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sábado, 6 de fevereiro de 2021

A História se repete como farsa - Miguel Reale Júnior

O Estado de S. Paulo

O ministro da Justiça revive Armando Falcão com Lei de Segurança Nacional contra críticas
Em janeiro de 1970, sendo ministro da Justiça Alfredo Buzaid, o governo militar editou o Decreto-Lei n.º 1.077, estabelecendo a censura, visando a “preservar a moral e os bons costumes”. O obscurantismo cresceu no governo seguinte com Armando Falcão no Ministério da Justiça, quando se montou plano de combate sistemático a publicações “obscenas e subversivas”, propondo aplicar a Lei de Segurança Nacional, pois a censura e a “benigna” Lei de Imprensa seriam insuficientes na guerra psicológica adversa (confira-se: Douglas Atilla Marcelino, Subversivos e Pornográficos: censura de livros e diversões nos anos 1970). [Bons tempos aqueles, não havia tumultos, disse me disse, o entendimento de um colunista não era apresentado como fato, as coisas ruins eram noticiadas no devido contexto e sem serem maximizadas.
Os dias atuais impõem a necessidade de um controle sobre as notícias que apesar de veiculadas em grande parte da mídia, apresentam apenas opiniões, ou desejos, com a maximização do aspecto negativo. Tal comportamento, ao nosso modesto entendimento, afeta a governabilidade da nossa Pátria. Exemplo: quando o deputado Maia ainda reinava, o impeachment do presidente Bolsonaro tornou-se a panaceia de todos os males - presentes, futuros e dependendo até os passados.
Aquele parlamentar chegou a ser pressionado para pautar a votação de pedidos de impeachment - o que menos importava aos conselheiros 'patriotas' era o pequeno detalhe de não existir crime e, consequentemente, provas.
Agora que o Maia saiu e cogitar de impeachment - com a fundamentação dos apresentados - é inviável, o foco mudou. Bolsonaro continua na alça de mira dos inimigos do Brasil que não o aceitam como presidente da República. O  QUE IMPORTA É RETIRÁ-LO - até suicídio já foi sugerido. Alguns cogitam denunciá-lo, salvo engano já foi denunciado por genocídio ao TPI/Haia - Holanda por um cacique - o 'insignificante' detalhe da inexistência de mortos, ponto essencial para sustentar uma acusação de  crime de genocídio, sequer é lembrado. O fato do acusador ser um cacique viajante e octogenário substitui os mortos. 
Outros querem colocar o presidente no tronco por falta de vacinas - esquecem, tudo indica de forma proposital, outro detalhe 'insignificante': a falta de vacinas em quantidade suficiente para atender a todos. 
Situação  que também afeta  a União Europeia - uma potência econômica, que sem condições de comprar o imunizante (não por falta de dinheiro e sim devido a pouca disponibilidade do fármaco) - levando simplesmente ao abuso da chefona da UE, Ursula von der Leyen, cogitar o bloqueio do envio de vacinas da Pfizer,  fabricadas na Bélgica, para o Reino Unido. CONFIRAM: "A chefona da Europa queima largada na guerra das vacinas."
Tal situação, uma boataria, deduções apressadas, que podem estabelecer o CAOS impõe uma filtragem, uma moderação do que é veiculado. Críticas que tumultuam são também FAKE NEWS - ou as NOTÍCIAS FALSAS só são passíveis de punição quando veiculadas por apoiadores do presidente Bolsonaro?
Nos bons tempos citados no primeiro parágrafo deste comentário, o NADA A DECLARAR contribuiu em muito para a manutenção da PAZ. Alguns terroristas covardes tentaram tumultuar o processo mas foram contidos  - um exemplo da covardia deles pode ser vista neste vídeo.]
 
(.....)

A Lei de Segurança Nacional hoje em vigor, editada em 1983, guarda graves resquícios autoritários, bastando lembrar que os artigos 16 e 17 admitem ser a lei apropriada para tutela do regime excepcional vigente. Numa democracia, a crítica ao presidente [moderada e deixando bem claro o que é opinião, evitando que uma opinião seja transformada em notícia.] não se inclui como lesão ao Estado de Direito, pois não abala a estrutura do sistema democrático, inserindo-se no campo da liberdade de expressão como questão de interesse público. Essa teleologia não corresponde à postura do ministro da Justiça ao representar para enquadramento de crítica como crime contra a segurança nacional ou crime comum.

Hélio Schwartsman, em artigo na Folha de S. Paulo  (Por que torço para que Bolsonaro morra), pondera que o presidente, em seu negacionismo, prejudica a vida de muitos, argumentando que, sob a ótica do consequencialismo, o sacrifício de indivíduo pode ser válido, se dele advier um bem maior. O ministro da Justiça viu nesse texto, cujo título é de mau gosto, crime contra a segurança nacional onde há mera avaliação crítica, longe de causar qualquer abalo à estrutura democrática. [além do título de mau gosto - conforme reconhece o articulista - o primeiro parágrafo inicia: "O presidente prestaria na morte o serviço que foi incapaz de ofertar em vida. Jair Bolsonaro está com Covid-19. Torço para que o quadro se agrave e ele morra. Nada pessoal."
Convenhamos que expressar tal desejo em relação ao Presidente da República além do evidente mau gosto, oferece o risco de induzir terceiros a tentar assassinar o presidente Bolsonaro.
Lembrem-se que Bolsonaro já foi vítima de um atentado covarde, com arma branca. 
Um outro jornalista sugeriu que Trump se suicidasse e logo um seu colega estendeu a sugestão ao presidente Bolsonaro.
Ficamos a imaginar o que ocorreria se tal sugestão fosse apresentada a uma outra autoridade - do Judiciário ou Legislativo - por um apoiador do presidente Bolsonaro?] 

