Blog Prontidão Total NO TWITTER

Blog Prontidão Total NO  TWITTER
SIGA-NOS NO TWITTER
Mostrando postagens com marcador Armínio Fraga. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador Armínio Fraga. Mostrar todas as postagens

sábado, 13 de fevereiro de 2021

Vacina, auxílio, reforma e privatização - Carlos Alberto Sardenberg

 Coluna publicada em O Globo - Economia 13 de fevereiro de 2021

Outra coisa que aproxima esquerda e direita no Brasil:  a bronca com o mercado. E a ignorância a respeito dessa obscura entidade, motivo de contradições dos dois lados. O vice-presidente Hamilton Mourão, ao justificar a concessão de um novo auxílio emergencial, comentou: “Não podemos ficar escravos do mercado”.

Ora, não é difícil encontrar entre economistas e investidoresmembros do tal mercadoquem defenda fortemente o auxílio. Inclusive por razões econômicas. O auxílio coloca renda na mão das famílias, o que vai movimentar comércio e serviços, como se verificou no ano passado.  A ressalva do chamado mercado está na demanda por uma política pública organizada e permanente – e não um quebra-galho populista.

É grande a diferença. Uma política bem pensada define com clareza os beneficiários do programa, mede sua eficácia e, sobretudo, define as fontes de financiamento, respeitando o controle das contas públicas. O quebra-galho, esse exigido pelo Centrão e pelo presidente Bolsonaro, é um arranjo de momento para fins eleitoreiros.[ou uma forma de impedir a ação dos adeptos do quanto pior, melhor = inimigos do Brasil = inimigos do presidente Bolsonaro, que buscam apenas impedir que o presidente governe. Para eles o povo é apenas um detalhe incômodo.] Simplesmente aumenta o gasto, sem cortar nada em troca. E não dá horizonte aos mais pobres, por ser provisório.

Mais interessante ainda é que o Centrão pede o auxilio dizendo que já atendeu o mercado com a lei da autonomia do Banco Central. Sim, economistas e investidores gostam da independência do BC. Quer dizer que nisso o governo é escravo do mercado? Sim, é a resposta, mas não do Mourão, e sim de Fernando Haddad. Para ele e toda a esquerda, a autonomia significa entregar o BC ao mercado e, pior, aos banqueiros.

Trata-se de equívoco e contradição, pelo outro lado. Ao passado: quando FHC nomeou Armínio Fraga, então gestor dos fundos de George Soros, para a presidência do BC, o PT disse que era a raposa tomando conta do galinheiro. Aí, Lula se elege presidente e quem coloca no BC? Henrique Meirelles, ex-presidente mundial do Bank of Boston. Ou seja, um chefe das raposas.

Meirelles, que havia recebido promessa de independência de Lula, cumprida, ficou no BC durante os oito anos do governo petista e fez um bom trabalho. A pobreza do debate político-econômico é causa dos nossos atrasos. No mundo, todos os BCs independentes são mais eficientes, ou seja, entregam estabilidade e condições de crescimento.

Políticas públicas de apoio aos mais pobres estão incorporadas às mais variadas doutrinas econômicas há muito tempo. Bolsa Família, por exemplo, é uma ideia surgida nos quadros do Banco Mundial. Ali se chegou à conclusão de que distribuir comida e bens aos mais pobres era simplesmente ineficiente.

Órgãos governamentais gastavam a maior parte do dinheiro em burocracia e no processo de distribuição, sem contar a corrupção. Ora, por que não entregar o dinheiro direto na mão das famílias? Com uma condição: que colocassem os filhos na escola e mantivessem em dia a carteirinha do posto de saúde. Teoria: com o dinheiro, as famílias não precisavam colocar as crianças para trabalhar; estudando, as crianças tinham a chance de escapar da pobreza.

Foi introduzido no Brasil pelo prefeito tucano Magalhães Teixeira, de Campinas, em 1994. Depois, em Brasília pelo então governador Cristóvão Buarque. E virou Bolsa Escola no governo FHC. É simplesmente um bom programa social, que não pode ser chamado de esquerda ou direita. Assim, como não há BC de direita ou de esquerda. Há os que controlam e os que não controlam a inflação. Tudo considerado, o Brasil precisa de vacina/programas sociais, por óbvio, de reformas, porque o setor público não cabe no nosso PIB, e privatizações, porque os governos não têm dinheiro para investir.

Sim, o mercado gosta disso. Nós também.

Carlos Alberto Sardenberg, jornalista


sexta-feira, 27 de novembro de 2020

Como resolver os obstáculos que dificultam o crescimento da economia

Os sinais para o país decolar surgem no horizonte, mas, para que isso aconteça, o governo e o Congresso precisam se livrar de entraves pelo caminho

Certos momentos podem definir o futuro de uma nação. Nas próximas semanas, uma leva de dados oficiais colocará em números a dimensão da recuperação econômica do Brasil, uma vez passada a fase mais dramática da pandemia de Covid-19, concentrada no segundo trimestre de 2020. Os sinais de que o pior ficou para trás despontam em diversos indicadores de setores como construção, vendas no varejo e produção industrial, além da confiança empresarial, mais robusta. 

 

As incertezas globais também foram atenuadas. A eleição [ainda não confirmada] do democrata Joe Biden nos Estados Unidos, depois de uma tensa corrida eleitoral, retirou um ponto de pressão de mercados de todo o mundo. E os testes acima de 90% de eficácia em diversas vacinas trazem mais esperanças de um mundo imunizado contra o coronavírus e mais próximo do “velho” normal. Por aqui, o Brasil tem se beneficiado da melhora de preços de diversas commodities — da recuperação no preços do petróleo, passando por produtos agrícolas que estão próximo da máxima histórica, como a soja, e o minério de ferro, que se valorizou por volta de 30% no ano. Em razão disso, a bolsa de valores retomou o seu maior patamar desde fevereiro, com o investidor estrangeiro de volta ao país. Até o último dia 20, o saldo de entradas internacionais no mercado de capitais brasileiro já superava 26 bilhões de reais, o que já fez de novembro o melhor mês da história. Tais variáveis combinadas apontam para um ciclo promissor pela frente.

