfo Pérsico, tampouco é uma flor da democracia e das liberdades fundamentais – ninguém é nessa região do mundo.

Segundo, porque nada é capaz de satisfazer as expectativas dos palestinos e de seus simpatizantes. [as expectativas dos palestinos são simples de satisfazer: querem apenas não ser estrangeiros em sua própria terra, vítimas de invasões de 'agricultores' - colônias de israelenses na Cisjordânia - 'agricultores' que contam com um apoio de um poderoso exército.
o número de mortos na explosão em Beirute, é muitas vezes inferior ao de civis palestinos mortos pelas chamadas Forças de Defesa de Israel - que utilizam aviões de última geração e poderosos blindados, para se 'defender'  de civis palestinos desarmados e em sua própria terra - ou migalhas que lhe foram concedidas.
Israel tem direito a um território, mas, não pode exercer tal direito tomando terras do mais fraco.]

O primeiro-ministro de Israel estava a poucos dias de anunciar a anexação das faixas de território palestino que, na prática, já são anexadas pela presença de enclaves residenciais habitados por judeus.
Como bom negociador, Bibi mais do que insinuou que anexaria também todo o lado ocidental do vale do rio Jordão.

Uma cartada que saiu rapidamente da mesaSobre a anexação das áreas sob controle total de Israel, Bibi sustenta que não foi eliminada  

Em Mundialista - Blog de Vilma Gryzinski - VEJA - MATÉRIA COMPLETA

quinta-feira, 2 de janeiro de 2020

Lula preso valia mais politicamente que Lula livre - Merval Pereira

O Globo

Chances renovadas

O novo ano começa como os últimos, com esperanças de que o país recupere sua capacidade de crescimento econômico. As perspectivas desta vez são melhores do que já foram, especialmente porque o governo, eleito pelo voto popular, mantém seu projeto reformista, avalizado pela aprovação da reforma da Previdência. O governo Temer, um intervalo entre o petismo e o bolsonarismo, chegou a ter o controle político do Congresso, mas perdeu a chance de aprovar a reforma da Previdência devido à crise desencadeada pelo diálogo gravado com o empresário Joesley Batista. [e as denúncias, até hoje não provadas, apresentadas pelo ex-PGR Rodrigo enganot;
a propósito, as delações dos açougueiros de Anapólis, irmãos Batista, já foram homologadas?]

Temer teve que trocar o apoio que tinha no Congresso pela manutenção de seu cargo, perdendo força para aprovar as reformas. Hoje, temos pela primeira vez um Congresso renovado que comprou a ideia de que é preciso reformar estruturalmente o país, e um governo que mantém o objetivo de aprovar as reformas tributária, administrativa, do pacto federativo. O parlamentarismo branco faz com que o Congresso module as reformas propostas pelo Executivo, às vezes avançando, principalmente na economia, em outras as adequa a seu perfil, como no pacote anticorrupção. Sempre, porém, tem havido progressos.

O Supremo Tribunal Federal (STF) assumiu para si garantir a governabilidade do país, num estranho pacto entre os Três Poderes que não reflete obrigatoriamente o pensamento da maioria de seus pares.  Como quando seu presidente Dias Toffoli blindou a presidência da República sustando a investigação sobre o suposto esquema de lavagem de dinheiro envolvendo o hoje senador Flavio Bolsonaro quando era deputado estadual no Rio e tinha o famigerado Queiroz como seu assessor de confiança. O calcanhar de Aquiles do governo.  [2019 mudou para 2020, mas, o nosso presidente Bolsonaro continua tendo um CPF e o senador Flávio, seu filho, um outro CPF;
Também, até o presente momento, existe indícios contra um ex-assessor do hoje senador e a suspeita de envolvimento do parlamentar com possível, e ainda não provada, irregularidades.]
Toffoli teve que voltar atrás e aderir à decisão da maioria que avalizou a atuação do antigo Coaf e da Receita Federal. Apesar dos êxitos na área econômica e da popularidade do ministro Sérgio Moro, identificado pela opinião pública com o combate à corrupção e ao crime organizado, a presidência de Bolsonaro consegue reduzir suas próprias conquistas com a obsessão de aniquilar a esquerda e produzir embates quase diários para manter a polarização com o PT. [ o PT está em avançado processo de implosão e os seus pseudos líderes - combinando com os objetivos do partido perda total, os seus líderes são todos envolvidos com a Justiça:
- a cabeça da serpente é um duplamente condenado, em liberdade temporária, e com vários outros processos em curso e que resultarão em novas condenações;
- a vice líder responde a processos penais e é questão de tempo ser condenada.
Assim, o perda total é praticamente uma carta fora do baralho.