MATÉRIA COMPLETA - Miguel Reale Junior - O Estado de S. Paulo


domingo, 26 de janeiro de 2020

É tática ou suicídio político? Alon Feuerwerker

O próprio presidente organiza as forças que poderão destroná-lo

Quem observa com atenção o modus operandi político de Jair Bolsonaro e do governo nota uma tensão. A operação política tática é bastante convencional, move-se rigorosamente dentro das possibilidades oferecidas pela correlação de forças. Não tem maiores loucuras, grandes ousadias nem criatividade. Já a operação estratégica vai na direção contrária. O próprio presidente organiza as forças que no futuro "poderão" destroná-lo nas urnas.

A queda do secretário da Cultura foi exemplo de flexibilidade tática, como haviam sido as sanções sobre o juiz de garantias e o Fundo Eleitoral. A respeito do primeiro episódio, circulam teses conspiracionistas, e historicamente bem caracterizadas, sobre a “influência dos judeus poderosos”. Mas na vida real o que decidiu a parada foram as pressões conjuntas dos presidentes da Câmara dos Deputados, do Senado e do Supremo Tribunal Federal. [pressões indevidas, sem fundamentação constitucional ou de qualquer outra espécie;

de qualquer forma, fica o registro que Bolsonaro ainda que muitos  considerem que foi um péssimo militar, o que o capacita em várias áreas, incluindo a de estratégia.
A melhor defesa é o ataque, mas, vez ou outra, um recuo é bom na batalha.]
Bolsonaro sabe que não pode errar com o Congresso Nacional e a Suprema Corte. Não tem maioria em nenhuma das duas instituições. No Legislativo, a situação é ainda mais delicada. O presidente dinamitou o partido que o elegeu, e os demais da suposta base estão com o governo por afinidade programática e graças à liberação jamais vista de emendas parlamentares. Daí para o amor se transformar em processo de impeachment é um passo. Inclusive porque o pagamento obrigatório de emendas avança ano a ano graças ao Orçamento impositivo. Nunca antes neste país os deputados e senadores tiveram a atual montanha de investimentos para destinar a suas bases eleitorais.

Se nos Estados Unidos o impeachment virou carne de vaca (ainda que ela esteja bem mais cara do que quando a expressão foi cunhada), imagine aqui. Então Bolsonaro, esperto, não dá sopa para o azar. Quando ele diz que sancionou o Fundo Eleitoral para não ser impichado, isso deve ser levado a sério. Até porque o grosso do dinheiro liberado irá para antigos (PT) e novos (PSL) inimigos. Já que ele, como se sabe, não tem adversários, só inimigos.

Mas no campo estratégico a linha bolsonarista parece ter como centro a produção em série de adversários. No bottom line, quem está alimentando a frente ampla antibolsonarista para 2022 é o próprio Bolsonaro. A dúvida é se se trata apenas de um subproduto indesejado do esforço diário para manter fiel a base maximalista ou se é pensado. Dissecar essa distinção, uma perda de tempo, fica a cargo dos intérpretes de intenções, tão encontradiços por aí.

No campo estratégico, Bolsonaro nutre-se da crença de que na hora H o dito centro, cevado no antipetismo, não terá como apoiar a esquerda. Ou, na mão contrária, a esquerda não conseguirá conduzir seu capital eleitoral para votar numa direita mais antenada, recauchutada e moderninha, só para derrotar o bolsonarismo. São boas apostas, mas trazem embutidos riscos. Ainda não precificados. O presidente, por enquanto, parece disposto a corrê-los. Inclusive porque a eleição está longe. Só há um problema. Já disseram que no Brasil nem o passado é previsível. Sobre o futuro, a única certeza é que um dia ele vai chegar. [sobre o futuro vale o sempre afirmado pelo ministro da Justiça, Armando Falcão, governo do general Ernesto Geisel: "o futuro a Deus pertence".]

 
Alon Feuerwerker, analista político - Analise Política 


Publicado em VEJA, 
edição nº 2671, de 29 de janeiro de 2020,

quarta-feira, 31 de julho de 2019

A ‘realidade paralela’ de Bolsonaro - Elio Gaspari

Bolsonaro pode ter sua realidade paralela, mas Fernando Santa Cruz não foi executado por grupo de esquerda

Se Jair Bolsonaro conversasse com os septuagenários veteranos da “tigrada” da ditadura, não teria chamado o general da reserva Luiz Rocha Paiva de “melancia” (verde por fora, vermelho por dentro). Ele foi um dos principais colaboradores na manutenção do site Terrorismo Nunca Mais [Ternuma]. Talvez também não tivesse sugerido que Fernando Santa Cruz, desaparecido desde 1974, quando tinha 26 anos, foi executado por militantes de esquerda. Fernando era o pai do atual presidente da OAB, Felipe Santa Cruz, que tinha menos de 2 anos quando ele desapareceu.