 

 A grande questão que agora se impõe, portanto, não é mais ressuscitar uma economia abalroada pela crise sanitária, mas sim garantir que o reaquecimento da atividade seja consistente em 2021, aproveitando uma janela de oportunidade que o mundo deve proporcionar nos próximos meses. Com um fluxo de capitais menos intimidado pela pandemia, o Brasil terá novamente a chance e engrenar um crescimento duradouro e iniciar um momento positivo para o bem-estar da população. O momento é perfeito. As eleições municipais terminam neste fim de semana e a atividade parlamentar será retomada. Está na hora de um esforço conjunto entre o governo e o Congresso para a realização de reformas estruturantes que melhorem o ambiente de negócios, tragam prosperidade e mitiguem as desigualdades sociais. Não são medidas fáceis, exigem amplo entendimento e ação, mas tornam-se factíveis à medida que haja uma convergência entre os poderes. O risco é o país deixar de aproveitar esse cenário, optando por medidas motivadas por interesses eleitoreiros, que podem nos levar à beira de um colapso. “Nos últimos quarenta anos, alternamos momentos muito bons e muito ruins, mas o resultado final foi modesto, quase medíocre”, diz o ex-presidente do Banco Central (BC) Armínio Fraga. “O que deveria ser uma locomotiva de crescimento ficou parado em diversas barreiras. E o país ainda está repleto de entraves”.

(..............) 

“Respeitar o teto é importante porque nos permite atrair investimentos e criar empregos.”

Michel Temer

 

Os entraves para o crescimento do Brasil são conhecidos e desafiadores. De uma certa forma, eles se encaixam com precisão em um conceito criado pela pesquisadora americana Michele Wucker, especialista em análises econômicas da América Latina. Em 2016, ela se valeu da imagem dos rinocerontes cinza, paquidermes africanos bastante comuns nos safáris fotográficos, para representar um padrão falho na gestão pública da região. Sempre presentes no cenário, eles costumam ser negligenciados até que, por motivos banais, se tornam agressivos e partem para o ataque. “São como problemas imensos, que as pessoas acham que sempre vão estar por ali, inofensivos, mas que, quando saem de controle, se transformam em ameaças devastadoras”, diz ela. A questão central, na teoria de Wucker, é se antecipar e resolver o problema antes que seja tarde demais. O plano de voo para a economia decolar, deixar esses rinocerontes para trás e atingir velocidade de cruzeiro já existe. Cabe ao governo e ao Congresso se empenhar para colocá-lo em prática. E logo.
 
Publicado em VEJA,  edição nº 2715, de 2 de dezembro de 2020
 
Em Economia - VEJA -  MATÉRIA COMPLETA

sexta-feira, 24 de julho de 2020

Os caminhos na tempestade - Fernando Gabeira

Em Blog

O foco de nossas discussões hoje no Brasil tem sido o governo: atacar ou defender o que está aí, arranjos para derrubar ou manter Bolsonaro de pé. No entanto, há uma crise de grandes proporções no horizonte. Não importa quem estiver em Brasília, enfrentará um enorme desafio para simultaneamente amparar os mais vulneráveis e fazer o País andar.

sábado, 21 de março de 2020

O PIB desaba e o governo erra - Míriam Leitão

O Globo - Alvaro Gribel e Marcelo Loureiro 

Governo reduziu o crescimento para zero, mas está atrasado. O país terá PIB negativo e a recessão será menor, a depender da rapidez do governo

Apenas nove dias depois de ter revisto o crescimento do PIB para 2,1%, o Ministério da Economia fez nova revisão para zero. Isso mostra a rapidez dos acontecimentos e a lentidão das projeções do próprio governo. O número 0,02%, desenhado assim para não entrar no negativo, será sem dúvida revisto novamente. O país está entrando em recessão e o ano de 2020 terminará com o encolhimento do PIB. A torcida é para que haja capacidade de mitigar a queda.

Essa revisão para 0,02% significa que pelo menos R$ 70 bilhões de receita não entrarão nos cofres públicos. Ao mesmo tempo o Tesouro precisará gastar muito mais, num valor que ainda não foi quantificado. Mas se, por hipótese, numa projeção otimista, ele tiver uma despesa extra de 1% do PIB para enfrentar a crise, o déficit que estava previsto em R$ 124 bilhões vai superar R$ 260 bilhões. O mais urgente agora é evitar o colapso do sistema de saúde, e proteger todo um vasto contingente de brasileiros que está ficando sem capacidade de geração de renda.

[Lembrando o ululante: 
A previsão de um déficit de R$ 124.000.000.000,00 era sem o coronavírus.
Agora, com o coronavírus, é natural e inevitável que o déficit aumente - atualmente está estimado em 200 bilhões de reais, sendo possível elevação, que depende da demora na normalização.
A maioria dos economistas preveem  um custo global superior a US$ 3.000.000.000,00 - assim uma queda da receita da ordem de R$ 70 bilhões, está dentro do razoável.
A magnitude da crise é de tal ordem que não se descarta a queda no desenvolvimento do carro elétrico, devido à possibilidade do barril de petróleo não ultrapassar os US$ 35.
Com ou sem Bolsonaro, a queda do PIB, por efeito coronavírus, é inevitável.
A queda ocorrerá ele chamando o coronavírus de gripezinha ou gripona, e considerando uma possível mudança na prioridade do preservação do meio ambiente de efeito coronavírus, efeito pirralha ou fedelha.

O presidente Bolsonaro continuou errando ontem. No mundo os governos tomam medidas cada vez mais duras e ele usou ontem a palavra “gripezinha” para definir o coronavírus e de novo brigou com governadores. Não faz sentido que numa crise deste tamanho o presidente da República se preocupe com picuinhas ou entre em competição com os líderes dos entes subnacionais, que tenham que escrever cartas ao presidente. Bolsonaro deveria estar liderando, deveria estar desobstruindo os canais de diálogo, deveria ter entendido o que o mundo inteiro está dizendo: estamos diante de uma crise sem precedentes.

Se já não bastassem os problemas que não resolve, ainda há os que a família do presidente cria, como esta extemporânea crise com a China inventada pelo deputado Eduardo Bolsonaro, pela incontinência verbal que todos eles têm na rede social. A China é destino de R$ 65 bilhões das nossas exportações, é origem de R$ 35 bilhões de importações, é o país com quem o Ministério da Saúde estava negociando o fornecimento de equipamentos médicos e hospitalares fundamentais nesse momento. E o ministro das Relações Exteriores ainda ecoou o deputado para deixar mais uma vez clara a subserviência do outrora competente Itamaraty a um parlamentar sem a qualificação mínima para a diplomacia.

