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sábado, 17 de setembro de 2022

Rosa também acha que só a ditadura salva a democracia - Augsuto Nunes

 Revista  Oeste

O STF prolonga o túnel concebido para perpetuar a escuridão

Ministros Rosa Weber, Luís Roberto Barroso e Alexandre de Moraes | Foto: STF/Divulgação
Ministros Rosa Weber, Luís Roberto Barroso e Alexandre de Moraes | Foto: STF/Divulgação

No meio do falatório soporífero, resolveu apresentar ao mundo o poeta maranhense Bandeira Tribuzzi. Nem mesmo o bando de brasileiros ouvira qualquer menção ao bardo que conviveu com Sarney durante a juventude em São Luís. A procissão de platitudes recomeçou depois dos versos. Ansioso, o deputado mineiro Milton Reis enxergou na primeira vírgula a senha para soltar o grito de guerra que animava os comícios de antigamente: “Apoiado!”. As cenas de primitivismo explícito confirmaram a frase em que Millôr Fernandes condensou o sentimento nacional decorrente da descoberta dolorosa: o país que dormiu com Tancredo Neves pronto para subir a rampa do Planalto acordou com o vice no gabinete presidencial: “Sarney foi o túnel no fim da luz”.

Neste 12 de setembro, a cerimônia de posse da nova presidente do Supremo Tribunal Federal avisou que Rosa Weber é uma espécie de Sarney em forma de mulher, de toga, com sotaque gaúcho e a expressão atarantada de quem ainda não sabe direito o que faz por lá. Terminada a discurseira, enfeitada por bravatas de vereador de grotão em campanha eleitoral, ficou claro que a ministra nomeada por Dilma Rousseff é o prolongamento de um túnel que começou a ser construído em 2013, com o fim do julgamento do escândalo do Mensalão, e parece condenado a não rever a luz.

Que não se cogite descumprir ordem judicial”, caprichou na bravata a sucessora de Luiz Fux. A salva de palmas revelou que os devotos do ativismo judicial (ou da judicialização da política) encontraram no aplauso unânime o sinônimo sonoro do “apoiado!” berrado na ONU pelo deputado mineiro que admirava Sarney. [oportuno lembrar que ordens só são cumpridas quando há alguém disposto a cumpri-las e/ou quem as dá dispõe de meios para impor que sejam cumpridas.
Outro complicador é que tem uma corrente de ativismo judicial que defende que para salvar a democracia ela tem que ser destruída.!!!]
A festa oferecida a Rosa teve menos pompas e fitas que as exibidas na chegada de Alexandre de Moraes ao comando do Tribunal Superior Eleitoral. Da mesma forma que o atual, nenhum ex-presidente da República deu as caras por lá. Nenhuma surpresa. 
Aos 73 anos, Rosa ficará no cargo só até outubro de 2023. Até aposentar-se, será obediente à maluquice segundo a qual existe uma única forma de impedir que a democracia seja assassinada por Jair Bolsonaro: tratar a pontapés a Constituição e mutilar a machadadas o Estado de Direito.
 
Desde o parto do inquérito das fake news, vulgo inquérito do fim do mundo, abjeções que deixariam ruborizado o pior advogado da Coreia do Norte ganharam o status de “medidas necessárias à preservação de instituições ameaçadas por atos antidemocráticos”
Monitorada pelo decano Gilmar Mendes, a tropa que controla o Poder Judiciário é fortalecida por snipers do calibre de Luís Roberto Barroso (“Eleição não se vence, se toma”), Ricardo Lewandowski (“Se Dilma perder os direitos políticos com o impeachment, não conseguirá emprego nem como merendeira”), Edson Fachin (que proíbe a polícia de enfrentar bandidos e desarma os brasileiros honestos enquanto combate hackers homiziados na Macedônia do Norte) ou Luiz Fux (Mexeu com um ministro, mexeu com todos”).