O caso de Fernando Santa Cruz exemplifica, como poucos outros, o assassinato de uma pessoa que tinha vida legal, família constituída e domicílio conhecido. Ele morreu no último mês do governo Médici. A política de extermínio das organizações armadas brasileiras que agiam nas cidades já tinha esfriado, pois elas haviam sido esmigalhadas. Em novembro, um comando do DOI de São Paulo matou Sônia Maria Lopes de Moraes, da Ação Libertadora Nacional, e Antônio Carlos Bicalho Lana, que se escondiam no litoral paulista. Em dezembro, o Centro de Informações do Exército sequestrou em Buenos Aires e matou no Rio o ex-major Joaquim Pires Cerveira e João Batista Rita, que haviam militado na Vanguarda Popular Revolucionária. Depois disso, nada. (Do Natal de 1973 ao final de 1974, mataram cerca de 40 militantes do PCdoB nas matas do Araguaia, inclusive os que se renderam. Ou, numa realidade paralela, foram todos resgatados por um disco voador albanês) Nesse período, deu-se a decapitação da liderança do Partido Comunista, que não pegou em armas.

Fernando Santa Cruz havia sido preso no Recife em 1966, quando era menor de idade. Desde 1968 tinha vida legal. Trabalhou no Ministério do Interior e mudou-se para São Paulo, onde trabalhava no Departamento de Águas e Energia Elétrica. Durante o carnaval de 1974, Fernando estava no Rio e marcou um encontro com o amigo Eduardo Collier, militante da APML. Temia ser preso e falou disso com a família. [Eduardo Colier Filho, também militante da organização terrorista AP - Ação Popular e da
APML - Ação Popular Marxista Leninista - APML;

quanto as execuções realizadas pelas próprias organização terroristas são incontestáveis, existindo  centenas de vídeos com depoimento de executores - aqui você tem um vídeo detalhado,  com o depoimento de um dos mais cruéis terrorista e executor, confirmando a prática.] é fato incontestável ]

Um policial de apelido “Marechal” disse que ele estava preso num quartel da guarnição de São Paulo. Daí em diante, nada. A mãe de Fernando, Elzita Santa Cruz, morta há pouco, foi uma leoa e bateu em todas as portas. Os senadores Franco Montoro e Amaral Peixoto perguntaram pelo paradeiro de Fernando da tribuna da Casa. Elzita escreveu ao comandante da guarnição do Rio e ao marechal Juarez Távora. O velho tenente de 1930 enviou a carta ao general Golbery, chefe do Gabinete Civil do presidente Ernesto Geisel, que assumira em março. Meses depois, ela interpelou o próprio Golbery. Na busca por Fernando, teve a ajuda do marechal Cordeiro de Farias, comandante da Artilharia da FEB na Itália. Nada. O ministro da Justiça, Armando Falcão, informava que estava foragido, vivendo “na clandestinidade”. Mentira.



Nenhuma família de militante executado fingiu que ele desapareceu. Bolsonaro pode ter sua realidade paralela, mas o general Rocha Paiva nunca foi “melancia”, nem Fernando Santa Cruz foi executado pela APML. Por falar nisso, Rubens Paiva não foi resgatado por comparsas. Quem diz isso são oficiais que estavam no quartel da PE do Rio em 1971.


Elio Gaspari, jornalista - Folha e O Globo
 

domingo, 21 de abril de 2019

Censura: é verdade esse “bilete” do STF

A censura de vez em quando aparece, aqui e em outros lugares: os censores proibiram Gustav Flaubert, na França, na segunda metade do século XIX


Deonísio da Silva
Em agosto do ano passado, em Bocaina (SP), Gabriel Lucca, um menino de seis anos, aluno da professora Paula Renata Robardelli, não queria ir para a escola no dia seguinte e entregou à mãe um pedaço de papel rasgado onde estava escrito: Senhores Paes, amanhã não vai ter aula porque pode ser feriado. Assinado: Tia Paulinha. É verdade esse bilete”. 

O menino cometeu apenas dois erros de ortografia, mais do que perdoáveis. Ele estava nos primeiros passos de duas das quatro ações indispensáveis ao ensino de Português: ouvir, falar, ler e escrever. E deu indícios de vocação diplomática: “pode ser feriado”. Talvez não seja…  O guri (peixe pequenino para os tupis e, por isso, menino) ou o piá (extraído das minha entranhas, para os caingangues, no ponto de vista dos pais) escreveu paes, em vez de pais; e bilete, em vez de bilhete.  Esses tropeços devem ser creditados mais às notórias incoerências da grafia da norma culta da língua portuguesa do que a insuficiências do menino. Logo ele aprenderá que a língua falada e a língua escrita têm códigos diferentes.

Quanto ao “não vai ter aula” em vez de “não vai haver” ou “não haverá”, é mais perdoável ainda: faz tempo que no coloquial o verbo “ter” é usado como substitutivo de “haver”, de “existir” e outros verbos de domínio conexo. Tia Paulinha é o apelido carinhoso da professora, pois, se não era costume designar as professoras dos primeiros anos por “tias”, este tratamento – apenas carinhoso, para alguns; reprovável, para outros – vigora no ambiente escolar há algumas décadas.