No mercado financeiro, todos os bancos e as consultorias estão nesse momento revendo seus modelos e divulgando números cada vez mais negativos. Ontem, o Itaú fez uma forte revisão do cenário. A projeção de crescimento saiu de 1,8% para uma queda de 0,7%. Mas com raras exceções, o mercado subestimou a crise. O Bradesco no dia 10 divulgou uma projeção para o PIB de 2%. Oito dias depois, disse que talvez fosse menor. Mas não tem novo número. O Itaú está prevendo uma recuperação rápida no ano que vem. Ele revisou a projeção de 2021 de 3,3% para 5,5%, num cenário de que a crise seria forte, mas passageira.

O economista Márcio Garcia prefere fugir dos números e dizer uma frase, numa entrevista à coluna, que define melhor esse momento do que os modelos dos bancos. Se alguém souber o que está acontecendo ou é desinformado ou está delirando.

Na entrevista que me concedeu, Armínio Fraga foi taxativo em falar, antes que o governo admitisse pedir isso, que deveria ser utilizada a possibilidade da Lei de Responsabilidade Fiscal de decretar estado de calamidade. Em conversa esta semana com a economista Monica de Bolle, do Peterson Institute, ela me disse que a recessão está dada, e que agora é necessário evitar a depressão. Na entrevista que concedeu ao “Valor”, o economista Ricardo Paes de Barros disse o seguinte: “esquece o teto de gastos, numa crise como essa, o teto é uma piada”. Em outra parte de sua excelente entrevista a Bruno Villas Bôas, ele avisou: “não podemos pensar que essa é uma pequena crise que vai passar rápido. Em certo sentido é como se estivéssemos entrando em uma grande guerra”.

Como a curva do crescimento dos infectados pelo coronavírus, a da crise econômica pode ser atenuada dependendo da rapidez da resposta. [o que torna qualquer prognóstico, contra ou a favor, antes do término da crise,precipitado.] E não basta uma live com a Fiesp. A qualidade da resposta depende da compreensão da gravidade do problema. O mais assustador é que os cadastros do governo não têm registro de todas as famílias que precisarão do socorro do Estado.

Blog da Míriam Leitão, jornalista - O Globo



quarta-feira, 18 de março de 2020

Governo estuda como criar uma rede de proteção aos informais - Míriam Leitão

Não haverá mudança no teto de gastos para socorrer a economia. Isso não é necessário, por ora, me disse um integrante da equipe econômica. O déficit vai aumentar, pelo menos em R$ 60 bilhões. Esse é o número com o qual o governo trabalha, mas ele pode crescer. O decreto de calamidade vai aumentar os gastos com saúde e em socorro à economia. Uma vertente será para socorrer o pobre que está fora do cadastro do Bolsa Família. 
Um exemplo: o vendedor ambulante que ia para o Centro do Rio e agora não pode mais. Ele está fora do programa, gerava a sua própria renda, e agora a sua renda vai sumir. O que vai acontecer com ele? 
A diarista, também? O governo ainda não sabe, mas estuda como fazer uma rede de proteção aos informais.

Há empresas que vão ter um colapso na sua receita. A começar pelo setor aéreo, que já tem um pacote quase pronto. Há muita demanda por aumento de gastos públicos, e o governo tenta separar o que é o problema da crise de agora, e o que já era problema anterior. É preciso proteger a vida humana, mas também a economia. O governo terá que ter recursos para as duas coisas.

O ex-presidente do Banco Central Armínio Fraga me disse na segunda-feira que era hora de acionar os mecanismos que já estão nas leis, como o A Lei de Responsabilidade Fiscal e o Teto de Gastos, porque todas elas têm recomendações para o que fazer em momentos de calamidade. Então é isso que o governo está fazendo agora. Até os economistas preocupados com as contas públicas sabem que esse é um momento diferente, por conta do coronavírus.

O governo quer ter bom diálogo com o Congresso para conseguir avançar com esses projetos em tempos de emergência. A área técnica quer construir pontes, embora o presidente Jair Bolsonaro a todo momento agrave a crise política. [Não é possível se aceitar que o Congresso para complicar o êxito do governo Bolsonaro, prejudique milhões de brasileiros, rejeitando ou retardando a aprovação da legislação necessária para transformar a ameaça de um CAOS CAÓTICO em um CAOS temporário - não foi o presidente Bolsonaro quem criou o coronavírus.]


Míriam Leitão, jornalista - O Globo




quarta-feira, 4 de setembro de 2019

Bolsonaro atira no centro - O Estado de S.Paulo

Vera Magalhães

Para repetir polarização nos extremos com o PT, presidente fustiga Doria e Huck

O sonho de consumo não escondido por Jair Bolsonaro e seu QG é uma reeleição em 2022 nos mesmos moldes da de 2018, anabolizada, se tudo correr bem, por uma economia crescendo num ritmo entre 2,5% a 3% nos dois últimos anos de governo. E o que significa repetir o roteiro do ano passado? Manter a militância engajada nas redes sociais, avançar com as pautas caras ao bolsonarismo e, melhor dos mundos, disputar de novo contra o PT.

Há algumas incertezas quanto à possibilidade de se cumprir o script. A performance da economia é a maior delas: não são poucos os economistas que avaliam que, mesmo com o correto receituário de reformas, desestatização e desburocratização sendo colocado em prática, pode faltar tempo para que a economia (e, principalmente, o emprego) volte a girar num ritmo capaz de dar à população a sensação de que a vida melhorou significativamente sob Bolsonaro – condição importante para que haja a disposição de eleger um presidente.

Outra dificuldade para que o plano corra conforme o desenhado é que a polarização nos extremos canse a maioria do eleitorado e ele busque uma opção no centro – compreendido como o espectro que vai da centro-direita à centro-esquerda. Isso claramente incomoda o bolsonarismo, que tem dedicado as últimas semanas a fustigar eventuais opositores nesse campo. Luciano Huck e João Doria Jr.apareceram na lista dos compradores de jatinhos subsidiados por um programa do BNDES na era petista. A ideia parece ser matar adversários no nascedouro, sem sutileza nem intenção de disfarçar os propósitos. [há uma certeza: não Bolsoanro quem comprou os jatinhos com juros subsidiados com o nosso dinheiro, ou os comprou e colocou no nome dos dois;
ou será que até denunciar condutas não republicanas é proibido ao nosso presidente Jair Bolsonaro?]