Quanto a esquerda o BEM COMUM impõe sua eliminação, aliás, um processo que está ocorrendo nas mais importantes nações do mundo.]
Assim como Lula já definiu como seus alvos principais os ministros Guedes e Moro, justamente as áreas mais bem sucedidas do ministério, também Bolsonaro empenha-se em colocar-se mais uma vez como o antiPT, na suposição de que esse é seu principal ativo político. As crises políticas que alimenta podem representar obstáculos intransponíveis a qualquer momento. Bolsonaro pode também estar equivocado, mantendo a chama acessa do lulismo, que até o momento não se mostra capaz de mobilizações populares como antes da prisão do ex-presidente.
Lula preso valia mais politicamente que Lula livre.         

Uma certeza
É impossível no momento saber exatamente como seu deu a fuga de
Carlos Ghosn, ex-presidente da Nissan, do Japão para Beirute, no Líbano. Desconfia-se de que governos estrangeiros ajudaram de alguma maneira na fuga. Mas uma coisa parece certa: dentre eles, não está o governo brasileiro. Apesar dos esforços do ministro da Economia Paulo Guedes, amigo de Ghosn, que apelou primeiro ao ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araujo. Não tendo sido atendido, Guedes foi a Bolsonaro. Conseguiu que se comprometesse a visitar o empresário brasileiro quando estivesse em Tóquio na reunião do G-20, em junho. O máximo que fez foi falar ao telefone com Ghosn, que se encontrava em prisão domiciliar.

O executivo foi convidado duas vezes para dirigir a Ford. A primeira em 2006, e ele exigiu acumular a direção executiva com a presidência do conselho de administração, que era presidido por Bill Ford Jr. Não deu certo.
Em 2008, na grande crise econômica, o então presidente Obama procurou-o pessoalmente para oferecer-lhe o dobro de seu salário na Nissan para presidir a Ford, que estava à beira da falência. Mais uma vez Carlos Ghosn recusou.

Merval Pereira, colunista - O Globo 


quinta-feira, 14 de novembro de 2019

Míssil no quarto: Israel tem o direito de matar terroristas? - VEJA - Mundialista

Por Vilma Gryzinski

Desde pasta de dente envenenada até um ataque de alta precisão como o que detonou chefe da Jihad Islâmica, assassinatos em nome da defesa nacional


Como um homem com a cabeça a prêmio, e justamente pelo mais letal dos inimigos, Baha Abu Al-Ata dormia cada hora num esconderijo em Gaza. Não é um lugar muito bom para se esconder, mas o chefão da Jihad Islâmica Palestina, um grupo armado e bancado pelo Irã, não tinha muitas alternativas fora ficar sempre em zonas cheias de civis , inclusive familiares, como escudo humano. Às 4 horas da manhã de terça-feira, um único míssil de alta precisão foi disparado através da janela do quarto onde Abu Ata dormia com a esposa.
Foram as únicas vítimas fatais, no ato.


[Israel executa um inimigo que está dormindo, com a esposa que também é assassinada. 
Não satisfeito, a pretexto de vingar misseis lançados contra o território israelense, atacam com aviões ultramodernos civis palestinos desarmados.
É a batalha do estilingue contra aviões caça.]

Minimizar os “danos colaterais” é sempre politicamente conveniente embora nenhum israelense tenha a menor ilusão de que o país deixaria de ser vergastado em organizações internacionais, mesmo quando o alvo é o dirigente de uma organização armada que prega a eliminação total de Israel. A “morte dirigida” foi aprovada pelas mais altas instâncias jurídicas das forças armadas, da mesma forma que acontece nos Estados Unidos, onde o 11 de Setembro liberou os militares para a prática e o uso de drones facilitou-a enormemente.

Só o presidente Barack Obama autorizou mais de 500 ataques com drones. A tática das “mortes dirigidas” foi endossada pela Suprema Corte de Israel em 2006, depois de anos de debates jurídicos e com várias restrições.  Obviamente, causa enorme controvérsia, inclusive dentro de Israel, apesar do apoio quase total da opinião pública.
Em especial no caso do chefe da Jihad Islâmica, um grupo que é praticamente um poder paralelo em Gaza, competindo com o Hamas no lançamento de foguetes contra a população civil e atentados suicidas em território israelense.
O Hamas assumiu um compromisso, negociado com o Egito, de segurar o foguetório em troca de um alívio nas restrições que Israel impõe a Gaza em represália pelos ataques.