Esse “bilete” talvez não entre para a História do Brasil. Outros, porém, mais curtos, como os do presidente Jânio Quadros – personagem vulcânico de nossa vida política e o primeiro professor de português a ter chegado à presidência da República — ou um pouco mais longos, como certos despachos de ministros, já entraram.
Eles compõem histórias do Brasil duplamente lendárias. E no capítulo da censura há “biletes” hilários, como o despacho que em 1965 mandou prender o autor da peça Electra, que estreava no Teatro Municipal de São Paulo (SP). O autor, o grego Sófocles, morrera no Século V a.C.  Lenda, do Latim medieval legenda, designa o que deve ser lido, conhecido, como as atuais legendas de fotos e filmes. Em nossa história, antiga ou recente, a censura está repleta de lendas e de coisas que devem ser lidas.

Entre outros “biletes” famosos, um deles completa 43 anos. Num ato impulsivo, o ministro da Justiça do Governo de Ernesto Geisel proibiu um livro que se tornou o caso-síntese da luta, por parte de quem escreve ou publica, contra a censura.
O autor era um dos diretores da Light, é verdade este “bilete”, e está documentado. No dia 14 de dezembro de 1976, a mulher de uma autoridade recebeu de presente de uma amiga o livro Feliz Ano Novo, de Rubem Fonseca, então comercializado num envelope de plástico lacrado junto com um cartão de Boas Festas. Ela leu trechos do conto-título ao marido e este ligou para Armando Falcão, então ministro da Justiça. É o que reza a lenda.

No dia seguinte, 15/12/1976, o Diário Oficial da União publicava o seguinte despacho do ministro:Nos termos do parágrafo 8º do artigo 153 da Constituição Federal e artigo 3º do Decreto-Lei nº 1.077, de 26 de janeiro de 1970, proíbo a publicação e circulação, em todo o território nacional, do livro intitulado Feliz Ano Novo, de autoria de Rubem Fonseca, publicado pela Editora Artenova S. A., Rio de Janeiro, bem como determino a apreensão de todos os seus exemplares expostos à venda, por exteriorizarem matéria contrária à moral e aos bons costumes. Comunique-se ao DPF”.

Na semana passada, os ministros Dias Toffoli e Alexandre de Moraes, do STF, acrescentaram novas páginas a proibições deste tipo, mostrando, mais uma vez, e certamente não foram os últimos a fazê-lo, que a censura no Brasil é um tiro pela culatra, um ato execrável, predatório e inútil, que contraria os objetivos aos quais se propõe: proibir, calar, vetar, impedir, prejudicar.  A dupla de ministros proibiu as publicações da revista Crusoé e do site Antagonista retirando-os do ar. De novidades na truculência, somente a tecnologia e os neologismos sites que os hospedam.

A censura de vez em quando aparece, aqui e em outros lugares: os censores proibiram Gustav Flaubert, na França, na segunda metade do século XIX, levando o autor aos tribunais, ocasião em que o grande escritor, apavorado, recuou covardemente e disse que o propósito de seu romance Madame Bovary era moralizar e educar as moças. Nos EUA, um juiz com mais modéstia do que os dois ministros citados, solicitou parecer literário e liberou Ulisses, de James Joyce, na segunda metade do século XX.

Os dois magistrados do STF não consultaram os colegas e nas horas seguintes já sofriam pressões de todos os lados, incluindo a própria trincheira onde atuam para defender a Constituição. Celebremos que recuaram, mas eles têm que recuar mais e respeitar os limites da Constituição em vigor para evitar o triste recorde do ministro da Justiça, Armando Falcão, que, em apenas quatro anos, proibiu mais livros do que a Inquisição nos temos monárquicos e do que o famoso Index Librorum Proihibitorum (Índice dos Livros Proibidos) a Igreja Católica.

Rubem Fonseca recorreu à Justiça. O processo demorou 13 longos anos e, no segundo semestre de 1989, Feliz Ano Novo foi enfim liberado, mas em apertado placar de 2 x 1, no então Tribunal Federal de Recursos (TFR) que virou TRF depois da Constituição de 1988. Numerosas edições piratas já tinham sido feitas por todo o Brasil, talvez até mesmo pelo próprio editor.  Infelizmente, é verdade esse bilete. E felizmente é também verdade que dos 11 ministros a maioria deles não pensa em censurar a palavra escrita nesses tempos em que ela já está proibida pelo seu principal inimigo, o analfabetismo, que leva o Brasil a ser uma nação de mais de 200 milhões de habitantes, que tem 143 milhões de eleitores, nem todos leitores, dos quais a maioria não entende o que ministros do STF escrevem, mas entende o que escrevem os jornalistas em publicações como a Crusoé e o Antagonista, cujos diretores, os jornalistas Mario Sabino e Rodrigo Rangel, emitiram nota pública na quinta-feira passada agradecendo aos leitores a solidariedade durante os poucos dias que a revista e o site foram mantidos sob censura.