Doria desponta aí como a vítima mais óbvia: governador do maior Estado do País, é quem detém maior estrutura partidária, um espaço de atuação que permite comparação com a de Bolsonaro e aval de setores do empresariado. Ciente de que é alvo, o governador tem evitado bater boca com o presidente, que usou até uma das recentes lives nas suas redes sociais para atacá-lo, mas escorrega em algumas cascas de banana que Bolsonaro joga no seu caminho, ao tentar associá-lo a pautas da esquerda.

Ao responder sobre o jatinho, em vez de responder que não cometeu nenhuma ilegalidade e usou uma linha de crédito existente, tratou de dizer que quer “distância” do PT, de Lula e de Dilma. Vestiu a carapuça.

Ontem, mandou suspender um material de ciências que falava sobre questões como sexo biológico, identidade de gênero e orientação sexual para alunos do 8.º ano da rede pública (13-14 anos), dizendo que seu governo não admite “apologia” à “ideologia de gênero”, expressão esta sim eivada de ideologia, usada pela direita sem amparo científico.[Doria erra, mas, também acerta.
As medidas citadas são adequadas e necessárias.]

Reencarna nesses momentos o Bolsodoria, personagem que inventou no segundo turno de 2018, quando passou apuros para vencer Márcio França. Uma vez eleito, no entanto, vinha batendo na tecla de que é de centro, não de centro-direita. Se insistir em replicar o léxico e as pautas da direita quando provocado por Bolsonaro, corre o risco de o eleitorado dizer que, entre o original e o genérico, fica com o primeiro. Ainda mais se o centro repetir o erro de se dividir em várias candidaturas. Huck, que fugiu da raia em 2018, parece mais empenhado agora. Se cercou de nomes como o ex-presidente do Banco Central Armínio Fraga e o ex-governador do Espírito Santo Paulo Hartung e parece mais focado que Doria em lançar já de saída uma pauta social robusta, capaz de falar aos corações do eleitorado do Nordeste e de mais baixa renda, e de defesa da ciência, da cultura e da educação, para resgatar certa classe média “iluminista” chocada com a truculência bolsonarista nessas áreas. 

Resta saber se tem couro grosso o bastante para o chumbo grosso que vai começar a levar, desde já.
 
Vera Magalhães - O Estado de S. Paulo
 
 

sábado, 29 de junho de 2019

Real, moeda brasileira mais durável desde o Estado Novo, completa 25 anos em 1º de julho

Pais do Real apontam fragilidade do atual momento da economia brasileira 

Persio Arida: “O real criou a base do país moderno”

Na segunda-feira, dia 1º de julho, a moeda brasileira, o Real, completa 25 anos em circulação. Será o padrão monetário brasileiro mais duradouro desde o Estado Novo. Não é feito pequeno para um país que teve nove moedas no período. 

O economista Persio Arida, ex-presidente do BNDES e do Banco Central, disse que a maior derrota do Plano Real foi perder a batalha da reforma da Previdência. Se aprovada, ela teria mudado drasticamente a história econômica do país. Já como um programa de estabilização inflacionária, avaliou que foi foi extraordinariamente bem-sucedido.
 
“O real criou as bases econômicas do Brasil moderno”, disse Pérsio Arida. O Real trouxe organização econômica para o país. Baixou de fato a inflação, mas a estabilização não foi suficiente para deslanchar o crescimento. 

Os criadores do Real avaliam agora os desafios da economia brasileira. Para Edmar Bacha, o país “ainda precisa fazer o dever de casa do ajuste fiscal”. Pedro Malan concorda e adverte: “Os gastos sobem em velocidade insustentável.” Gustavo Franco analisa: “Temos medo de confrontar interesses”. Armínio Fraga acredita que a reforma da previdência será parcial. “Uma vez aprovada uma reforma da Previdência que vai gerar um resultado que seria a metade do necessário, e o que é necessário já não era suficiente, vamos ver o que vai ser feito daqui para a frente.”


Leia mais em Época:
O ENTERRO DO DRAGÃO
Nos 25 anos do real, o que falta para o país voltar a se desenvolver


quarta-feira, 17 de abril de 2019

E se Guedes pegar fogo?


Se o ‘Posto Ipiranga’ fechar, todo mundo perde, mas a questão é saber como será possível mantê-lo aberto

Todos os adultos que ouviam Jair Bolsonaro dizer que não entendia de economia, mas tinha à mão o seu “Posto Ipiranga”, sabiam que isso era apenas uma frase engraçadinha. Alguns endinheirados, julgando-se mais espertos que os outros, viam nela uma promessa de abdicação. O capitão seria eleito, mas Paulo Guedes comandaria a economia. Fariam melhor se acreditassem em Papai Noel. Nos últimos 60 anos o Brasil teve doze presidentes e esse comando só foi delegado por três deles: Itamar Franco com FHC, Emílio Médici com Delfim Netto, e Castello Branco com a dupla Octavio Bulhões-Roberto Campos. Bolsonaro não tem a astúcia de Itamar, a disciplina de Médici nem o rigor de Castello. Para preservar o “Posto Ipiranga” precisará de astúcia, disciplina e rigor.

Quando o presidente meteu o sabre na política de preços da Petrobras, mostrou que precisa entender de administração. O estrago estava feito, e o caminhoneiro “Chorão” prevaleceu, ainda que momentaneamente. Prenuncia-se encrenca muito, muito maior: o incêndio do “Posto Ipiranga”. Cem dias de governo mostraram que a habilidade política de Paulo Guedes é mínima e, ainda assim, ele é obrigado a carregar as encrencas geradas pelo Planalto. Tudo isso com 13 milhões de desempregados e a economia andando de lado.

Se o “Posto Ipiranga” pegar fogo, por acidente ou autocombustão, a conta irá para todo o Brasil, para pessoas como as que procuram trabalho na fila do Vale do Anhangabaú. Guedes atravessará a lombada do preço do diesel, mas o seu cristal trincou. Desde a campanha eleitoral ele vinha repetindo uma palestra sobre macroeconomia. Desde o desastroso episódio da semana passada, o problema passará a ser de microgestão para prevenir o incêndio.