É compreensível que um tribunal dominado por tamanhas sumidades tenha escalado Alexandre de Moraes para desempenhar simultaneamente, num único inquérito, os papéis de vítima indignada, delegado de polícia à beira de um ataque de nervos, acusador que não perdoa sequer bebê de colo e magistrado que julga tudo a favor de si mesmo até recursos que contestam medidas sem pé nem cabeça. O inquérito infame já consumiu milhares de páginas, cujo conteúdo permanece em sigilo. Assim, os alvos do carrasco não sabem sequer do que são acusados. Mesmo depois de assumir a chefia do Tribunal Superior Eleitoral, o impetuoso artilheiro segue agindo em duas frentes.

Num mesmo dia, por exemplo, enquanto o Moraes da eleição tentava sepultar a candidatura ao Senado do deputado federal Daniel Silveira, o Moraes das fake news mandou às favas os sólidos argumentos apresentados pela Procuradoria-Geral da República para que sejam respeitados os direitos constitucionais de oito empresários suspeitos de terem inventado outra brasileirice de hospício: o golpe de Estado via WhatsApp, urdido e consumado com desabafos eletrônicos. A decisão de Moraes trucidou dois textos legais. Confiram o que dizem: Artigo 129 da Constituição: Compete ao MPF promover, privativamente, a ação penal pública, na forma da lei; e requisitar diligências investigatórias e a instauração de inquérito policial, indicados os fundamentos jurídicos de suas manifestações processuais.

Parágrafo II do artigo 282 do Código de Processo Penal: “As medidas cautelares serão decretadas pelo juiz a requerimento das partes ou, quando no curso da investigação criminal, por representação da autoridade policial ou mediante requerimento do Ministério Público”.

“Pessoas sem foro privilegiado perante o STF têm de ser investigadas e processadas na primeira instância”, explica a procuradora Thaméa Danelon. “Alguém que não tem foro no STF poderá ser processado na Corte apenas se for comprovado o envolvimento em crime cometido por um indivíduo com foro.” 
Thaméa lembra que o artigo 102 da Constituição especifica que têm direito a foro privilegiado o presidente e o vice-presidente da República, parlamentares, ministros de Estado, integrantes do Ministério Público Federal, ministros do STF e do Superior Tribunal de Justiça. Empresários não figuram na lista. Mais: a Procuradoria-Geral da República só foi notificada sobre o que aconteceria depois de Moraes ter ordenado a operação
Ministro que age assim não tem notável saber jurídico (se tem, faz de conta que esqueceu).  
Tampouco parece interessado em preservar a reputação ilibada, sem a qual ninguém pode jogar no Timão da Toga
São esses os dois requisitos exigidos pela Constituição. Quem não os preenche é um ministro inconstitucional. 

Como a epidemia de truculências ilegais parece altamente contagiosa, vai se tornando mais extensa que muita motociata liderada por Bolsonaro
Neste fim de inverno, por exemplo, a juíza Marisa Gatelli, em ação numa comarca gaúcha a 90 quilômetros de Porto Alegre, ordenou a remoção de um outdoor com a inscrição DEUS PÁTRIA FAMÍLIA LIBERDADE. Marisa entendeu que a junção das quatro palavras “está ligada ao facismo. (Assim mesmo: facismo, sem o s entre o a e o c.) O nome da cidade é Vale Real. A cabeça baldia da doutora não vale um tostão.
 

Leia também “As pesquisas naufragam nas ruas”

Augusto Nunes, colunista - Revista Oeste

domingo, 6 de outubro de 2019

Uma chanchada shakespeariana - Merval Pereira

O Globo
Samuel Johnson, pensador britânico do século XVIII, dizia que os personagens das peças de Shakespeare resumiam a “progênie da humanidade”, sem faltar “nenhum tipo humano relevante, ou sentimento”. O poeta Geraldinho Carneiro, meu colega da Academia Brasileira de Letras, convidado pelo Sesc a traduzir e adaptar a peça de Shakespeare “Otelo, o Mouro de Veneza”, teve seu texto de apresentação do espetáculo censurada.Ele escreveu que, ao iniciar o trabalho, descobriu “que Iago adoraria o mundo de hoje, onde suas fake news fariam sucesso nas redes sociais. Afinal, nunca houve personagem mais competente em matéria de armações e calúnias”.