*Deonísio da Silva
Diretor do Instituto da Palavra & Professor
Titular Visitante da Universidade Estácio de Sá
http://portal.estacio.br/instituto-da-palavra


Blog do Augusto Nunes - Veja



domingo, 17 de fevereiro de 2019

A rebelião do andar de cima

Desde sua eleição, o governo foi confrontado por três movimentos corporativos. Cedeu em dois e é provável que a Procuradoria-Geral da República cederá no terceiro  

Bolsonaro não gosta de 'ativismo', mas recuou quando foi confrontado por servidores

Quem se encantou pela franquia Bolsonaro achando que se livraria das
bandeiras do corporativismo petista,   não sabia o tamanho do ativismo do andar de cima. O presidente anunciou que "vamos botar um ponto final em todos os ativismos do Brasil". Todos, não.  Desde sua eleição, o governo foi confrontado por três movimentos corporativos. Cedeu em dois e é provável que a Procuradoria-Geral da República cederá no terceiro. Em todos os casos mobilizaram-se servidores do andar de cima, gente com salários mensais que vão de R$ 20 mil a sabe-se lá quanto.

A primeira rebelião veio dos procuradores da Fazenda Nacional. Paulo Guedes queria colocar um diretor do BNDES na cadeira de procurador-geral. A corporação rebelou-se, avisando que centenas de procuradores abandonariam seus cargos em comissão, pois o procurador-geral deveria ser escolhido no quadro da instituição. Ganharam.

O segundo confronto deu-se com os auditores da Receita Federal. A Agência Nacional de Aviação queria que eles cumprissem a norma da revista ao entrarem em áreas restritas dos aeroportos. Os descontentes mostraram seu desagrado apurrinhando a vida de milhares de passageiros, obrigando-os a esperas de até quatro horas nas filas das alfândegas. Resolveram inspecionar todas as malas desses supostos contrabandistas. No dia seguinte, três ministérios foram acionados e o governo cedeu.

A terceira rebelião veio dos procuradores da República. Até a última terça-feira, 192 doutores devolveram 325 funções não remuneradas. Eles apresentam reivindicações técnicas, nas quais está embutida uma questão salarial, escondida nos penduricalhos de uma categoria que ganha, no barato, R$ 25 mil líquidos. Por trás dessa rebelião está o painel da sucessão da procuradora-geral, Raquel Dodge. A batalha ainda não terminou. Até hoje, magistrados e procuradores ganharam todas.
Ativismo do andar de cima é outra coisa.

Nos EUA mexe-se na 'Bosta Seca'
Oito em cada dez magistrados brasileiros querem importar o instituto saxônico do "plea bargain" sem que exista sequer tradução consolidada dessas palavras para o português. O ministro Sergio Moro fala em "solução negociada". Trata-se de aceitar que um réu reconheça sua culpa, negocie um acordo com o Ministério Público e obtenha alguma leniência do juiz.

Muito bonito na teoria, mas a prática será outra. O Brasil importou o mecanismo da delação premiada e criou o monstrinho da doutrina da "Bosta Seca". Em 2015, quando o doleiro Alberto Youssef disse numa audiência em Curitiba que um outro réu mentira em sua delação e ofereceu-se para uma acareação, um procurador disse que "esse é o tipo de coisa que quanto mais mexe, pior fica". Em seguida, ouviu-se: "É igual a bosta seca: mexeu, fede".

(...)

A privacidade de Moro
Em Brasília, o ministro Sergio Moro foi do noviciado ao folclore em menos de dois meses.
Quando lhe perguntaram se, dias antes da edição do decreto que facilitou a posse de armas, encontrou-se com hierarcas da indústria Taurus, deu a seguinte resposta:
"O direito à privacidade, no sentido estrito, conduz à pretensão do indivíduo de não ser foco de observação de terceiros, de não ter os seus assuntos, informações pessoais e características expostas a terceiros ou ao público em geral."

Madame Natasha intrigou-se com a vontade de Moro de ficar fora das vistas do "público em geral". Mandava melhor Armando Falcão, seu antecessor de 1974 a 1979, com o famoso bordão "nada a declarar".
Faltou sorte a Moro. Na mesma semana a Alta Corte do Reino Unido julgou o caso dos endinheirados proprietários de um prédio vizinho ao museu Tate, que reclamavam porque binóculos colocados no terraço devassavam suas casas. O juiz Anthony Mann mandou-os passear e sugeriu que fechassem as cortinas ou baixassem as persianas.

O limite de Guedes
Guedes pode muito, mas não deve mexer com o agronegócio sem combinar com a ministra da Agricultura, Tereza Cristina.
A lealdade do pessoal que sustenta a doutora tem uma solidez que não existe na turma do papelório.

Lula em casa
Cresceu a ala de comissários petistas interessados em sondar magistrados para saber como seria recebido um pedido da defesa para que ele fosse transferido para o regime de prisão domiciliar.