O “alívio” inclui o recebimento de dinheiro vivo para a folha de pagamento de funcionários públicos. Numa única dessas remessas, bancadas pelo Catar, foram 15 milhões de dólares em malas, num carro de luxo.  É claro que o Hamas está fazendo uma grande encenação de revolta pelo assassinato, tem uma gritaria geral de “sangue de um, sangue de todos”, mais uma vez chovem foguetes, mesmo depois de um novo cessar-fogo.Nos bastidores, mais de uma vez pediu a aliados que controlassem Abu Ata e sua turma, que têm arsenal de fabricação própria próprio e total alinhamento com os interesses do Irã.

Como toda política é local, houve reações da oposição israelense acusando interesse politiqueiro de Benjamin Netanyahu.  Bibi chefia o governo em caráter temporário, visto que nenhum dos dois blocos mais votados consegue formar maioria no Parlamento.  Ele também tinha empenho especial em despachar Abu Ata desde que foi retirado pela segurança, em cenas transmitidas ao vivo, quando a Jihad Islâmica disparou foguetes contra o lugar onde fazia um comício, uma semana antes da eleição de 17 de setembro.

O resultado embolado dessa eleição se prolonga até agora: nem Netanyahu nem Benny Gantz, da frente que conseguiu um parlamentar a mais, conseguem a maioria necessária. Gantz, que foi chefe do estado-maior das forças armadas, apoiou a operação contra Abu Ata. Simultânea a outra, em Damasco, onde o número dois da Jihad escapou com ferimentos.  Quando a escalada atingiu um nível mais generalizado, Israel também aproveitou para bombardear o comandante da unidade de foguetes da Jihad Islâmica, Rasmi Abu Malhous.
 
PRÍNCIPE VERMELHO
Mas nenhum primeiro-ministro pode tomar sozinho a decisão de uma “morte dirigida”. A palavra final é do alto comando das Forças de Defesa de Israel, quando é uma ação militar clássica.  Em várias ocasiões, o comando militar vetou o ataque contra Abu Ata, por motivos operacionais e outros, nunca revelados. Os “astros se alinharam”, na definição de um porta-voz, dez dias antes.

O outro modus operandi para as “mortes dirigidas” são ações clandestinas, a cargo de uma unidade especial do Mossad. Seus agentes recebem treinamento à parte do resto do serviço de inteligência, em Cesareia, a cidade portuária construída por Herodes, o Grande, alguns anos antes do advento da era cristã.  Como nos filmes, jamais podem falar com ninguém sobre o “serviço” nem revelar seus nomes verdadeiros, exceto para os cônjuges.
Ao contrário dos filmes e apesar da legendária eficiência do Mossad, as coisas podem dar errado.
Foi assim que um garçom marroquino foi assassinado na Noruega em 1973, erroneamente identificado como Ali Hassan Salameh, o sedutor Príncipe Vermelho, organizador do massacre de Munique, o sequestro e execução de atletas israelenses durante as Olimpíadas.

Além de matarem o homem errado, os agentes israelenses ainda foram identificados por um companheiro que pisou na bola por um motivo absurdo.
A missão dele era abandonar o carro usado no assassinato – com placa anotada, como sabiam os israelenses –, pegar um trem e daí deixar o país de avião, anonimamente.  Como tinha comprado equipamentos hidráulicos, incluindo torneiras, para sua casa, não quis carregar peso e decidiu devolver o carro na agência onde havia sido alugado. A polícia norueguesa já estava esperando por ele.
O escândalo foi recriado em detalhes pelo jornalista Ronen Bergman no livro Rise and Kill.

O título é uma referência a um trecho do Talmude que diz: “Se alguém está vindo para te matar, erga-te e mate primeiro”.
Bergman não tem nenhuma simpatia pela política que guiou, segundo suas contas, mais de cinco mil assassinatos desde bem antes da criação do Estado de Israel.
Segundo ele, agentes do Mossad tiveram duas oportunidades de pegar Josef Megele no Brasil, o Anjo da Morte das experiências monstruosas em Auschwitz, mas deixaram passar.
Numa dessas ocasiões, chegaram a acompanhar seus movimentos na fazenda que tinha em Caieiras, mas receberam ordens de largar a operação e voltar rapidamente porque uma crise maior, a dos mísseis secretos do Egito, estava explodindo.
Mengele morreu afogado em Bertioga, em 1979.

