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domingo, 12 de novembro de 2017

Geraldo, um brasileiro do andar de baixo



Geraldo Casalli é um grande brasileiro. Não só pelo que ele fez no domingo passado, mas também pela sua história 

 Geraldo Casalli tem 53 anos, é motorista da Viação Suzantur, de São Carlos (SP), onde ganha R$ 1.900 mensais, com carteira assinada. Às 12h30m do domingo passado, ele chegou ao ponto final de seu percurso com 15 jovens aflitos que iam para a prova do Enem. Uma garota contou-lhe que estavam a quarteirões de distância e corriam o risco de perder a hora. Pediu-lhe que espichasse sua rota, levando-os até o local da prova. Ele pensou nas duas filhas, Ana Cláudia e Dayane, e atendeu-a.



No dia seguinte, a história de Geraldo estava na rede. Ele foi elogiado pela Suzantur, e a empresa anunciou que hoje mudará o percurso de quatro de suas linhas, levando estudantes aos portões da prova.   Geraldo Casalli é um grande brasileiro. Não só pelo que ele fez no domingo passado, mas também pela sua história. Sempre trabalhou como caminhoneiro, mas nunca teve caminhão. Trabalha há nove meses na Suzantur, depois de ter ficado um ano desempregado, vivendo de bicos. Sua mulher é zeladora num colégio, com pouco mais de R$ 1.000 de salário. Vivem numa casa modesta, porém própria. O casal educou Ana Cláudia e Dayane em escolas públicas, e elas nunca repetiram ano. 

Ambas formaram-se em Pedagogia. Uma, com 23 anos, tem mestrado e trabalha com crianças que têm necessidades especiais. Está noiva e deve se casar em 2019. A outra deve começar no primeiro emprego nas próximas semanas.  Dirigindo caminhão, Geraldo nunca foi assaltado, “graças a Deus”. No seu ônibus, já assaltaram o trocador.  Geraldo é um homem comum, com uma família comum e bem-sucedida. A quem lhe pergunta se, em 53 anos de vida, aconteceu-lhe alguma coisa que considere memorável, responde o seguinte: “Nada, só esse caso de domingo passado, mas eu não estava pensando nisso”.


Stalin no andar de cima brasileiro

A repórter Sonia Racy contou que dezenas de pais de alunos da escola britânica St. Paul, uma das melhores e mais caras de São Paulo, organizaram-se para demitir uma funcionária encarregada da área de tecnologia.  O motivo da mobilização vem a ser o fato de a senhora ser casada com um pecuarista, acusado pelo Ministério Público de chefiar um grande esquema de grilagem, trabalho escravo, horrores e desmatamento de 300km² na Amazônia. Em 2016 ele foi multado em R$ 332 milhões.  Na opinião de uma das mães de alunos, “como um colégio tão cheio de regras permite uma funcionária casada com um desmatador?”


O que a mulher de um sujeito tem a ver com o que ele faz não se sabe, mas o caso não termina aí. Ele começa no lance seguinte: a patrulha pediu também que fossem retirados do colégio os dois filhos gêmeos do casal. Briga de pais em colégio frequentemente tem muitos motivos, mas o que impressiona nessa turma é que o andar de cima, que põe suas crianças na St. Paul, argumente com o que faz o pai para justificar a punição de crianças. Essa era a forma de intimidação mais cruel a que recorriam os regime comunistas para castigar os “inimigos do povo”.


No ano do centenário da Revolução Russa, os patrulheiros poderiam perder algum tempo aprendendo o que acontecia na União Soviética com essas crianças malditas. Está na livrarias “A estrada”, do escritor Vasily Grossman. Num breve conto (“Mama”), ele narra a vida pelo olhos de uma criança órfã, filha de um dos grandes assassinos de Stalin que, como era rotina, acabou fuzilado.  Para quem quiser uma memória real, está na rede “The girl from the Metropol Hotel" (“A menina do Hotel Metropol — Crescendo na Rússia comunista"). Nele, Ludmila Petrushevskaya conta sua infância, do conforto onde vivia a elite bolchevique ao inferno da vida dos “inimigos do povo”.


Temer e as águas

Michel Temer disse o óbvio: se a reforma da Previdência não passar pelo Congresso, paciência. O “mercado” desabou, como se ele tivesse dito alguma novidade.  Desde antes do grampo do Jaburu, sabia-se que a reforma apresentada em dezembro passado estava contaminada pelo excesso de bodes. Se ela passasse com a idade mínima e o regime único, seria um êxito para ninguém botar defeito.


Em vez de atirar pedras em Temer, o “mercado” deveria reconvocar os çábios, consultores e especialistas que lhe venderam a ideia da viabilidade do pacotão. Na sua versão original, a proposta cortava 50% do valor de todas as pensões por morte do INSS. Temer está numa situação parecida com a do presidente americano George Bush, o Velho, quando ele apanhava por tudo o que fazia e um dia comentou:

“Se eu andar sobre as águas, dirão que não sei nadar.”


Coronel Neves

A carteirada com que Aécio Neves depôs o senador Tasso Jereissati da presidência do PSDB obrigou o tucanato a parar de fingir que lida com o Aecinho, neto de Tancredo Neves, menino de praia e freguês da noite do Rio. Aécio é um coronel. Como senhor das Gerais, manteve a imprensa mineira sob uma pressão sem paralelo entre os grandes estados. Podendo, dava uma passadinha pelo circuito chique-brega de Paris. O coronel Aécio mostrou seu chapéu na maneira como enfrentou a denúncia de que construíra um aeroporto na cidade de Cláudio para atender às conveniências de sua família. 


O jogo de Pezão

O governador do Rio, Luiz Fernando Pezão, anunciou que ele e outros colegas estão trabalhando para aprovar a legalização dos jogos de azar em Pindorama. Nas suas palavras: “Propusemos a legalização dos jogos com a destinação dos impostos para criar um fundo de segurança pública.” Tudo bem, legalizar a jogatina para engordar a receita de um estado cujas finanças o doutor ajudou a quebrar. Por que não criar também a Póbrás, legalizando a cocaína?


Sabendo-se que o governo está de olho no dinheiro do jogo, entende-se que haja gente boa cheirando a pureza dessa ideia. Ela é velha. Em 2011 ouvia-se o seguinte:

“Eu acho que o jogo no Brasil, se aberto e legalizado, poderia ser uma fonte de financiamento importante para tanta coisa. Inclusive para Saúde. Não se fala tanto em financiamento da Saúde?”


Quem disse isso foi o governador-gestor Sérgio Cabral. Está na cadeia, condenado a 72 anos. Junto com ele estão seu secretário de Saúde, doutor Sérgio Côrtes, e Miguel Iskin, grande fornecedor da rede hospitalar do estado, a quem Cabral reconhece ter mordido em R$ 2,5 milhões para a campanha de Pezão. Quando Michel Temer assumiu o governo, noticiou-se que dois de seus ministros, Henrique Alves e Geddel Vieira Lima, defendiam a legalização do jogo. Ambos estão em cana.


Com as loterias legalizadas, em 1993 o deputado João Alves, da Comissão de Orçamento, justificou seu patrimônio informando que ganhara 200 vezes na loteca, embolsando o equivalente a US$ 9 milhões.  Talvez fosse boa ideia instalar cassinos legais com roletas viciadas nas cadeias onde está a freguesia da Lava-Jato. Lá eles apostariam livremente o que lhes sobrou das roubalheiras que praticaram.

Elio Gaspari - O Globo


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