Elio Gaspari, jornalista - O Povo

 

sábado, 5 de maio de 2018

O sumiço do Ministério da Justiça

Criado no Império por Dom Pedro I, o Ministério da Justiça, esvaziado pela criação do Ministério da Segurança Pública, vive o momento de menor prestígio político de sua longa história 

Dois meses após ter sido criado, logo após a decretação da intervenção federal no Rio de Janeiro, o Ministério Extraordinário da Segurança Pública ainda não tem um teto para chamar de seu. O ministro Raul Jungmann despacha em uma espécie de puxadinho no 2º andar do Ministério da Justiça: duas salas onde ele e mais dez auxiliares se espremem. As secretárias de Jungmann e dos assessores ficam em duas salas de espera, feitas improvisadamente com divisórias de fórmica, no corredor que dá acesso ao “gabinete” do ministro. Os dez assessores continuam vinculados ao Ministério da Defesa, a antiga pasta de Jungmann, porque o Ministério da Segurança continua sem estrutura de pessoal. Para suprir a deficiência, o Ministério da Justiça prometeu ceder para Jungmann 20 cargos do Grupo-Direção e Assessoramento Superiores (DAS). Não são só cargos que sobram no Ministério da Justiça. Dois andares acima de Jungmann, o ministro da Justiça, Torquato Jardim, continua a despachar em seu gabinete amplo, espaçoso, mobiliado com móveis antigos, onde cumpre hoje uma rotina diária sem sobressaltos, mas também sem decisões estratégicas.

Segundo um auxiliar de Torquato, a maior dificuldade do ministro é agendar reuniões para preencher o tempo. Dos 30 dias do mês de abril, Torquato não deu expediente em pelo menos 15 — por motivo de viagem, falta de compromissos ou porque era fim de semana, que o ministro faz questão de preservar para seu descanso. Na segunda-feira 2 de abril, o único compromisso de Torquato foi participar da solenidade de posse dos colegas Gilberto Occhi (Saúde) e Valter Casimiro (Transportes). Dois dias depois, na quinta-feira 4 de abril, a agenda dele estava vazia. No dia seguinte, embarcou para o Rio de Janeiro, onde fez uma visita institucional ao Arquivo Nacional, seguida de uma reunião na Confederação Nacional do Comércio. O elegante Palácio da Justiça, projetado por Oscar Niemeyer para abrigar o Ministério da Justiça, tradicionalmente uma das pastas mais importantes do governo federal, está se transformando no mais vistoso elefante branco da Esplanada.

O Ministério da Justiça já vinha perdendo relevância nos últimos anos. Mas a decadência se acentuou depois que o presidente Michel Temer criou, em fevereiro, o Ministério Extraordinário da Segurança Pública. A nova pasta levou a Polícia Federal (PF), a Polícia Rodoviária Federal, a Secretaria Nacional de Segurança Pública e o Departamento Penitenciário Nacional (Depen), que eram a espinha dorsal do antigo ministério. A PF forma, com a Receita Federal e o Banco Central, a Santíssima Trindade dos órgãos do Estado que está na base do exercício do poder pelo Executivo federal. Da antiga estrutura, sobraram as secretarias de Justiça, do Consumidor, Antidrogas e a Fundação Nacional do Índio (Funai). São setores importantes, mas sem força no xadrez político.

Sem o departamento responsável pelos presídios, a Secretaria Nacional de Justiça ficou apenas com o Departamento de Recuperação de Ativos e Cooperação Jurídica Internacional (DRCI), que tem como tarefa apenas intermediar pedidos de investigadores em âmbito internacional. O DRCI não tem atribuição para interferir no curso de investigações criminais. A Secretaria do Consumidor é uma área técnica. A Secretaria Antidrogas está formalmente vinculada à Justiça. Mas até recentemente era área de influência do ex-ministro do Desenvolvimento Social Osmar Terra, que funcionava como um dique contra a onda de flexibilização das leis antidrogas, postura igualmente assumida por Torquato. A Funai tem uma dinâmica própria, em geral, à revelia do ministério. Os ministros têm dificuldades de impor uma política própria à fundação — e as questões indígenas costumam ser, para os titulares da Justiça, mais uma fonte de dor de cabeça do que de exercício de poder.

Enfraquecido, Torquato não conseguiu nem mesmo indicar nomes para a Funai e para a Secretaria do Consumidor. O novo presidente da Funai, Wallace Moreira Bastos, foi escolhido pela bancada ruralista no Congresso depois que ela derrubou o antigo ocupante do cargo. Bastos era subsecretário de Assuntos Administrativos do Ministério dos Transportes e não tem qualquer vínculo com a questão indígena. Numa segunda frente, o ministro tentou emplacar o advogado João Luiz Martins na Secretaria do Consumidor. Mas quem venceu a disputa pelo cargo foi Ana Lúcia Kenickel, afilhada política do deputado Celso Russomanno (PP-SP). Entre as duas sugestões, Temer optou pela de Russomanno. Torquato tem tido dificuldades até para resolver problemas menores, como, por exemplo, a comunicação social do ministério. O contrato com a empresa CDN, responsável pelo atendimento à imprensa em nome do ministério, venceu em dezembro. Como não houve licitação, a empresa terá de suspender os serviços no próximo mês. Segundo auxiliares, sem saber o que fazer, Torquato mandou abrir sindicância para apurar o que aconteceu, ou melhor, o que não aconteceu.