Guedes, ou qualquer outro ministro, não poderá carregar sozinho o piano da reforma da Previdência. Desde que ele atirou nas contas do Sistema S tem a má vontade do corporativismo empresarial. Isso para não mencionar os pleitos desatendidos na Fazenda que correm para outros ministérios ou mesmo para o palácio. A preservação de Paulo Guedes não poderá depender só dele. Com a quantidade de poderes que lhe foram atribuídos por Bolsonaro, competirá ao presidente impedir que apareçam novas lombadas. É isso ou é melhor que se comece a pensar num substituto, Armínio Fraga? Falta combinar com ele.

Em 1979 o economista Mário Henrique Simonsen aceitou o que supunha ser o comando da economia. Aguentou seis meses num ministério onde estavam as poderosas figuras de Delfim Netto (Agricultura) e Mário Andreazza (Interior). Simonsen foi professor e amigo de Guedes e ensinou-o desprezar a pompa do poder. Ele sabia que aceitou uma aposta e posteriormente arrependeu-se de tê-la feito. Durante seu ocaso, o presidente tinha a bala de Delfim Netto na agulha, pronto para assumir a economia. O professor largou o piano, chamou o caminhão da mudança e foi para a Praia do Leblon.

Guedes e Bolsonaro têm sobre suas cabeças a nuvem de uma cena ocorrida no gabinete onde hoje trabalha o capitão. O presidente João Figueiredo recebeu o professor sabendo que a conversa seria uma despedida. Era um general direto, desbocado.

—Mário, você acha que meu governo está uma merda, não?

—Presidente, eu estou indo embora — respondeu Simonsen.


O aspecto pitoresco desse diálogo tornou-se um irrelevante asterisco diante do tamanho da crise que já havia começado e caminhava para um catastrófico agravamento. Vieram o segundo choque do preço do petróleo e o colapso da dívida externa brasileira. Quem perdeu foi o Brasil.


Elio Gaspari - O Globo
 

domingo, 29 de outubro de 2017

Sociedade em movimento

Excesso de ceticismo faz o jogo de filhos e viúvos do imobilismo


“VEJAM, não há povo nas ruas”,
apontam com um quê de alívio aqueles avessos a mudanças que lhes possam alterar as rotinas de desfaçatez. “Por que não há povo nas ruas?”, perguntam-se os inconformados com o atual clima de apatia em tudo destoante da ebulição que permeou o país de 2013 a 2016 e arrefeceu após o impeachment de Dilma Rousseff, não obstante o ambiente na política continuar indo de mal a pior.

Sim, não há povo nas ruas, mas nem só de passeatas e panelaços vivem as insatisfações sociais. Nem só nas manifestações estrondosas e volumosas são gestadas as transformações. Nem tudo é quantidade e/ou estridência. Valorosos também são os conceitos, os propósitos, a consistência das ações e a persistência dos agentes dos atos. No caso, os cidadãos de cuja percepção não parece fugir a evidência de que há a hora de gritar e a hora de providenciar uma solução com a cabeça bem equilibrada no pescoço e os pés firmes no chão.

Tudo isso dito para chamar atenção sobre os vários grupos de diversos matizes ideológicos que estão surgindo sob a bandeira da reformulação da política, notadamente a partir da arregimentação de gente nova interessada numa atividade hoje de difícil (se não impossível) acesso ao brasileiro comum. Aquele que não tem dinheiro, não é herdeiro político, não dispõe de fama nem do apoio de estruturas corporativas ou religiosas, mas tem vocação e disposição para o exercício da função pública em cargos eletivos.

Já há mais de dez grupos desses em início de funcionamento, integrados por empresários, estudantes, profissionais liberais, acadêmicos, funcionários públicos, em geral jovens e anônimos, embora alguns tenham o apoio de gente bem conhecida como Armínio Fraga, Luciano Huck, Eduardo Mufarej, Nizan Guanaes, Carlos Jereissati Filho, Guilherme Leal, entre outros. [nesse grupo onde cabe Luciano Huck, cabe também Danilo Gentili, Alexandre Frota e outros do mesmo naipe.] Ainda que o objetivo seja o mesmo, variam os métodos: da concessão de bolsas de estudos para a formação de lideranças ao debate de uma nova agenda para a política, aqui incluída a revisão dos meios e modos do ofício.

Iniciativas louváveis, pois não? Pois é. Antes mesmo que comprovem ou não eficácia nos procedimentos e lisura de propósitos, esses movimentos têm sido alvo de descrença, quando não de desqualificação, por parte dos ativistas de internet cuja ignorância no ramo não lhes permite distinguir engajamento político de ceticismo à deriva, para não dizer boboca. Gente que considera que a suspeição é geral e irrestrita e que tudo e todos se movem por intenções espúrias. Na visão desse pessoal, há sempre algo “por trás”, ainda que não identificado, e muito menos nominado.

Essas pessoas presumem sempre o pior, plantam sementes nas sombras, enxergam fantasmas ao meio-dia. Atuam no terreno do preconceito e, com isso, alimentam o ceticismo excessivo que veste como luva o figurino dos adoradores (aproveitadores, por que não?) do imobilismo do Congresso e da aversão ao avanço patrocinado pelo establishment partidário, situação contra a qual finalmente algo se move na sociedade.
 
Fonte:  Dora Kramer - Revista VEJA


quinta-feira, 30 de março de 2017

Reestatizar o Estado, privatizar a empresa privada

As empresas privadas, em grande número, mas grande mesmo, só funcionam com benesses do governo 

Além das reformas em andamento, ou ao lado delas, é preciso aplicar duas políticas de âmbito nacional: uma é reestatizar o Estado, outra, seu reverso, privatizar a empresa privada.
 
O jornalista Rolf Kuntz, do “Estadão”, chamou a atenção para a primeira delas em coluna no último dia 26. Está na rede, mas eis dois exemplos contrários ali citados. A Petrobras, com Pedro Parente, foi reestatizada depois do assalto privado e partidário das gestões petistas. Já os órgãos de controle sanitário do Ministério da Agricultura, apanhados na Carne Fraca, estavam obviamente privatizados. Por aí o leitor tem uma boa ideia do que se está falando.
 