Caçar nazistas não era uma prioridade do Mossad, com exceções notórias como o caso de Adolf Eichmann, sequestrado na Argentina e julgado, condenado e enforcado em Israel.
Motivo? Já não podiam fazer mal a Israel, ao contrário dos chefes de várias organizações armadas palestinas.  O mais importante deles, Yasser Arafat, estava fora da lista por ser uma personalidade importante demais – e a pedido dos Estados Unidos.
Quando Ariel Sharon assumiu como ministro da  Defesa, segundo a reconstituição de Bergman, mandou colocar Arafat na lista de novo. Brigou com altos comandantes que resistiram a planos de assassinato que provocariam a morte de muitos civis inocentes.

Como praticamente todos os palestinos, Bergman mais do que dá a entender que Sharon finalmente conseguiu seu objetivo de forma mais sutil, aparentemente através de intoxicação por algum elemento radiativo.
Cercado em seu bunker, Arafat caiu doente, foi levado para a França e acabou morrendo, em novembro de 2004. A coisa toda aconteceu em um mês. Em 2012, o corpo dele, enterrado em Ramallah, foi exumado para a retirada de vestígios ósseos e devolvido à sepultura em seis horas. Mas não houve nenhum resultado conclusivo.
Sem os constrangimentos da censura militar no caso de Arafat, Bergman dá detalhes do assassinato de Wadie Haddad, da Frente Popular de Libertação da Palestina, em 1978.

Na época, palestinos cristãos como Haddad estavam entre os mais radicais e se alinhavam ideologicamente com o nacionalismo árabe e o comunismo – a onda do novo islamismo fundamentalista acabou totalmente com isso, exceto por alguns bolsões no Líbano. Haddad foi envenenado gradualmente com uma bactéria tóxica colocada em sua pasta de dentes. Morreu gritando de dores horríveis num hospital militar da Alemanha Oriental.
Cientistas iraquianos que viajavam para ampliar o programa nuclear secreto de Saddam Hussein foram orientados a levar sempre escova e pasta próprios quando viajavam para o exterior.
Pelo menos dois acabaram assassinados e o programa explodiu literalmente com o bombardeio do reator de Osirak.

“JUÍZO FINAL”
Vários cientistas iranianos também foram alvos das “mortes dirigidas”, mas o Irã continua avançando rumo a um arsenal nuclear.  A pretexto da saída americana do acordo nuclear internacional, já está enriquecendo urânio a 60%. Diminuiu assim radicalmente a extensão do “corredor de tempo” necessário para produzir a bomba, que demanda urânio enriquecido a 90%.
Vai, assim, aumentando o tamanho da ameaça existencial a Israel.  Apesar de imensamente complicado, um ataque preventivo às instalações nucleares iranianas é viável em termos operacionais.  Existe forte oposição a uma operação assim dentro do establishment militar de Israel.
Em última instância, porém, são os Estados Unidos que seguram a barra e impedem o “ataque do juízo final”.

Foram os Estados Unidos que arrancaram de Menachem Begin a promessa de não matar Arafat quando, derrotado, teve que deixar o Líbano, de navio, em 1982.
Um atirador de elite israelense tirou uma foto com Arafat na mira de seu fuzil e Begin deu-a de presente a Philip Habib, o embaixador americano no Líbano, como prova da palavra cumprida.  Em tempo: Ali Hassan Salameh, o mentor do massacre de Munique confundido com o garçom marroquino na Noruega, foi morto por um carro-bomba em Beirute, quando ia para a festa de aniversário da mãe, em 1979.

Uma agente do Mossad, com codinome de Erika Chambers, usou a legendária queda do Príncipe Vermelho por mulheres bonitas para levantar seus itinerários. Escapou com os outros 16 agentes do Mossad envolvidos na operação. As “mortes dirigidas” e altamente contestáveis, do ponto de vista jurídico, político e pragmático, não mudam os fundamentos dos problemas de Israel.  Primeiro, a população palestina que vive em seu território internacionalmente reconhecido, tendo cidadania e direitos – cerca de 20% –, embora preferisse estar de outro lado.
Segundo, e acima de tudo, os palestinos dos territórios ocupados, cujos líderes não aceitam alternativas para que tenham um Estado próprio, como seria certo e justo.
Mas “matar primeiro aquele que vem para te matar” não é uma prática que vá sumir do mapa tão cedo.
Pelo menos, enquanto os inimigos de Israel desejarem este destino coletivo para o país.
E, enquanto isso, as centrífugas iranianas estão funcionando a mil.

quarta-feira, 9 de maio de 2018

Vídeo do YouTube com conteúdo falso dá prisão… Lá na Malásia



Índia ameaçou suspender registro profissional de jornalistas denunciados por criar ou propagar fake news, mas decidiu voltar atrás 


No dia 21 de abril, o professor e ativista palestino Faid al-Batsh caminhava pelas ruas de Kuala Lumpur, na Malásia, quando levou dois tiros disparados por homens que passaram ao seu lado montados numa moto. O assassinato, que pode ter viés político - já que Al-Batsh era próximo ao movimento fundamentalista Hamas, continua sem solução, mas já entrou para a história por outra razão. Derivou na prisão de um dinamarquês que “intencionalmente publicou uma fake news no YouTube”.