Torquato tomou posse no Ministério da Justiça em maio do ano passado, num momento em que o ex-procurador-geral da República Rodrigo Janot se preparava para fazer a primeira denúncia contra Temer. A denúncia teve como base o acordo de delação premiada dos executivos do grupo empresarial J&F, controlado pelos irmãos Joesley e Wesley Batista, e as investigações subsequentes da Polícia Federal. Mal esquentou a cadeira, o ministro criticou as investigações contra Temer e deixou claro que poderia trocar o diretor da Polícia Federal. Disse também que o conhecimento de segurança pública dele se resumia ao relato de uma tia vítima de um assalto. Foi a senha para que, semanas depois, Jungmann entrasse em cena para falar sobre combate à violência no Rio de Janeiro e sobre um plano de segurança pública para o país, até então seara exclusiva do titular da Justiça. Uma das primeiras reuniões entre ministros para tratar do assunto aconteceu no Ministério da Defesa.

Segundo relatos, um assessor perguntou a Torquato: “Ministro, esta reunião não deveria ser na Justiça?”. Torquato respondeu que, pela lógica, sim. Mas, como Jungmann tinha tomado a dianteira, não restava nada a fazer senão ir ao endereço indicado para a reunião. No começo deste ano, Temer decidiu formalizar a divisão de tarefas, empossando Jungmann no Ministério Extraordinário da Segurança. Escanteado, o ministro da Justiça perdeu até a escolta especial da Polícia Federal. Duas semanas depois da criação do Ministério da Segurança, Torquato foi informado de que os policiais federais passariam a responder pela segurança de Jungmann, o novo chefe da PF, e não pela dele. Acostumado com a proteção, o ministro teve de improvisar um esquema de segurança com a Polícia Rodoviária Federal, numa viagem a São Paulo, e com a Marinha, numa visita ao Rio. Pela lei, qualquer ministro pode requisitar proteção policial, mas, para isso, deve justificar o risco de circular desacompanhado.

Segundo interlocutores, a perda de espaço e de prestígio deixou Torquato contrariado apenas em parte. O ministro não gostou da desenvoltura de Jungmann, que chegou falando grosso (em questões de segurança pública) e logo se assenhorou do pedaço. Mas essa seria uma insatisfação de baixa intensidade. Sem maiores ambições, Torquato, de acordo com esses relatos, contentou-se com a ideia de ser uma espécie de “consultor jurídico” eventual de Temer. O presidente tem a sua disposição a Subchefia para Assuntos Jurídicos da Casa Civil. Conta também com renomados advogados criminalistas para fazer a defesa dele nos casos em que é investigado por corrupção e obstrução da Justiça. Jurista especializado em legislação eleitoral, Torquato é um reforço de luxo nesse jogo. “Para ele, o cargo de ministro já é suficiente”, disse um graduado servidor do ministério.

O Ministério da Justiça foi criado em 3 de julho de 1822, pelo imperador Dom Pedro I, com o nome de Secretaria de Estado dos Negócios da Justiça. De lá para cá se tornou uma área central da administração, não só do imperador, mas de todos os presidentes desde o nascimento da República. Pelo ministério, passaram personagens proeminentes como Ruy Barbosa, Oswaldo Aranha e Tancredo Neves. Na história recente, a pasta foi chefiada por Saulo Ramos, Paulo Brossard, Oscar Dias Corrêa, Nelson Jobim e Márcio Thomaz Bastos, personagens que tiveram papel fundamental na definição dos rumos políticos dos governos a que estavam vinculados e, por tabela, no destino do país. [Por uma questão de Justiça os nomes dos dois ministros mais importantes de toda a história do Ministério da Justiça: o ministro da Justiça mais importante e mais forte desde a criação daquele ministério foi ARMANDO FALCÃO, ministro durante o governo do presidente Ernesto Geisel; GAMA e SILVA pode ser considerado o segundo em importância e teve a honra de seu nome estar entre os signatários do Ato Institucional nº 5 - AI-5.] apesar de seu nome estar inscrito mais forte desde Reza a tradição que, pela importância, o ministro da Justiça deve ter cadeira cativa ao lado direito do presidente da República em reuniões ministeriais. O costume só foi rompido quando, no início do primeiro mandato do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o então chefe da Casa Civil, José Dirceu, exigiu o lugar, para demarcar poder.

O cargo de ministro da Justiça sempre foi cobiçado porque cabia ao titular da pasta duas tarefas nobres: a articulação política com o Congresso Nacional e, de quebra, a interlocução do governo federal com os tribunais. Ou seja, o ministro da Justiça podia discutir as grandes questões nacionais com o privilégio de, aparentemente, estar acima das disputas menores. Na virada do milênio, com a crescente onda de violência e a globalização do crime organizado, o governo federal passou a receber mais demandas nessa área. Em resposta, os governos dos ex-presidentes Fernando Henrique Cardoso e Lula lançaram programas de segurança pública, o que ampliou as atribuições e os poderes do ministério. No governo Lula, o Plano Nacional de Segurança Pública com Cidadania (Pronasci), ambicioso programa de segurança, foi lançado pelo ministro Tarso Genro.