Trazendo a trama para nossos dias, ele escreveu: “Imagine um oficial de baixa patente que é preterido na carreira, e, movido pelo ressentimento, pretende destruir a república, representada pelo general Otelo e uma mocinha da classe dominante. A alegoria é tão clara que não me atrevo a decifrá-la. Fica a seu critério, caro espectador”. O texto cita o professor americano Harold Goddard, que disse que Iago "está sempre em guerra, é um piromaníaco moral, que ateia fogo à realidade.". Mas se abstém de fazer analogias, de todo modo óbvias.

Como já escrevi aqui na coluna, também o economista Gustavo Franco, estudioso da obra de Shakespeare, diz que “os enredos políticos do nosso noticiário não passam de variações empobrecidas sobre um vernáculo catalogado há cerca de 400 anos”. Ele e o advogado José Roberto Castro Neves, outro especialista na obra do bardo, fizeram um trabalho interessante, comparando seus personagens a figuras da cena política. Sobre comparação implícita de Geraldinho Carneiro de Iago a Bolsonaro, José Roberto Castro Neves diz: “O texto é ótimo, mas o Iago era muito mais sofisticado”.

Também a ex-ministra Marina Silva escreveu um artigo comparando Lula ao Rei Lear, pondo-se no lugar de Cordélia, a terceira filha, a não bajuladora, e, por isso mesmo, banida em benefício das duas outras, bem mais ambiciosas, Goneril e Regan. Quando Lear rejeita Cordélia, e decreta seu banimento — ou a demite do Ministério do Meio Ambiente —, segundo Marina, “não por acaso desmorona seu mundo. O que antes era tão bem definido passa a ser ambivalente. Ele só existe no mundo daqueles que o aceitam e o amam tal como é”. Tornou-se merecedor da reprimenda feita por meio das palavras do bobo: “Tu não deverias ter ficado velho antes de ter ficado sábio”. Lear é um belo retrato da decadência de um rei que se ilude com a sensação de que anda sobre as águas, comenta Gustavo Franco.

Falstaff, personagem de várias peças de Shakespeare, foi descrito como “simpático cachaceiro, oportunista pândego e covarde espirituoso”. Seria o tipo mais macunaímico de toda a galeria shakespeariana. “Nenhum personagem foi mais carismático, cometeu gafes e pronunciou tantos ditos espirituosos próprios de um humor de taverna, que se tornou sua marca”. Falstaff tornou-se um personagem gigantesco, destaca Gustavo Franco, contrariamente a todos os prognósticos. “Sempre retratado como gordo e barbudo, de um humor bonachão e etílico, não é preciso especular um segundo sobre onde Falstaff reencarnou no Brasil contemporâneo”, ironiza.

Falstaff,destacam Franco e Castro Neves, é o verdadeiro herói de “Henrique IV” aos olhos do público, pois é quem mais se parece com ele, e, se as coisas fossem se decidir por eleições gerais — um homem (ou mulher), um voto — Falstaff ganharia todas”. Laertes “se torna uma espécie de Ciro Gomes, movido unicamente pelo ódio imerecido a Hamlet”. Ciro tem muito também de Coriolano, o brilhante general que se voltou contra Roma, depois de preterido. Coriolano também veste o perfil de Bolsonaro: tinha enorme ressentimento da elite política, que o preteriu, a despeito de seu heroísmo. Era o outsider agressivo.