Na última segunda-feira (30), Salah Salem Saleh Sulaiman, de 46 anos, foi sentenciado à prisão por um juiz malaio que entendeu que ele havia divulgado um vídeo mentiroso na internet, infringindo as leis locais. À distância, o caso parece simples. Ao saber da morte de Al-Batsh, o dinamarquês conectou sua câmera, gravou um vídeo e postou no YouTube todo seu ódio. Na gravação, acusava a polícia de ter demorado 50 minutos para chegar ao local do crime. Os dados oficiais mostraram, no entanto, que a demora tinha sido bem inferior - de apenas 8 minutos. Resultado: Sulaiman foi a primeira pessoa a ser enquadrada na novíssima lei anti-fake news aprovada na Malásia. Como alegou que não tinha dinheiro para pagar a fiança de 10 mil ringgit (aproximadamente 8,9 mil reais), terá que passar um mês na prisão como produtor de fake news.

“Eu concordo que cometi um erro”, disse Sulaiman, segundo reportagem da Reuters. “Peço desculpas a todos na Malásia. Não apenas à polícia”. Para o dinamarquês, a gravação postada no YouTube foi apenas fruto de um “momento de ódio” e não tinha por objetivo fazer mal a ninguém. Mas não convenceu o juiz.  A sentença aplicada a Sulaiman correu o mundo nos últimos dias. Fez o Oriente e sobretudo o Oriente Médio se agitarem ante a possibilidade de novas leis parecidas à malaia se espalharem por lá. E o que não falta é projeto de lei para criminalizar tanto a produção quanto a divulgação de fake news, sem definir ao certo o que são. Cingapura e Filipinas, por exemplo, já se debruçam sobre versões parecidas ao Anti-Fake News Act da Malásia. Enquanto isso, defensores da liberdade de expressão alertam para o enorme risco que veem pela frente.

“Deveríamos estar mais preocupados com a liberdade de expressão do que com as fake news”, diz Saloua Ghazouani Oueslati, diretora da ONG Article 19 no Oriente Médio e Norte da África. “Os países da nossa região não têm judiciários independentes. Corremos o risco de assistir ao cerceamento de opiniões divergentes. E isso será um grande erro”.  Saloua foi uma das palestrantes no evento “Fake News and Media Viability”, realizado pela Deutsche Welle e a Maharat Foundation em Beirute no fim do mês passado. Participou de uma mesa ao lado de outros dois jornalistas árabes e um europeu. Todos especializados no assunto e todos unânimes no que diz respeito à lei malaia: há uma chance enorme de o tiro sair pela culatra. É bem possível que as leis contra fake news acabem servindo para calar críticas e vozes dissonantes a governos e regimes.

O ideal”, propõe Saloua, “é que os estados busquem formas de promover o pluralismo em termos de informação. Que apoiem instituições que tenham bons projetos. Que não ajam de forma punitiva, mas de forma positiva, em favor do ecossistema da informação de qualidade”, continuou Saloua. Não foi o que quase aconteceu na Índia no início do mês passado. Para espanto dos jornalistas profissionais indianos, em 2 de abril, o Ministério da Informação enviou às redações um comunicado oficial. “Por conta do aumento do número de notícias falsas na imprensa e na mídia digital, o governo fez emendas nas regras para acreditação de jornalistas”. O texto, de apenas quatro parágrafos, era claro: se um dos jornalistas profissionais fosse denunciado ao Conselho de Imprensa da Índia por ter supostamente criado ou propagado fake news, seu registro poderia ser suspenso por até seis meses.

A reação foi forte, e o primeiro ministro Narendra Modi precisou reagir às pressas. Em 24 horas, anunciou que o comunicado do Ministério da Informação havia sido anulado e deu por encerrada a polêmica. Para a ONG Repórteres sem Fronteiras, entre 180 países analisados quanto à liberdade de imprensa, a Índia fica em 138º lugar. Não muito distante, o Brasil é o 102º.