A expansão do Ministério da Justiça esbarrou, no entanto, na decisão da ex-presidente Dilma Rousseff de não se intrometer no assunto. Para ela, a segurança pública era responsabilidade dos estados. Um limite estabelecido na Constituição. Com a mudança de rota, o Pronasci foi descartado na gestão de José Eduardo Cardozo no ministério. De lá para cá, nenhum outro plano de segurança saiu do papel. “Foi ali, na gestão de Cardozo, que o Ministério da Justiça começou a ser esvaziado”, disse um ex-ministro. Cardozo era um ministro forte. Mas, para alguns, limitou a atuação dele à defesa pública do governo Dilma. “O Cardozo teve papel importante, mas acabou atuando mais como advogado da ex-presidente Dilma no processo de impeachment”, disse o diretor-presidente do Fórum Nacional de Segurança Pública, Renato Sérgio Lima.

O ex-ministro Tarso Genro reclamou do fim do Pronasci ainda na gestão Dilma. Mas, para ele, a fragilização do Ministério da Justiça seria apenas o reflexo do que ele vê como falta de legitimidade do governo Temer. “Governos ilegítimos não desenvolvem políticas de Estado, mas políticas imediatistas que se limitam a tentar legitimar-se e sobreviver. O Ministério da Justiça está esvaziado porque deixou de ser, na prática, um ministério de Estado e se tornou, em seu sentido decadente, um ministério político de governo”, afirmou Genro a ÉPOCA.  O ministro Torquato Jardim iria receber ÉPOCA para entrevista na tarde da quarta-feira 2 de maio. Cancelou a entrevista, segundo sua assessoria, depois de ter sido chamado pelo presidente Temer para acompanhar encontro com representantes do governo do Suriname em visita a Brasília.

Época

 

 

quarta-feira, 8 de junho de 2016

O circo pegou fogo

A Lava-Jato desmantelou o PT, continuou sua marcha e chegou ao braço tradicional e onipotente da oligarquia

A Lava-Jato corroeu a presidência petista de Dilma Rousseff, está perto de chegar em Lula, botou na cadeia José Dirceu e João Vaccari, ex-presidente e ex-tesoureiro do PT. Com o pedido de prisão para José Sarney, Renan Calheiros, Eduardo Cunha e Romero Jucá, o procurador-geral Rodrigo Janot levou a faxina para os salões do PMDB. 

Desde 2014, quando a operação começou, a oligarquia nacional cultiva a fantasia de que ela seria paralisada por poderosos interesses. Enganou-se em todos os casos. Ela não chegaria à Odebrecht. Chegou. Não prenderia o doutor Marcelo. Prendeu. Ele não falaria. Falou. O impensável aconteceu e continuará acontecendo porque as forças poderosas tornaram-se impotentes.

Em 1996, Sérgio Moro tinha 24 anos, formara-se em Direito pela Universidade Estadual de Maringá e foi aprovado num concurso para juiz federal. No Banco Central trabalhava o advogado Teori Zavascki. Havia sido aprovado num concurso para juiz, mas preferira continuar por algum tempo no BC. 

Em março daquele ano, no meio de uma crise provocada pela quebra do Banco Econômico e da ameaça de instalação de uma CPI, o presidente Fernando Henrique Cardoso registrou em seu diário: “O Ângelo Calmon de Sá [dono do Econômico] teria dito que na CPI diria tudo o que sabe sobre o PFL [atual DEM] no Nordeste, veja o clima que se está criando. Esta gente está brincando com fogo.”
(Uma pasta rosa encontrada no gabinete de Calmon de Sá expusera a contabilidade secreta das doações de bancos a candidatos. Sem lê-la direito, um poderoso hierarca do Banco Central vazou seletivamente parte de seu conteúdo. Deu-se mal.)

Na mesma época aconteceu um telefonema do governador de São Paulo, Luiz Antonio Fleury, sempre girando em torno da CPI, e FHC registrou:  “Haverá os dossiês que existem no Banco Central sobre deputados e senadores, eles vão aparecer, haverá uma lavagem de roupa suja, isso vai pôr fogo no circo”. 

O circo reaparece na narrativa do FHC um ano depois: “O Maluf telefonou para ele [o ministro da Articulação Política, Luiz Carlos Santos] para dizer que, se essa coisa da CPI dos Precatórios for adiante, ele vai botar fogo no circo; vai ver o negócio de financiamento de campanha, que ele sabe como são os financiamentos, que ele não vai morrer sozinho.” 

Para alegria dos palhaços que pagavam as festas de Ângelo Calmon, Fleury e Maluf, o circo está pegando fogo. Sérgio Moro e Teori Zavascki não são piromaníacos. Apenas pediram à oligarquia que mostrasse suas cartas, expuseram o blefe do andar de cima e acabaram com a mágica.

Sérgio Machado chegou aos cofres da Transpetro no consulado petista, mas sua militância vem do PMDB e do PSDB. Seu pai, o cearense Expedito Machado, foi ministro da Viação de João Goulart, exilou-se e foi um dos primeiros a retornar ao Brasil. Ao pé da escada do avião que o trouxe ao Rio, recebeu a escolta do seu conterrâneo Armando Falcão, poderosa vivandeira do novo regime. Passou pela polícia sem ser incomodado.
A teoria do circo pegando fogo é recorrente nas conversas grampeadas por Machado. Essa circunstância (o grampo) deveria inibir os movimentos dos poderosos da nova ordem. A colheita no vinhedo petista continua, mas agora a Lava-Jato chegou às velhas videiras francesas.

Fonte: O Globo - Elio Gaspari,  jornalista