O reverso da história é a privatização da empresa privada brasileira ou, se quiserem, a privatização do capitalismo. Considerem a Vale, privatizada em maio de 1997. Nesta semana, foi indicado o seu novo presidente, Fabio Schvartsman, um executivo do primeiro time no setor privado. Sinal claro de aprovação geral: as ações da Vale subiram. Mas houve envolvimento político, outra vez. Ocorre que o governo federal está no bloco de controle da Vale, por meio do Banco do Brasil e de fundos de pensão de estatais, junto com o Bradesco. Claro que, do ponto de vista formal, nada ocorre sem o entendimento dos parceiros, o público e o privado. Mas o peso do governo vai além do número de ações que possui.
 
Vai daí que, na escolha do novo diretor-executivo da Vale, o presidente Temer conversou com o senador Aécio Neves. Outro detalhe: a empresa de mineração, embora tenha negócios no Brasil e no mundo, é mineira de coração, digamos assim. Daí, neste governo, a participação de Aécio. Ao mesmo tempo, bancadas de partidos políticos e candidatos ao posto buscavam apoios e lobbies em Brasília. Mas nessa turma, ninguém emplacou ninguém.
 
De sua parte, Aécio foi conversar com Armínio Fraga, uma unanimidade positiva nos meios econômicos, que topou participar do processo desde que fosse para, de fato, privatizar a Vale. Não falou com essas palavras, mas o sentido era esse: entraria na história se fosse para indicar um nome de mercado, para impor na Vale uma gestão independente. 
Tendo essa garantia, indicou o nome de Fabio Schvartsman, que havia feito ótimo trabalho na Klabin. E Aécio o levou até o presidente Temer.
 
De outro lado, a Vale havia contratado a empresa Spencer Stuart para selecionar seu novo presidente. E Schvartsman foi indicado pelo head hunter. Se foi colocado na lista por Aécio e Temer ou se a empresa chegou a seu nome paralelamente, e por coincidência, não importa mais. O fato é que resultou uma indicação técnica, com respaldo político. Diz o senador Aécio Neves: “Ter aval político não desmerece Schvartsman”. De fato. Mas é fato também que os dois últimos presidentes da Vale, Roger Agnelli e Murilo Ferreira, caíram quando perderam o apoio do governo federal. Agnelli, por exemplo, foi atacado por Lula por dirigir a companhia como se ela fosse... privada e independente.
 
Digamos que Lula volte em 2018. [xô satanás... cai fora e retire Lula do meios dos humanos e o leve para o teu séquito.] Ou alguém de seu lado. Schvartsman e Pedro Parente seriam derrubados? Poderia acontecer, não é mesmo? Mais, seria provável. 
O que demonstra o ponto inicial: nem o Estado está estatizado, nem o privado, privatizado. Hoje, a boa ou má gestão das estatais depende da qualidade da escolha do governo de plantão. E as empresas privadas, em grande número, mas grande mesmo, só funcionam com benesses do governo.
 
Nesta semana, por exemplo, empresários de peso foram a Temer reclamar da presidente do BNDES, Maria Silvia Marques, que, como Parente, é executiva de reconhecida competência. Ela estaria segurando crédito — crédito que o governo anterior distribuiu tão ampla quanto irresponsavelmente. Pois é, em vez de apresentar balanços e projetos saudáveis, foram reclamar com o presidente da República. Os controladores da Vale, incluído o governo, colocaram em marcha um processo para torná-la uma companhia pública, com ações pulverizadas e, portanto, sem dono definido. É boa medida.
 
Assim como seriam boas medidas que garantissem escolhas técnicas e profissionais para cargos que exigem isso no governo e nas estatais. Fiscal sanitário não pode ser indicação política, nem diretor de escola ou presidente da Petrobras. Argumenta-se: o partido que ganha a eleição tem que dispor dos instrumentos para aplicar a sua proposta política. E existe boa política.
 
Tudo verdade. Mas o vencedor não precisa nomear mais de cem mil correligionários pelo país afora. Nem pode colocar o governo a serviço do partido e de determinadas empresas.
São urgentes mecanismos institucionais que garantam um Estado público e um capitalismo privado.
 
 
 

sexta-feira, 22 de abril de 2016

Depois do dia seguinte

Michel Temer não dispõe de muito tempo para mostrar serviço e mesmo com base parlamentar confortável terá dificuldades para manter a confiança inicial


O vice-presidente Michel Temer está a todo vapor na missão de formar o Ministério de seu governo. Parece ter isolado a área econômica dos acordos partidários que teve de fechar para garantir a abertura do processo de impeachment na Câmara dos Deputados. Faz sentido concentrar esforços na área econômica. Sem uma reorganização mínima da economia, o resto não ficará de pé e a confiança em dias melhores, que, de saída, acompanha novos governantes sucessores de outros mal avaliados, não se sustenta.
Todos sabem — e Temer sabe antes de todos — que não disporá de muito tempo para mostrar serviço. O relógio que vai marcar o período de graça, no qual ele terá de encontrar saídas para manter as expectativas positivas iniciais, se tudo correr como previsto, começa a rodar logo ali em 20 dias e o espaço de manobra vai até setembro, quando está previsto o julgamento no Senado Federal. 

Mesmo supondo que as sombras da Lava-Jato e dos processos no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) não se projetem sobre Temer e seus aliados, produzindo instabilidades adicionais no ambiente político, a missão a que o vice se propôs é, como se diz no mundo corporativo, desafiadora. O desafio inclui lidar com a parcela das ruas que se colocou contra o impeachment e que promete manter pressão, lembrando a Temer que, se as pesquisas de opinião rejeitam a presidente Dilma Rousseff para chefiar o governo, não o aprovam para a mesma função. A recusa de Armínio Fraga, “ministro da Fazenda” do PSDB, a aceitar convite para pegar o osso da economia é um bom indicativo das dificuldades pela frente.

Sinais e ações concretas terão, portanto, de ser oferecidos logo na partida. O foco natural é o ataque aos desajustes das contas públicas e é nessa direção que se pode esperar o anúncio de uma reforma administrativa. Enxugar ministérios e reduzir o número de cargos de confiança só depende da caneta presidencial e, embora não tenham efeito excepcional no corte de gastos, são atos capazes de exercer forte impacto positivo nas expectativas.

Daí em diante, porém, nada se vislumbra tão fácil. Antes da reforma da Previdência, de alterações de cunho liberal na legislação trabalhista e de revisões em programas sociais, uma longa lista de medidas, previstas no documento “Ponte para o futuro”, programa da “campanha eleitoral” de Temer, terá de passar pelo crivo do Congresso. A renegociação das dívidas dos estados será o primeiro de uma série de duros testes.