Angelo, um puritano hipócrita em “Medida por medida”, também lembra Bolsonaro. Petruchio em “A megera domada”, tentando controlar Catarina, “brusca, irritada e voluntariosa” e, finalmente, domando-a com brutalidade, refere-se ao machismo atribuído a Bolsonaro. Se o gênero humano está representado nas peças de Shakespeare, não poderia ser diferente com a nossa história política, sobretudo a recente, marcada tanto pela tragédia quanto pela comédia. 
 
Merval Pereira, jornalista - Coluna em O Globo

sábado, 25 de julho de 2015

Um filme de horror a que ninguém quer assistir

Uma das primeiras apostas de Hollywood para levar mais gente aos cinemas utilizou um truque psicológico extremamente simples: pavor. Há mais de um século, tal como antes na literatura, as pessoas eram atraídas pelo que deveriam abominar [o que ocorre na política, sendo a única razão para as pessoas votarem no Lula, Dilma e corja petista] e, graças a esta contradição, surgiram os Frankenstein, os Dráculas, médicos loucos, fantasmas, almas do outro mundo, lobisomens, monstros importados do passado, do fundo do mar, do espaço, do futuro.

No Brasil, talvez por força da infantilização das grandes audiências para as quais medo não tem charme –, um filme de horror chamou a atenção de um dos mais importantes jornais do mundo sem provocar grande frisson, apesar de nosso protagonismo na película. “Recessão e suborno: a crescente podridão no Brasil” foi o título do editorial desta quinta-feira no secular Financial Times, o jornal cor-de-salmão que raramente pisa em falso quando dá opinião (sobre música, vinho, política ou macroeconomia) e, por isso, foi vendido no mesmo dia por mais de R$ 4 bilhões de reais aos japoneses da Nikkei. “Incompetência, arrogância e corrupção tiraram do Brasil seu encanto mágico (...) Não é de admirar que o país hoje seja comparado a um infindável filme de horror.”

Que o governo não reagisse ou reagisse no estilo inglês glacialmente – era o esperado. Designado para responder, Jacques Wagner, ministro da Defesa, contestou com o argumento de veterano cinéfilo: “não é filme de horror, mas de superação”. A surpresa veio da repercussão – quase nenhuma. Por solidariedade e/ou despeito, nossa mídia enfiou a viola no saco e saiu de fininho. Para não ser denunciada como alarmista ou golpista, talvez por sentir-se absolutamente desamparada diante de uma crise tão disseminada e ameaçadora, a verdade é que a retórica e o racionalismo anglo-saxônico se impuseram aos floreios da prosa neolatina.

Ao associar de forma direta, impiedosa, o fenômeno macroeconômico da recessão à esfera criminal onde se encaixa o suborno, o jornal escancara a natureza da nossa desgraça. Para não deixar dúvidas quanto à gravidade do que está sendo investigado, adiciona dois penosos ingredientes raramente utilizados nas avaliações sobre o que aconteceu na Petrobras: incompetência e arrogância.

Para coroar o diagnóstico, o arrasador substantivo podridãoque nos remete a Shakespeare e ao inconformado Hamlet, ao reconhecer que “há algo de podre no reino da Dinamarca”. Na injusta metáfora, o Bardo não se referia apenas ao casal regicida (mãe e padrasto de Hamlet), mas à sociedade desmoralizada, corrompida, desprovida de senso moral que permitiu a consumação e a ocultação do crime.
Entende-se por que o editorial não foi transcrito e traduzido na íntegra em nossa imprensa: por pudor e autoestima. Verdadeira bomba arrasa-quarteirão, espalha estilhaços, fere a todos que, mesmo de longe, percebem o enredo. O interminável filme de horror do qual somos personagens e espectadores, ao contrário do que apregoam os mestres no gênero, parece condenado ao insucesso. Ninguém faz questão de vê-lo, o desfecho ainda demora. Nossas plateias são impacientes, se resignam às longas e artificiosas telenovelas, mas quando se trata de crises exigem soluções imediatas, no atual mandato.



Fonte: Alberto Dines - Gazeta do Povo/PR - Blog do Murilo