Faz parte dessa lista a adoção de revisões anuais do Orçamento, dentro dos princípios do “Orçamento Base Zero”, entre outras medidas polêmicas desindexar benefícios atrelados ao salário mínimo e rever sua fórmula de cálculo são algumas delas. Isso exigirá eliminar a vinculação obrigatória de gastos orçamentários, alguns constitucionais, como no caso da Saúde e da Educação. A base parlamentar de apoio ao governo Temer promete ser confortável, mas nem é preciso invocar o espetáculo da votação do impeachment na Câmara para lembrar que se trata de uma maioria instável, sujeita a interesses variados e flutuantes. Há coisa de um mês, por exemplo, com o apoio de 400 deputados, foi aprovado, em primeira votação, um aumento da vinculação de gastos para a Saúde.

Interessante também será observar a reação, dentro e fora do Congresso, a propostas de aumento de tributos, que apoiadores de Temer e do impeachment antes repeliam, mas passaram agora a considerar como inevitáveis, diante da urgência de estancar a sangria fiscal. Essa, sem dúvida, é uma manobra quase incontornável para apoiar, sem renovar pressões inflacionárias, a possibilidade de baixar as taxas de juros, aberta pela trajetória de queda da inflação. Sem taxa de juros mais baixas, a retórica da confiança empresarial no novo governo não se transformará em decisão de investimento, dificultando qualquer esforço de retomada do crescimento.

Fonte: José Paulo Kupfer é jornalista

quarta-feira, 20 de abril de 2016

O hipotético ministério de Temer - o mais importante é que Dilma seja escarrada; o resto já vem melhor

A plantação de nomes de ministros prenuncia um governo esperto, porém com um fraco pela articulação do caos

O início da tramitação do impedimento de Dilma Rousseff ainda não completou uma semana e o entorno do vice-presidente Michel Temer conseguiu adicionar um problema a um país que tem duas epidemias, recessão, desemprego e governos estaduais quebrados. O problema novo é um ministério virtual posto em circulação. Serve como instrumento de propaganda mas agrava uma confusão que poderá se arrastar até outubro.

Já são mais de 20 os nomes que rolam na praça, alguns deles saídos de conversas no Jaburu, que de palácio não tem nada, é, quando muito, um esbanjamento de dinheiro público. Trata-se de uma lista malandra, destinada a criar expectativas individuais (no caso de quem espera ser ministro) ou esperanças coletivas (nos poucos casos de gente que se espera ver no ministério). Por isso, aqui só será mencionado um deles.

Armínio Fraga tem competência e biografia para ser ministro da Fazenda. Há um mês, a repórter Erica Fraga perguntou-lhe: “O senhor aceita participar de um governo de transição?” Sua resposta, numa entrevista concedida por e-mail, foi curta: “Não.”  Colocá-lo como conselheiro ou avalista de outra escolha é o pior caminho para começar uma administração num país quebrado que já passou pela experiência de Joaquim Levy, indicado por Luiz Carlos Trabuco, presidente do Bradesco.

Em qualquer governo, em qualquer época, quando um presidente termina de armar um ministério descobre que só um terço dos escolhidos estava em sua primeira lista. O segundo terço ficava entre os prováveis e os demais não eram cogitados quando as conversas começaram. Já houve presidente que, ao ser eleito, pensou nomear um cidadão sucessivamente para três ministérios. Não conseguiu colocá-lo em qualquer um deles.

Ministério não é como boleto de Mega Sena, onde o dono pode escrever o que quiser, parece-se mais com um quebra-cabeças que adquire fisionomia na medida em que se vai formando. Temer ainda não sabe sequer quantos ministros terá. Se isso fosse pouco, formar equipe é uma coisa. Governar com ela é outra e depende do estilo e da decisão do presidente. Ser ministro de Dilma é uma coisa. Ter sido de Lula, bem outra. De Temer, a ver.

Nas listas postas em circulação há nomes que cheiram a simples especulações, outros parecem balões de ensaio e há ainda uns poucos capazes de alimentar esperanças. À primeira vista, tudo isso é coisa de jornalistas sem assunto. Falso. Mesmo quando os assuntos faltam (e não têm faltado), por trás de quase todas essas listas há sempre alguém que merece crédito pela proximidade que desfruta junto ao astro-rei.

É óbvio que se Dilma Rousseff for afastada, Temer deverá ter um ministério pronto. Outro dia o vice-presidente disse que o país precisa de governabilidade e governança. Associou a governabilidade à harmonização dos conflitos políticos e partidários. Nisso ele é um mestre. Um dos primeiros testes de uma boa governança está na capacidade de um chefe de apontar prioridades, formar uma equipe e, sobretudo, não criar confusões.


Fonte: Elio Gaspari,  jornalista - O Globo

segunda-feira, 23 de novembro de 2015

Ainda é tempo para Dilma 'sarneyzar' ou 'collorizar' seu mandato?

Ainda é tempo

O ajuste proposto, de olho apenas em 2016, é inadequado. A rota de escape à "sarneyzação" de Dilma exige a mudança do regime fiscal

O arrefecimento da batalha política pelo impeachment desloca os choques do Congresso para um novo front em que o governo recupera a iniciativa das manobras. Bem-sucedido em seu primeiro movimento, acaba de desarmar a pauta-bomba que ameaçava literalmente explodir suas finanças. Tenta agora aprovar a revisão de sua meta fiscal de um superávit primário previsto de R$ 55,3 bilhões para um déficit a ser autorizado de R$ 119,9 bilhões em 2015. Isso evitaria na forma, se não no mérito, seu desenquadramento à Lei de Responsabilidade Fiscal. Quer também aprovar a Lei de Diretrizes Orçamentárias para 2016, embutindo estimativas de mais R$ 24,05 bilhões em arrecadação com a volta da CPMF, em busca de um superávit primário de R$ 43,8 bilhões, o equivalente a 0,7% do PIB. Apenas por simplificação, vamos nos referir a essa trilha em curso como o “Plano Levy”. A presidente escaparia da “collorização” de seu mandato, cedendo à Velha Política na reforma ministerial, mas seguiria rumo à “sarneyzação”, em meio ao indigesto “feijão com arroz” na economia.

Bem melhor do que o Plano Levy, com ações isoladas em busca do equilíbrio orçamentário para 2016, seria um programa que sinalizasse uma verdadeira mudança de regime fiscal. Foi em busca dessa previsibilidade para horizontes mais longos que Armínio Fraga sugeriu ao governo um plano gradualista de ajuste fiscal que garantisse um superávit primário crescente, de 1%, 2% e 3% do PIB para o próximo triênio. A reversão de expectativas hoje desfavoráveis tornaria possível derrubar mais rapidamente a inflação e com menores sacrifícios em perdas de produção e empregos.

A persistência da inflação, o aprofundamento da recessão e o agravamento do desemprego tornam cada vez mais improvável a eficácia de um plano gradualista, mesmo que consistente como o “Plano Armínio”. Resta a Dilma, como única rota de escape à “sarneyzação” de seu mandato, encaminhar ao Congresso um programa emergencial de controle de gastos públicos para seus três próximos anos de governo, atravessando “Uma ponte para o futuro” enquanto é tempo. Afinal, pela primeira vez desde a redemocratização, os social-democratas atacam frontalmente em documento político o problema estrutural do excesso de gastos públicos.

Fonte: Editorial - O Globo
 
 

terça-feira, 15 de setembro de 2015

Quem paga a conta é você - O que pode ser feito de imediato para que o governo volte a ter dinheiro para pagar suas contas?


Por que o Brasil entrou no vermelho


Como o governo ficou sem dinheiro para pagar suas contas e o que pode ser feito de imediato para resolver o problema 

"O Orçamento Nacional deve ser equilibrado. As dívidas públicas devem ser reduzidas, a arrogância das autoridades deve ser moderada e controlada. (...) As pessoas devem novamente aprender a trabalhar, em vez de viver por conta pública.”

Marco Túlio Cícero, 
político, orador e filósofo romano, em 55 a.C.

Na segunda-feira da semana passada, a presidente Dilma Rousseff tomou uma decisão inusitada. Depois de recorrer às “pedaladas” fiscais, para mostrar um aparente equilíbrio nas contas públicas no primeiro mandato, Dilma resolveu escancarar, ainda que a contragosto, a “herança maldita” que deixou para si mesma. Em sua proposta de Orçamento para 2016 – entregue formalmente pelos ministros Joaquim Levy, da Fazenda, e Nelson Barbosa, do Planejamento, ao presidente do Congresso Nacional, Renan Calheiros –, ela reconheceu de forma explícita que o governo federal não terá dinheiro suficiente para pagar todos os seus compromissos no ano que vem. A dívida pública, hoje, está na faixa de R$ 2,5 trilhões. Em vez do superavit esperado para cobrir os juros dessa obrigação, o governo fechará as contas no vermelho, com deficit estimado em R$ 30,5 bilhões, o equivalente a 0,5% do Produto Interno Bruto (PIB) – o pior resultado em 21 anos, segundo dados da Secretaria do Tesouro Nacional.

“O Brasil entrou no cheque especial”, diz o economista Arminio Fraga, ex-presidente do Banco Central, apontado por Aécio Neves para assumir o comando da economia se ele tivesse vencido as eleições. “A situação fiscal é dramática, muito, muito delicada”, afirma o ex-ministro da Fazenda e do Planejamento Antonio Delfim Netto, que apoiava Dilma até pouco tempo atrás e agora se alinha aos críticos do governo. “Cada passo mal pensado e mal combinado, que termine em mais uma frustração, pode levar ao precipício.”

Segundo Dilma, seu objetivo ao assumir o rombo no Orçamento de 2016 era dar maior transparência às finanças públicas. Não deixa de ser um alento, após as manobras contábeis adotadas no passado recente, questionadas pelo Tribunal de Contas da União (TCU). “Mais vale um deficit real declarado do que um superavit artificial formado por pedaladas”, diz o ex- ministro da Fazenda Francisco Dornelles, hoje vice-governador do Rio de Janeiro e presidente de honra do PP – partido que, ao menos na teoria, ainda faz parte da base governista no Congresso.


Ainda assim, a decisão de Dilma, de apresentar uma proposta de Orçamento deficitário, assustou os analistas. Primeiro, porque revela sua dificuldade em assumir o comando do ajuste fiscal, ao querer dividir com o Congresso o ônus que teria com a adoção de novas medidas de contenção de gastos. Segundo, porque passa a mensagem de que o governo não consegue gerenciar as próprias finanças nem tem o senso de urgência necessário para equacionar a questão. “O governo jogou a toalha no ajuste fiscal”, diz o economista e consultor Affonso Celso Pastore, ex-presidente do Banco Central (BC).

Apesar da alegada transparência exibida por Dilma, algumas premissas usadas no Orçamento colocam em xeque sua viabilidade e alimentam suspeitas de que o deficit de 2016 será ainda maior que o previsto. Enquanto o Boletim Focus, do BC, mostra que a média dos analistas prevê uma retração do PIB de 0,4% no ano que vem, com impacto negativo na arrecadação, o governo fez suas projeções com base numa taxa de crescimento de 0,2%, superestimando as receitas. 


No mercado, calcula-se que o deficit primário (receitas menos gastos, excluído o pagamento de juros da dívida pública) poderá chegar a 1% do PIB – o dobro da previsão oficial. E isso mesmo com a nova alta de impostos anunciada pelo governo, que deverá render R$ 11,2 bilhões a mais em 2016. Na visão dos analistas, nem mesmo o superavit de 0,1% do PIB prometido pelo governo para 2015 (0,15% para todo o setor público) deverá ser cumprido (leia o quadro na pág. 52). “Acabou o sonho desse gasto desenfreado, sem critério”, afirma o economista Samuel Pessôa, pesquisador do Instituto Brasileiro de Economia (Ibre), ligado à Fundação Getúlio Vargas.


Segundo o deputado Ricardo Barros (PP-PR), relator-geral do Orçamento, o buraco nas contas de 2016 poderá superar os R$ 70 bilhões, mais que o dobro do previsto. Barros defende a inclusão na conta dos gastos com o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), estimados em R$ 42,4 bilhões. Eles foram excluídos do Orçamento. Diz que também não foram contabilizados mais R$ 3,4 bilhões em gastos com emendas parlamentares obrigatórias e recursos para compensação dos Estados por conta da isenção tributária de produtos e serviços para exportação.


Leia na íntegra, em Época

http://epoca.globo.com/tempo/noticia/2015/09/por-que-o-brasil-entrou-no-vermelho.html